Passadas as emoções e impactos desse primeiro momento eleitoral no Brasil, com as sentidas divisões entre os cristãos, as famílias e os amigos, acredito que é hora de retomarmos o ânimo pela união no trabalho, na dedicação, no abraço de grandes causas geradoras de vida e paz. As últimas semanas foram boas para divisões, afastamentos, manifestações de interesses pouco abrangentes e sobretudo, para contratestemunho cristão. Olha que muitos fizeram politicagem usando a fé! Sabemos onde isso já nos levou na história.
Para os que seguem firmes na caminhada do amor, Jesus propõe que sejamos livres, desprendidos, desapegados de preocupações secundárias para nos encontrarmos no essencial. Já falamos em outros momentos do essencialismo, o foco, a eliminação do resto para darmos atenção ao que realmente importa. Concentrar energia naquilo que é significativo, é um processo de aprendizagem que ao mesmo tempo serve como método, mas cuja função precisa permear todo o nosso cotidiano.
Descobrir o que realmente é essencial, a principal meta, o propósito, e trabalhar a capacidade de dizer NÃO para as prioridades de outras pessoas, mantendo-se firmes nas escolhas importantes que fazemos na nossa vida é fundamental. Cumprimos mandamentos, respondemos às demandas e oportunidades na velocidade exigida pelos nossos dias, satisfazemos o mercado, a religião, ao partido e não damos conta de atender a nós mesmos.
Ao ensinar “vai, liberte-se de tudo que te prende, dá a quem não tem, e vem para o encontro com o essencial”, Jesus anuncia que o resultado é grandioso quando a clareza do objetivo e do desejo profundo se estabelece. O desejo pede orientação, “o que devo fazer” ou seja, quais as atitudes, movimentos, ações concretamente importantes podem garantir a verdadeira felicidade.
A lição é clara: não é possível ser feliz sem a consciente liberdade que nos faz sujeitos de ações autônomas, maduras e responsáveis. Não é possível ser feliz sem um encontro interno, puro, desprendido. A felicidade, ou o Reino dos Céus, é comunhão, união, sonho, e real ação de vitalidade que dá suporte para outras atitudes rotineiras, cotidianas.
Pe. Evandro Alves Bastos
Imagine uma família e que cada um quer fazer uma coisa diferente ao mesmo tempo! É inevitável que surjam confusões: um quer assistir à novela, outro a um filme, outro ainda quer ouvir música. Ao mesmo tempo, outros pedem ajuda para arrumar a casa ou preparar as refeições.
Alguém na família tem de ajudar a resolver essas situações de conflito. Pode agir como ditador, fazendo prevalecer seu próprio desejo, ou promover o diálogo entre todos, para resolver da melhor forma possível.
Claro que, numa família, há a necessidade de normas comuns a todos, mas também é necessário olhar para as necessidades de cada um.
O grupo de catequese é uma espécie de família em que o catequista é um dos membros. Por ser mais experiente, assumiu a responsabilidade de conduzir o grupo, mas compartilha essa responsabilidade com os catequizandos.
Frequentemente o catequista depara com situações difíceis, pois encontra ideias, posições, valores, opiniões e questionamentos que diferem entre si ou questionam o conteúdo que ele pretende transmitir. Nesses momentos, deve:
-procurar conhecer a história de vida do catequizando, para compreender o porquê de suas posições e atitudes;
-respeitar os catequizandos e outras pessoas em suas diferenças, sem menosprezá-las ou ridicularizá-las;
-a exemplo de Cristo, dialogar de forma madura, sem impor ideias;
-aprender a ouvir profundamente aquilo que o outro tem para dizer;
-reconhecer a liberdade do outro quanto às suas escolhas, sem força-lo a um modelo de vida cristã, mas deixando espaço para que decida por si mesmo a se comprometer com Jesus;
-ter consciência de que é na diversidade de pessoas e dons que se manifesta a ação do Espírito Santo.
A catequese é local privilegiado para por em prática este valores evangélicos: o respeito às diferenças e a valorização da diversidade. São valores a serem aprofundados no decorrer do processo de formação permanente da fé. Lidar com as diferenças exige um aprendizado que dura a vida toda.
Como despertar para a importância de conviver com a diferença?
Dom Juventino Kestering
In: Livro Catequese de A a Z
Parece tão estranho quando O Mestre da misericórdia apresenta um discurso fundamentalista, dura, radicalista. Soa mal aos ouvidos a palavra Dele usando imperativos autoritários e endurecidos. Choca escutar punições de lábios tão ternos de poesia e encantamento. Fica parecendo uma contradição do discurso ou da pessoa. Será uma perda da referência amorosa para manifestar algum tipo de desvio de conduta? Ou será um momento de stress e os ânimos se descontrolaram para sair um discurso assim?
Nem isso...nem aquilo! No Evangelho do próximo domingo, quando nossa comunidades estarão festejando o Dia da Bíblia, ouviremos Jesus disposto a mais atitudes de acolhimento, de cuidado, de proximidade e zelo pela vida. O que parece dureza revelará uma carinho pedagógico e novas orientações para que a vida resplandeça e plenifique. Ainda que para isso, seja preciso ser mais duro no ajustamento das escolhas e mudanças para nosso bem.
Sempre que as pessoas estão muitos perdidas e sem referências internalizadas e valores seguros e libertadores, a tendência ao autoritarismo vai surgir. Ao longo da história a humanidade manifestou esse limite. O perigo é imenso: um ditador com roupagem angelical pode servir como referencial acabado e garantido. É mais fácil projetar para um ‘salvador externo’ que trabalhar nossas podas consciente e transformações internas. Isso aconteceu com os discípulos da primeira hora. Querem mandar calar quem faz o bem em grupo diferente. Jesus então vai reprimir sabendo que estamos juntos no caminho do plano da plenitude, mesmo quando nossos passos são diversos.
Depois, Ele segue chamando atenção para algumas podas e cortes profundos que vamos precisar fazer para brotar vida nova e garantir a realização do Plano de Deus em Seu amor por nós. Afirma que não servirá ficar no nível médio, fazendo de conta. Para libertar-se profundamente: arranca, joga fora aquilo que está aprisionando e mantendo o velho homem para garantir a vida liberta que Ele veio proclamar.
Então, terminando o mês da Bíblia, em tempo primaveril, e às vésperas das Eleições no Brasil: Melhor será escolher um candidato de soluções mágicas? Um ditador, que seja referencial para as questões que não estamos dando conta de resolver? Vamos colocar tudo nas mãos de um? Ou, podemos fazer algumas podas, amputações e cortes para deixar brotar vida nova?
Pe. Evandro Alves Bastos
26.09.2018
Teve início dia 20 de setembro, em Roma, o II Congresso Internacional de Catequese (20 a 23 de setembro de 2018), com mais de 1200 participantes, na sala Paulo VI. O tema central deste Congresso é “Catequista, testemunha do mistério”.
O Brasil participa com cerca de 75 pessoas, incluindo o bispo referencial da catequese, Dom José Antonio Peruzzo, arcebispo de Curitiba e Pe. Antonio Marcos Depizzoli, assessor nacional de catequese. Também se fazem presentes catequistas, coordenadores diocesanos de catequese, alguns coordenadores regionais de catequese, bispos referenciais de catequese de alguns regionais, além de especialistas em Catequese, como Pe. Luiz Alves de Lima, Pe. Jânison de Sá Santos, membros do Grupo de Reflexão Bíblico-Catequética nacional.
A intenção deste II Congresso é refletir sobre alguns temas da atualidade para a catequese, que derivam da Segunda Parte do Catecismo: “A Celebração do Mistério Cristão”, com o objetivo de perceber cada vez mais a profunda relação entre a catequese e a liturgia.
O Congresso começou com a oração inicial e a introdução feita pelo Mons. Rino Risichella, presidente do Pontifício Conselho para a Nova Evangelização. As conferências do dia foram:
O dia 21 de setembro, sexta-feira, continuou com as conferências:
- O Mistério ilumina a existência cristã, com a Prof. Dra. Marianne Schlosser, da faculdade católica de Viena.
- Iniciação cristã e catequese querigmática, com Mons. Andrea Lonardo, diretor do Instituto para a Cultura da Universidade do Vicariato de Roma.
Além das conferências, houve diálogo com os participantes em grupos de 30 a 50 pessoas para tratar dos temas: a Mistagogia, Introdução experiencial e sapiencial ao mistério de Cristo, Linguagem narrativa e simbólica, Reviver a história da salvação: ano litúrgico e catequese, O Domingo, fundamento e núcleo de todo o ano litúrgico, Anúncio da vida eterna: viver a esperança.
No sábado, dia 22 de setembro, forão realizadas as seguintes conferências:
- O Catecumenato, um desafio para a evangelização, com sra. Claire Bernier, delegada episcopal para a Doutrina da Fé, da diocese de Angers, França.
- Mesa redonda: A piedade popular, uma forma de evangelização.
Haverá a intervenção especial do Papa Francisco. Depois uma celebração da Lectio Divina, seguida das conclusões do congresso que serão feitas pelo Mons. Otávio Ruiz Arenas, secretário do PCPNE
O Congresso termina, domingo, dia 23 de setembro, com a missa na Basílica de São Pedro.
Veja aqui mensagem no Papa Francisco aos participantes do Congresso.
Equipe do site
Obs: O Congresso é realizado na Sala Paulo VI onde está a obra de arte “Ressurreição” , do artista italiano, Pericle Fazzini (1913-1987). A obra foi inaugurada em 28 de setembro de 1977 pelo Papa Paulo VI. A grande estátua representa Cristo que “ressurge de um sepulcro que se encontra no jardim das oliveiras, enquanto a terra é abalada por um enorme temporal que flagela o mundo neste momento tremendo”. Seu vulto é extraordinariamente sereno, dois braços estendidos para um abraço, quase como se quisesse abraçar a humanidade para lhe restituir aquele sentido de amor que parece irremediavelmente perdido. Esta sala Paulo VI é onde são realizadas as audiências gerais com o Papa Francisco, quando não acontecem na praça São Pedro.
“Sem nada ter, tudo pode ser e cantar feliz”, eis a expressão de São João da Cruz que bem define a exemplar caminhada do Papa Francisco, na missão de promover a universalidade da Igreja. A partir de sua rica experiência de vida consagrada e pastoral, de sua proximidade e das palavras sempre pertinentes, o Papa Francisco nutre no coração da humanidade sinais de esperança. Assim, unem-se ao Papa multidões do mundo inteiro – clérigos, autoridades governamentais, formadores de opinião, líderes, membros de diferentes confissões religiosas, cidadãos de diferentes lugares. Todas essas vozes, a partir do pontificado de Francisco, formam um coro que canta a alegria de enxergar, no horizonte, uma “Igreja em saída”, que vai ao encontro de todos, superando molduras antiquadas para deixar brilhar a força da tradição – capaz de levar à interioridade de cada pessoa a luz do Evangelho de Jesus Cristo.
Importante reconhecer: valorizar a tradição não significa limitar-se ao apego cego a tudo o que é antigo, pois Deus, pela ação do Espírito Santo, gera sempre renovação. Zelar pela tradição da Igreja Católica é reconhecer a sua irrenunciável missão de fazer chegar a todos a luz incandescente do Evangelho. E o Papa Francisco ergue a tocha com essa luz, exercendo, com coragem e simplicidade, o seu ministério. A luminosidade do Evangelho incide sob seu rosto e permite, a cada pessoa, reconhecê-lo como sucessor do apóstolo Pedro. Por isso, o seu pontificado gera conversão, possibilitando que muitas pessoas assumam seus próprios pecados e fragilidades.
O Evangelho de Jesus Cristo, o diálogo com Deus, faz brotar no coração humano a sabedoria que permite compreender: não importam roupagens, títulos ou posições hierárquicas que, muitas vezes, garantem certas benesses e honrarias. O fundamental é cultivar uma autêntica vida cristã, um jeito de ser que é bem distante de qualquer tipo de postura egoísta. Na história bimilenar da Igreja Católica, admiráveis homens e mulheres, cristãos leigos e leigas, gente simples, mas também nomes reconhecidos – papas, bispos, padres, religiosos -, em diferentes lugares e culturas, nos mais variados momentos da história da humanidade, foram exemplares por serem autênticos cristãos. Hoje, o olhar volta-se para os que corajosamente se dedicam às frentes missionárias, chamados a testemunharem a fé no mundo contemporâneo. Liderando essa multidão de discípulos e discípulas de Cristo, está o amado Papa Francisco, que faz a cada pessoa um convite corajoso: aproximar-se mais da luz do Evangelho.
Acolher esse convite é a única possibilidade para a superação das muitas sombras, também na Igreja, em razão dos estreitamentos humanos e dos desafios do mundo atual. Há certas dinâmicas contemporâneas que estão na contramão do Evangelho. A lista é extensa, mas é importante, neste momento, dedicar atenção especial a um desses males: o moralismo perverso de certos indivíduos que, motivados por interesses pessoais e pouco evangélicos, sentem-se no direito de atacar outras pessoas. Esses indivíduos, quando criticam, não buscam promover correção ou conversão, pois são movidos pela mágoa. Em vez disso, não raramente, atacam para encobrir seus próprios limites. Adotam, pois, a estratégia de tentar destruir outras pessoas, distanciando-se da luz do Evangelho, que escancara escuridões. Quem busca seguir Jesus, nas muitas situações do cotidiano, pode gerar certo incômodo para os que, veladamente, arquitetam manobras e ilegalidades.
Para a Igreja, seguir Cristo não é opção, mas razão de existir, tarefa que se exerce dedicando-se ao mundo. É o que pede o amado Papa Francisco: uma Igreja cada vez mais servidora, muitas vezes ferida por debruçar-se, misericordiosamente, nas diferentes vicissitudes da vida humana. E o coro de vozes que se une ao Papa Francisco é muito grande. Deve crescer ainda mais, para que ninguém fique de fora. As vozes desse coro, unindo corações em um coração só, revelam que multidões cultivam a disposição corajosa de se deixar iluminar pelo Evangelho – a Tradição que é a herança intocável da Igreja. Permaneça, assim, viva a esperança de se construir um novo tempo, a partir do caminho indicado pelo amado Papa Francisco.
Dom Walmor Oliveira de Azevedo
Arcebispo metropolitano de Belo Horizonte
In: Opinião e notícias 7.09.2018
imagem: site do Vaticano
Se me escutasse mais, eu perguntaria menos ‘o que você faria no meu lugar?’
(Do livro O Cultivo Espiritual, Francisco Galvão)
Não permita que o barulho, a pressa ou a ocupação excessiva o façam desviar-se daquilo que é essencial em sua vida. Quem pouco se escuta, facilmente perde a direção do caminho.
Reservar um tempinho para si, em meio à correria diária, é um presente que ninguém lhe pode dar a não ser você mesmo. Acredite: a Vida recompensa a quem não foge de sua interioridade, a quem não tem medo de enfrentar suas cruzes diárias. Cada alvorecer traz uma nova oportunidade de autodescoberta.
Jamais negue suas fraquezas ou se feche em suas fragilidades. As portas da transcendência se abrirão para você na medida de sua humanidade e de sua compaixão. Ninguém se faz santo sem um espinho na carne.
Quem realmente se conhece, jamais se engana com os elogios. Jamais se deixa abater pelas críticas. Porque sabe o teor de sua busca. Se você, às vezes, se sente perdido e sem rumo, talvez lhe falte fazer as pazes com o próprio silêncio interior. Pode ser que você esteja esperando demais das pessoas, na expectativa de que alguém lhe mostre o caminho a seguir. Mas, cada vocação é única. Cada um deve achar seu próprio caminho. A luta é comum, mas também solitária.
A vida está se esvaindo minuto a minuto. Pare de esperar receitas prontas para a plenitude. Somos todos buscadores. Olhe para dentro. Retire-se. Questione-se. Arrisque-se mais pelos ideais que você acredita. Se for preciso, "brigue" com Deus, mas não desista de si mesmo.
Por favor, não se encante em demasia com as promessas de felicidade. Liberte-se das esperas que só lhe machucam o coração. Quando a paz não nasce de dentro, todo contentamento tende à efemeridade. Toda expectativa se torna decepção.
Crie laços de confiança e empatia, mas não permita que ninguém tome as rédeas dos seus sonhos por você. Ouça o conselho dos sábios e dos amigos, mas nunca se esqueça de consultar sua própria voz interior.
No fim das contas, só quem soube silenciar diante de suas inquietudes mais profundas estará apto a desvelar as sutilezas da própria felicidade.
Francisco Galvão, religioso Paulino, graduado em teologia, mestrando em comunicação social e autor do livro “O Cultivo Espiritual em tempos de conectividade”, lançado recentemente pela Editora Paulus.
Levantar a voz em defesa da vida é uma obrigação moral e cidadã de todos. Calar significa agir de modo conivente com os processos que estão ameaçando a vida humana, em diferentes etapas e circunstâncias. E as consequências são graves. Não poupam ninguém, nem mesmo os que se acham seguros porque possuem bens, vivem com conforto e residem em lugares bem vigiados. Os descompassos que ameaçam a vida, dom sagrado, conduzem toda a sociedade rumo a cenários de dizimação. Basta olhar o mundo atual para reconhecer os muitos contextos desse tipo – verdadeiras feridas em diferentes civilizações.
É espantoso ver, por exemplo, o renascimento e o fortalecimento de certas dinâmicas ditatoriais, que sufocam populações com perspectivas desconexas de um sentido pleno a respeito do que é viver. Verifica-se, como consequência, o recrudescimento de entendimentos político-partidários. Consolidam-se totalitarismos e radicalismos que ofendem, vergonhosamente, a dignidade do ser humano. Nações são submetidas ao horizonte estreito de falsos líderes políticos. Tudo em razão do descompromisso com a vida, que alimenta uma egoísta convicção: o importante é o interesse pessoal, desconsiderando que o outro merece respeito. Essa situação explica também a razão de não haver, na sociedade brasileira, uma reforma política, capaz de gerar a renovação e a recuperação da credibilidade nas instâncias do poder.
Quando não se assume a tarefa de defender e promover a vida, navega-se, mais facilmente, na mediocridade, contentando-se, por exemplo, com representantes que nada têm a oferecer. São pessoas incapazes de propor soluções ou promover as transformações requeridas pelo mundo contemporâneo. E uma das consequências é a endêmica prática da corrupção na sociedade brasileira. Outro desdobramento que pode ser destacado é o fenômeno de se escolher a mediocridade menos incômoda. Essa situação apenas beneficia pessoas que buscam o poder, mesmo sendo incapazes de gerar as mudanças esperadas. Assim, conseguem alcançar certo patamar sem muito esforço. Quem se deixa orientar pela mediocridade – aquela que menos incomoda – não raramente dedica-se, por exemplo, a apoiar os radicais – sempre distantes da dinâmica dialógica imprescindível na sociedade. Apegam-se às mentalidades retrógadas, admiram “caçadores de bruxas”.
A presença de indivíduos em postos de decisão, nas mais variadas instâncias, que só buscam benesses e ancoram-se no comodismo é outra consequência daqueles que nunca valorizam o ser humano. Deixam, assim, de reconhecer que estar a serviço dos outros é o único sentido do poder que se exerce. Urgente é, pois, recuperar a competência humanística capaz de qualificar as diferentes formas de se exercer a cidadania. O ponto de partida é reconhecer que o ser humano tem uma vida que ultrapassa a sua existência terrena. Para isso, vozes precisam ecoar, corajosamente, de muitos modos – nas ruas ou no ambiente digital, em contextos educativos e no exigente testemunho da fé, anunciando que viver é dom sagrado e inviolável.
Esse clamor pró-vida há de chegar às urgentes intervenções e reconfigurações das dinâmicas sociais, políticas e econômicas. Deve-se reconhecer que a vida precisa ser respeitada em todas as suas etapas – da fecundação à morte com o declínio natural. Isto significa, entre outros aspectos, compreender como abominável e demolidora a cultura pró-aborto, que se espalha na sociedade brasileira. O desrespeito ao nascituro é lamentável sintoma da perda do apreço em relação à vida. É um verdadeiro abismo, de onde a sociedade brasileira se aproxima quando passa a ser mais permissiva com certas “legislações abortistas”.
Uma sociedade pró-aborto relativiza o valor intocável e inviolável da vida. E o caminho longo da recomposição do tecido social – com a conquista de equilíbrio, equidade e justiça – é justamente a direção oposta: comprometer-se com a vida, em todas as suas etapas. O atual momento pede atitudes diversas, nos mais variados lugares, com a organização de manifestações pacíficas, simpósios e outras atividades formativas, para que se consolide o entendimento a respeito do significado da vida. Pessoas, grupos e segmentos levantem as vozes pró-vida. Assim será possível reacender a esperança de um tempo novo.
Dom Walmor Oliveira de Azevedo
Arcebispo metropolitano de Belo Horizonte
Caro Jovem... À vida, não é permitido dizer adeus antes da hora!
Quando um jovem não suporta mais a dor da existência e resolve dizer adeus antes do tempo, a humanidade inteira deveria ficar em prantos. A família e a escola – lugar de encontro e de afetos – deveriam oferecer aos que ficaram ao menos algumas razões para querer permanecer. As religiões todas, sem exceção, deveriam se questionar: os jovens de hoje ainda se reconhecem no rosto “deste deus” que estamos apresentando a eles?
Toda morte prematura – seja por excesso de violência ou falta de sentido – deveria doer em nós e causar-nos verdadeiro choque existencial. Nossa vida, comodamente tão “cheia de sentido”, deveria estremecer por alguns segundos e nos fazer recobrar o sentido de pertença à humanidade e o nosso elo de compaixão com todas as criaturas.
Diante da dor e da finitude, as respostas são sempre escassas. Algumas perguntas, no entanto, são inevitáveis. Na condição de ser humano (e, depois, como cristão), poderia eu ter feito algo por meu semelhante que sofria calado, ainda que fosse um simples “Oi, tudo bem?”. Por que não o fiz? Culpa da pressa? Da minha cegueira interior? Ou da minha falta de compaixão pelo próximo?
Nunca é tarde para entender que todos aqueles que partem também são parte de mim. O meu cristianismo se recusa a ser indiferente à dor de meu irmão. Aliás, a morte de nenhum ser humano pode ser estranha à minha maneira de acreditar na vida. Cada ser é um mistério que não se desvela sozinho. Ninguém pode viver com sentido, se não se permitiu ser amado, seja por uma criatura humana ou por um Ser superior. O amor é a única forma de vida capaz de evitar que a morte se antecipe.
Se você é jovem e, algumas vezes, tem se sentido angustiado, perdido, meio distante ou inquieto por dentro, ou ainda com um milhão de perguntas sem respostas... Não se preocupe. Não há nada de errado com você. Solidão e tristeza são parte constitutiva de nossa humanidade. Viver é reconhecer, o tempo inteiro, a nossa fraqueza e insuficiência, mas sem nos render a elas. Viver é uma batalha diária contra nós mesmos e nossos medos.
Decerto, em algum lugar existe alguém à sua espera, alguém que gostaria de escutar suas aventuras, seus desejos, suas histórias. Em algum lugar do mundo, sempre existe alguém que poderá nos olhar sem nenhum julgamento. Apenas não desista de suas buscas. Não abandone o barco antes de vencer a onda mais forte. Lembre-se que, mesmo em meio ao sofrimento, a vida esconde um sentido. Ainda que exista sempre alguém querendo viver um pouco mais, o tempo não espera mais que o necessário. Apesar de tudo, viver é uma graça!
Por mais que, algumas vezes, você ache que ninguém lhe aceita ou lhe ama de verdade, não se deixe enganar por essa voz fantasiosa. Saiba que alguém sonhou com a sua existência. Mesmo que esse alguém nunca tenha revelado nada a esse respeito. Ah! E mesmo que ninguém nunca tenha feito você se sentir amado e importante, ainda assim não haveria motivos para desistir da vida. Sabe por quê?
“Você é o meu Filho amado, em ti eu ponho meu agrado” (Marcos 1,11). Foi esta a voz que fez Jesus vencer todo seu sofrimento e superar o peso da cruz. Ele escolheu ouvir essa voz desde seu Batismo até o fim! E, embora em algum momento, ele também tenha se sentido abandonado, Jesus sabia que a Voz ainda estava ali. Havia muitas outras vozes dizendo coisas horríveis sobre ele, mas o Mestre da compaixão não deu ouvido a seus inimigos internos. Escutava apenas a Voz que vinha do alto: “Eu acredito que você é capaz”.
Esta mesma voz que fez Jesus vencer suas angústias e “beber o cálice da vida” até o fim continua aí dentro de você! Por isso, não esqueça: “Você é o amado de Deus”. “Você é a amada de Deus”. Estas palavras revelam a mais íntima verdade sobre todos os seres humanos, pertençam eles ou não a alguma religião. Infelizmente, muitos acabam fechando os olhos e os ouvidos a esta verdade e passam a vida inteira mendigando afetos. Outros preferem crer naquelas vozes que só lhe dizem as piores mentiras: “você é fraco, você não é querido, você não é ninguém”. O bom de tudo isso é que a escolha é única e tão somente sua! A quem você tem dado ouvidos? Quem você escolheu para confidenciar suas dores e suas verdades?
Quanto mais nos afastarmos de nossa voz interior, mais acreditaremos nas vozes que desconhecem a nossa verdadeira essência. Como dizia Henri Nouwen, “os seres humanos são muito inconstantes em seus julgamentos. Deus, e apenas Deus, nos conhece em nossa essência, nos ama absolutamente, nos perdoa totalmente e se lembra de nós pelo que realmente somos”. Quando escutamos a voz errada, passamos a duvidar de nossa capacidade e de nossa força. Esquecemos quem realmente somos e para onde estamos indo. A maior dor da existência, não é ser desprezado por alguém, mas sermos abandonados por nós mesmos. Que nenhuma decepção nos faça esquecer quem realmente somos. “Você é o meu Filho amado, em ti eu ponho meu agrado”.
Quando passarmos a acreditar nas vozes que nos chamam de inúteis e detestáveis, então, um grande vazio existencial poderá tomar conta de nosso ser e, o que é pior, nos fazer acreditar que não valemos nada, que merecemos ser desprezados, colocados de lado, esquecidos, rejeitados e abandonados. Hei, pode parar! Essa voz é enganadora! Não dê ouvidos a ela! Nada do que vem de fora pode revelar a verdade última sobre você mesmo.
A autorrejeição, dizia Nouwen, costuma ser vista simplesmente como a expressão neurótica de uma pessoa insegura. Mas a neurose costuma ser a manifestação psíquica de uma escuridão muito mais profunda: a escuridão de não se sentir verdadeiramente acolhido pela existência humana. Segundo ele, “a autorrejeição é a maior inimiga da vida espiritual, porque contradiz a voz sagrada que declara sermos amados. Ser o amado, a amada expressa a verdade fundamental de nossa existência”.
Lembre-se: você é muito mais do que aquilo que pensam ou dizem a seu respeito. Você é muito mais do que aquilo que escrevem ou postam sobre você. Você é o amado, a amada de Deus. E sentir-nos amados por Ele significa assumir a nossa missão nesse mundo. Que não podemos “voltar para casa” antes de cumprir o projeto de amor que Ele nos confiou. Você já tentou descobrir a sua verdadeira vocação nesse mundo?
A verdadeira felicidade, não consiste em achar todas as respostas, mas viver dentro da procura. Sem se desviar da Voz interior que nos chama “amado”. Precisamos reconhecer que, neste mundo, ninguém é plenamente feliz. Todos nós passamos por crises e dificuldades. E todos nós podemos superar nossos medos. Somos todos buscadores. Ninguém está isento das noites escuras da vida. Assim como ninguém está liberado para voltar à morada do Pai antes do tempo.
Um dia, minha madrinha de crisma me olhou com compaixão e disse-me com os olhos cheios de verdade: “Sabe, Galvão... A sua história, com todas as feridas da infância e as agressões de seu padrasto, tinha tudo para dar errado, mas, graças à sua persistência, Deus voltou a acreditar em você novamente”.
Somente bem mais tarde, quando li Etty Hillesum, foi que entendi a verdade aquelas palavras. Quando estava à beira da morte, em meio aos horrores do campo de concentração, Etty rezou: “Vou ajudar-te, meu Deus, a não te extinguires em mim, mas nada posso garantir de antemão. Contudo, uma coisa me parece cada vez mais clara: não és tu que podes ajudar-nos, mas nós é que podemos ajudar-te – e aos fazermos isso, ajudamo-nos a nós mesmos”.
Por isso, caro jovem, não desista dos seus sonhos. Não desista de si mesmo. Porque Deus, embora pareça silencioso e distante, Ele continua acreditando em você!
FRANCISCO GALVÃO, autor do livro “O Cultivo Espiritual em tempos de conectividade”, lançamento Paulus 2018.
Vaticano, 28 de maio de 2018
Caríssimos Catequistas,
desde que a competência da Catequese foi confiada a este Conselho Pontifício, temos envidado esforços para organizar diversos eventos que têm colocado em destaque este centro vital da ação pastoral da Igreja. No Ano da Fé, celebrámos juntos o I Congresso Internacional de Catequese (26-28 de setembro de 2013), intitulado “O Catequista, Testemunha da Fé”, refletindo sobre alguns temas inerentes à Primeira Parte do Catecismo da Igreja Católica; no Jubileu Extraordinário da Misericórdia, houve o Jubileu dos Catequistas (23-25 de setembro de 2016), com a participação dos catequistas de todo o mundo; e, no passado dia 11 de outubro, recordavámos o 25° Aniversário da Apresentação do Catecismo da Igreja Católica, com uma solene comemoração no Vaticano na presença do Santo Padre, durante a qual o Papa Francisco comunicou um importante desenvolvimento no ensinamento da Igreja a respeito da pena de morte.
Agora, o Conselho Pontifício para a Promoção da Nova Evangelização anuncia a realização do II Congresso Internacional de Catequese – que terá lugar em Roma, de 20 a 23 de setembro de 2018 – intitulado “O Catequista, Testemunha do Mistério”. A intenção deste II Congresso é refletir sobre alguns temas com atualidade para a catequese, que derivam da Segunda Parte do Catecismo: “A Celebração do Mistério Cristão”. Entre eles: a iniciação cristã e a catequese kerigmática, o catecumenado e a mistagogia, isto para mencionar apenas alguns, com o objetivo de perceber cada vez mais a profunda relação entre a catequese e a liturgia. No Programa de fundo, que está acessível em três línguas no site do Conselho Pontifício (pcpne.va), podeis verificar a intenção geral do Congresso.
São convidados a participar, além dos coordenadores nacionais e regionais da catequese, também os catequistas de todas as dioceses do mundo e a todos os que se interessam pela catequese, de modo especial quem já participou num dos eventos acima referidos. As inscrições estão abertas no website acima referido (pcpne.va), até 31 de agosto de 2018.
Pedimos que divulguem esta informação entre outros catequistas e todos os que possam ter interesse neste evento.
Gratos pela vossa grande dedicação ao serviço da Igreja, a todos dirigimos uma afetuosa saudação, esperando-vos em Roma.
O Conselho Pontifício para a Promoção da Nova Evangelização
A população não pode se deixar contaminar pelas polarizações que costumam ser prejudiciais a todos, com o crescimento de atitudes e posturas violentas. É um cenário ameaçador, que não pode ser considerado normal, mas vem se configurando há muito tempo por diferentes razões. As polarizações consolidam-se, especialmente, a partir da combinação entre irresponsabilidades e desvarios de todo tipo, que se assemelham à “lenha na fogueira”. Acirram ânimos e geram situações que levam à perda do autocontrole e à violência.
Imagine: onde se poderá chegar quando as relações sociais estão em “pé de guerra”, com a relativização do respeito ao outro? A liberdade cidadã passa a ser orientada por intolerâncias, que alimentam o ódio e servem para justificar diferentes tipos de agressão, resultando em tragédias e perversidades. Por isso, não convém subestimar os riscos de extremismos, especialmente os nascidos do fanatismo político. As muitas divisões levam a sociedade a se fragmentar, correndo o sério risco de se desintegrar. As polarizações fragilizam o povo, incapacitando-o para reagir diante de tantos desafios contemporâneos.
Essas perigosas e acirradas disputas não levam a lugar nenhum e, para vencê-las, há um longo caminho a ser pavimentado e percorrido, que contempla investir na justiça, tratando todos com igualdade. Dessa forma, evitam-se impunidades, garante-se a aplicação de penas, independentemente de classe social ou opção ideológico-partidária. É preciso integrar ao dia a dia de cada indivíduo a consciência da necessária moralização norteada pelos parâmetros da justiça: cada cidadão deve ser responsabilizado pelo que fala ou faz.
Há de se descartar a ilusão de que o novo tempo almejado por todos vai ser construído simplesmente com a mitificação de figuras políticas ou religiosas, ou mesmo com o saudosismo de tempos que já se foram. A (re)construção social é processo novo, e não a repetição do passado. Esse processo deve incluir uma justiça capaz de definir penas para quem comete crimes e colocar fim às situações que prejudicam toda a sociedade. A justiça tem, pois, uma tarefa gigantesca, que requer equilíbrio de seus agentes e instâncias, indispensável na condução de todos os processos.
Mas dar rumo novo à sociedade não é somente responsabilidade da justiça. Trata-se de tarefa a ser partilhada por todos os cidadãos. Ao assumi-la, determinante é que se desperte na consciência de cada pessoa a luz de um repensar, oportunidade para a qualificação das próprias atitudes, superando radicalismos. Desse modo, o ser humano capacita-se para o diálogo, consegue compreender as diferenças e articulá-las para o bem de todos. Um movimento bem diferente daquele que promove o acirramento de picuinhas.
O momento atual requer envergadura moral e emocional de todos, especialmente dos líderes, sob pena de se permitir autoritarismos e atitudes tendenciosas, ou mesmo reduzir tudo o que é certo às próprias escolhas e concepções ideológico-partidárias, fazendo aumentar os radicalismos que cegam. Repensar é, pois, um ato de sabedoria, lucidez e de serenidade para encontrar as dinâmicas e parâmetros de um novo agir. Na contramão dessa compreensão, podem se multiplicar os vandalismos alimentados pela mediocridade, pelo ódio e pela intolerância. É hora de cada pessoa repensar suas atitudes, para ser capaz de dialogar e, assim, intuir novas respostas, compreender o caminho da história com a luminosidade de princípios e valores que inspiram qualificadas formas de agir.
Dom Walmor Oliveira de Azevedo
Arcebispo metropolitano de Belo Horizonte
A sociedade é radicalmente desafiada a reconhecer que seu curso está na contramão dos valores humanísticos, espirituais, morais e culturais. Esse reconhecimento é a base para que a humanidade possa se reerguer diante do atual quadro de crescente deterioração do qualificado exercício da cidadania, que se manifesta, por exemplo, pelos “delírios públicos”, de grupos e de pessoas, aprisionados nos fundamentalismos, nas intolerâncias, na doentia ânsia de se emitir juízos sobre a conduta dos outros. Esse fenômeno preocupante se revela na disseminação das notícias falsas, propagadas pelas redes sociais, que induzem tantas pessoas a admitirem como verdade uma mentira amplamente divulgada. Quem compartilha notícias enganosas – e outras formas de inverdades – contribui apenas para acirrar as intolerâncias.
Muitos interpretam, equivocadamente, que o direito de todos à manifestação de pensamento dispensa a competência para o diálogo, que inclui agir respeitosamente quando se fala sobre alguém ou quando se dirige ao outro. Consequentemente, o desespero toma conta. Incapazes de vivenciar o exercício da autocrítica, as pessoas não admitem que suas escolhas político-ideológicas podem ser questionadas. Desconsideram que sua visão de mundo indica uma perspectiva entre tantas outras. Não traduz a verdade absoluta. É um tipo de enrijecimento mental que conduz as pessoas e a sociedade rumo ao caos.
O pior é que não se percebe um movimento para flexibilizar essa rigidez, com o cultivo de mais tolerância e a busca pela convivência harmoniosa de perspectivas diferentes. Ao invés disso, coloca-se mais “lenha na fogueira”, nas verdadeiras brigas estabelecidas por quem pensa diferente. E a fumaça dessa fogueira impede a sociedade de enxergar as linhas de um horizonte novo e largo. Por isso, todos são convocados a compreender que o primeiro passo para superar os conflitos sociais é reconhecer o que – e quem – está na contramão de valores essenciais à boa convivência. E essa é uma elaboração crítica muito exigente, complexa.
Ora, de modo geral, cada um pensa estar com a razão, e não busca reavaliar seu próprio modo de agir e de enxergar a vida. Alimenta as próprias convicções por aproximar-se e receber o amparo dos outros que pensam de modo semelhante, constituindo grupos com potencial para transformar suas estreitezas em verdadeiras bandeiras, a serem defendidas até com ódio. Crescem, assim, as discriminações e as intolerâncias. Preocupante é constatar ainda que pessoas de mentes encurraladas estão por toda parte, em campos sociais estratégicos – na política, no ambiente religioso, nas instâncias que deveriam zelar pela educação, arte e cultura.
Gradativamente, todos passam a ser juízes de cada um, fazendo lembrar aquela conhecida passagem do Evangelho, quando Jesus faz referência, criticamente, a quem se preocupa em tirar “o cisco do olho do outro”, mas não tem competência para eliminar o que atrapalha a própria visão. Quando não são ampliados os modos de enxergar, todos correm o risco de navegar na contramão de valores indispensáveis e, consequentemente, prosseguir na viagem rumo ao precipício.
Qualificar os modos de ver o mundo, dedicando-se à autocrítica, é dever de cada pessoa. É preciso pôr fim à confusão gerada pela guerra de opiniões, temperada com a volubilidade nas decisões e escolhas. Quando se convive com a incoerência, indivíduos buscam consolidar o próprio poder nas burocratizações que mascaram incompetências e pareceres equivocados. Permanecem incapacitados para os diálogos determinantes na condução de instituições e da sociedade rumo a novos ciclos.
Não faltam simplesmente titulações ou informações às pessoas, pois, no atual contexto, de marcante presença das tecnologias digitais, conteúdos diversos estão disponíveis para consulta e aprendizado. A carência maior é de envergadura ético-moral que inspire ações fundamentadas nos valores que garantam qualificado exercício da cidadania. Para suprir esse déficit, cada pessoa precisa se capacitar não apenas para formular críticas ou acolhê-las. Fundamental é fazer do recôndito da consciência uma instância capaz de presidir processos de autocrítica. Alcançam-se, com isso, mais equilíbrio e desenvolvimento integral, pois todos se tornam autênticos instrumentos a serviço do bem.
Mas o bate-cabeça e os acirramentos ideológicos tornam-se mais intensos porque há um distanciamento dos valores ligados à verdade, à justiça, ao respeito e ao diálogo. Esses valores não podem ser tratados com subjetivismo, para não caírem nas relativizações mortais. O aperfeiçoamento humano é meta indiscutível. Para alcançá-lo, o primeiro passo é reconhecer, a partir de uma autoanálise e de reflexões sobre o mundo contemporâneo, que a sociedade está inserida em uma dinâmica suicida, pois age na contramão de valores inegociáveis.
Dom Walmor Oliveira de Azevedo
Arcebispo metropolitano de Belo Horizonte
In: Opinião e Notícia 06.04.2018
Ilustração: Jornal Estado de Minas
Introdução
Em 1964, em pleno desenvolvimento do Concílio Vaticano II, realizou-se a primeira Campanha da Fraternidade (CF) em âmbito nacional, sob os cuidados da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB).
Para o ano de 2018, foi escolhido o tema “FRATERNIDADE E SUPERAÇÃO DA VIOLÊNCIA” e o lema: “VÓS SOIS TODOS IRMÃOS” (Mt 23,8), com o objetivo geral de construir a fraternidade, promovendo a cultura da paz, da reconciliação e da justiça, à luz da palavra de Deus, como caminho de superação da violência.
O tema da CF-2018 pretende advertir que a violência nunca constitui uma resposta justa. A Igreja proclama, com a convicção de sua fé em Cristo e com a consciência de sua missão, que a violência é um mal, é inaceitável como solução para os problemas e não é digna do ser humano.
A busca de soluções alternativas à violência para resolver os conflitos assumiu, atualmente, um caráter de dramática urgência. É, portanto, essencial a busca das causas que originam a violência, em primeiro lugar as que se ligam a situações estruturais de injustiça, de miséria, de exploração, nas quais é necessário intervir com o objetivo de superá-las (cf. Compêndio da Doutrina Social da Igreja).
Já o lema “Vós sois todos irmãos” busca resgatar o sentido da fraternidade dos povos, pois somos todos irmãos e irmãs, filhos e filhas de um mesmo Pai. Por isso, iluminados pelo evangelho do Reino, somos chamados à não violência.
A CNBB convida todos os homens e mulheres de boa vontade a percorrer o caminho da superação da violência, crescente em todos os níveis. Para isso, é preciso olhar a realidade, iluminá-la com a luz da palavra de Deus e do magistério da Igreja e, por fim, agir sobre ela, transformando-a.
1.Olhar a realidade
A convivência pacífica e a sociabilidade violenta parecem disputar os mesmos espaços no cotidiano. No Brasil, criou-se um discurso conveniente, segundo o qual o povo brasileiro é pacífico; contudo, basta observar com cautela a sociedade para perceber como a violência está presente no dia a dia das pessoas.
Tal violência, com o passar dos anos, foi se tornando uma cultura institucionalizada e sistematizada, gerando assim os rostos nos quais se contempla o descaso com a pessoa humana e o quanto ela é tolhida em seus direitos e dignidade.
Cultura da violência
A definição mais genuína da palavra cultura é “cultivo”. Disseminar uma cultura é cultivar um modo de ser, de estar e de agir.
Quando se apresenta a violência como cultura, parte-se de uma análise da realidade em que comportamentos, mídias, expressões verbais, músicas etc. foram se tornando “normais”, “comuns”. Essa cultura é produzida pelos indivíduos, que, ao mesmo tempo, se tornam vítimas do próprio sistema de violência.
A violência cultural institui na sociedade uma situação em que alguns atos violentos são reconhecidos como legítimos ou naturais. Assim, a violência cultural não constitui a causa primeira da violência, mas é condição para que a sociedade tenha uma visão míope dos atos violentos; em outras palavras, uma consciência anestesiada, pois aquilo que deveria ser considerado violento – porque é um mal em si – passa a não ser assim considerado.
A mídia é a grande colaboradora do processo de naturalização da violência, pois a polariza em alguns contextos específicos – por exemplo, o narcotráfico, os assassinatos e as guerras –, como se ela só fosse possível nesses “ambientes organizados”. Esquece-se que a violência nasce no próprio ser humano, quando este escolhe o caminho do ódio, do não perdão, da inveja, da soberba. Acrescido a isso, a sociedade aceita passivamente atitudes de natureza violenta.
A cultura da violência é uma cultura excludente, pois a associa às classes sociais e raciais, criando, assim, estigmas sociais como “o povo daquele país não presta”, “aquele rapaz tem cara de bandido”, “aquela mulher merece apanhar”. Essas expressões, tornadas corriqueiras, são um modo de descriminalizar a cultura da violência. As estatísticas confirmam isso quando apontam registros crescentes de xenofobia no Brasil, o grande número de jovens negros encarcerados, a multidão de mulheres que, no silêncio do lar, sofrem violências diversas.
Essa naturalização se converte em indiferença. Os números da violência no Brasil revelam uma calamidade social. Raramente, porém, o espectador ultrapassa o nível de leve indignação diante dos dados. Isso que ocorre no plano individual se manifesta como uma espécie de anestesia nos governos, que não se sentem compelidos a elaborar políticas públicas capazes de reverter a tragédia em andamento (cf. Texto-base da CF-2018).
A cultura se atualiza por meio de ações sociais, ou seja, ocorre quando a sociedade vai cristalizando alguns comportamentos, chegando a institucionalizá-los. Nesse sentido, a Campanha da Fraternidade de 2018 não quer somente identificar a cultura da violência, mas sobretudo combatê-la. Para isso, é preciso entender como essa cultura vai se sistematizando na pessoa, na comunidade e na sociedade.
A sistematização da violência
A violência apresenta-se nas mais variadas formas: física, psicológica, institucional, sexual, de gênero, doméstica, simbólica, entre outras. Superar as várias faces da violência é tarefa de todos. Exige o compromisso de cada cristão e cristã no enfrentamento das múltiplas formas de ofensa à dignidade humana que se naturalizam escandalosamente em nossa sociedade.
Ainda que o Brasil, nos últimos anos, tenha apresentado evidentes avanços e conquistas sociais, estes ainda não foram suficientes para eliminar a desigualdade. Uma vez que cresce a desigualdade, cresce também a violência. O não atendimento aos direitos elementares das pessoas constitui um nascedouro para a violência em sociedade.
Somam-se, nesse desafiador quadro social, as causas externas de mortalidade (decorrentes de acidentes de trânsito, afogamento, envenenamento e outras formas de violência, como agressões, homicídios, suicídios, tentativas de suicídio, abusos físicos, sexuais e psicológicos), que contribuem para mais de 138 mil óbitos anualmente em nosso país, segundo dados de 2010 do Ministério da Saúde. Os homicídios no Brasil, por exemplo, tiveram um aumento de 259% num período de trinta anos. Segundo o Fórum Brasileiro de Segurança Pública, 11% dos assassinatos do mundo acontecem no Brasil, onde uma pessoa é morta a cada dez minutos; 50.806 pessoas foram vítimas de homicídios dolosos no país somente em 2013, ano que registrou 50.320 casos de estupro; o número de presos no sistema penitenciário brasileiro cresceu 5,37% entre 2012 e 2013, sobrecarregando ainda mais o já desumano sistema penitenciário; e os custos da violência chegaram a 258 bilhões de reais nesse mesmo período, correspondentes a quase 6% do PIB (soma de todas as riquezas que o país produz em um ano); nos últimos cinco anos, as polícias brasileiras mataram 11.197 pessoas, mas os policiais também foram vítimas: em 2013, 490 foram mortos, 75% dos quais fora de serviço. Dados do Índice de Vulnerabilidade Juvenil à Violência e Desigualdade (IVJ 2014) apontam que, no Nordeste, um jovem negro corre cinco vezes mais o risco de ser morto do que um jovem branco. Dos quase 30 mil jovens assassinados em 2012, 76,5% eram negros ou pardos, ou seja, morreram 225% mais jovens negros do que brancos. De acordo com o IVJ, no Brasil, esse índice é de 2,5, ou seja, são assassinados 2,5 vezes mais jovens negros do que brancos. A evolução histórica da mortalidade violenta no Brasil impressiona: segundo o Mapa da Violência 2014 – Os Jovens do Brasil, entre os anos 1980 e 2012, morreram no país 1.202.245 pessoas vítimas de homicídio, 1.041.335 pessoas vítimas de acidentes de trânsito e 216.211 suicidaram-se. As três causas somadas totalizam 2.459.791 vítimas (cf. Texto-base da CF-2018).
Sabe-se que a violência está presente em toda a sociedade e se manifesta de formas diferentes, mas é sabido também que as populações mais vulneráveis é que são mais vitimadas. Enquanto as classes de maior poder aquisitivo podem se proteger com uma série de artefatos que alimentam a “indústria da segurança” e dão uma falsa sensação de proteção, os mais pobres estão expostos à insegurança.
O direito à proteção é para todos, e se alguns estão tolhidos desse direito, isso se dá pelo fato de não haver políticas públicas que favoreçam a totalidade dos cidadãos. Os impostos, que deveriam servir ao bem comum, são escoados por obra da corrupção, num país em que parece estar institucionalizada a fraude contra o dinheiro público.
A violência não é um fenômeno apenas cultural, mas, ao se instalar na sociedade, vai se sistematizando. Tal sistema é bipartido e polarizado: de um lado, estão os que querem a todo custo tirar vantagem; de outro, as vítimas da desigualdade. Por sua vez, as instituições precipuamente responsáveis por zelar pelos direitos elementares de segurança, justiça e paz acabam se transformando em instituições corrompidas, como é o caso do sistema de justiça criminal brasileiro (formado pelas polícias, pelo Ministério Público, pela Justiça e pelo sistema prisional), que, muitas vezes, não consegue responder adequadamente às problemáticas contemporâneas.
A sociedade ainda se pauta na reação, e não na prevenção; na punição, e não na educação para o senso de pertença. Com o passar do tempo, os sistemas que deveriam ser um serviço à seguridade social tornam-se instituições sobre as quais a desconfiança cresce dia a dia.
A violência que se manifesta diariamente e em intensidade numérica cada vez maior muitas vezes é ocultada para dar espaço a fatos midiáticos. Alguns casos ficam tão expostos nos meios de comunicação, que levam a população a particularizá-los e a focar especificamente neles, esquecendo-se de outros, muito mais numerosos, que acontecem todos os dias. E, ainda, a mídia, ao apresentar situações de modo teatral, desperta na população um senso justiceiro, um desejo de fazer justiça com as próprias mãos. Volta à cena o desejo do mais alto grau de punição: a morte, como se fosse a solução para erradicar todos os tipos de violência.
O descarte do ser humano, seja ele vítima ou autor do malfeito, não é o caminho. Não se pode alimentar um sistema maniqueísta que separa bons e maus, justos e injustos. É preciso voltar-se ao senso de alteridade: o outro (alter) é meu irmão; se é meu irmão, eu não o descarto quando erra, mas o ajudo a se reeducar no caminho do bem.
É preciso passar de um sistema excludente, elitista e descartável para uma sociedade fraterna, responsável e inclusiva.
Os rostos da violência
Quando se fala de vítimas da violência, não se pode ficar o tempo todo generalizando. Por trás de cada vítima há um rosto, uma pessoa com vontade, liberdade e capacidade para amar, que teve os seus direitos arrancados pela violência. O convite que a Igreja faz, por meio da Campanha da Fraternidade, não visa à superação de um quadro estatístico cheio de dados e números; ela convida à superação na vida e na história de cada homem e mulher subtraídos de seus direitos.
A Igreja não quer apenas apontar dados e estatísticas, mas convida cada um a contemplar os rostos e a história de tantos irmãos e irmãs:
– rosto dos que sofrem violência racial;
– rosto dos que sofrem violência de gênero. Muitas mulheres continuam sendo vítimas da cultura patriarcal e machista, de salários reduzidos, da violência doméstica, de abuso sexual. Cabe lembrar aqui os irmãos e irmãs da comunidade LGBT, vítimas constantes do preconceito e da violência física;
– rosto dos que sofrem violência doméstica, tendo como principais vítimas as mulheres, as crianças e os idosos;
– rosto das vítimas da exploração sexual e do tráfico humano, sobretudo mulheres e crianças;
– rosto dos trabalhadores rurais e dos povos tradicionais. Aumenta o conflito no campo; os trabalhadores rurais, na luta por seus direitos, muitas vezes são assassinados e expulsos da terra. Os povos tradicionais, que estão na terra desde muito antes da chegada dos colonizadores, são tratados com estranhamento e com o endurecimento das leis de criação de reservas;
– rosto das vítimas do narcotráfico. Cada vez mais cresce o número de pessoas que perdem a vida por causa do narcotráfico. A vida é tirada não só pelo consumo dos entorpecentes, mas também pela violência do crime organizado, gerador de um sistema injusto, que prende crianças e jovens consumidores de drogas, mas raramente (ou nunca) pune exemplarmente os grandes traficantes;
– rosto das vítimas do trânsito. As pessoas, tendo o direito de ir e vir, precisam fazê-lo com segurança. Muitas são as vítimas do trânsito, seja pela irresponsabilidade pessoal dos que ingerem álcool ou não respeitam a sinalização, seja pela ausência dos poderes públicos na manutenção das rodovias.
Com esse elenco de rostos da violência, não se fecha o assunto; ao contrário, com acurada reflexão, é possível perceber uma infinidade de pessoas e situações marcadas por essa realidade. Não basta identificar a violência como cultura e como sistema e distinguir suas vítimas; é preciso iluminar essa realidade com o evangelho.
2.Iluminar a realidade
A palavra de Deus e a superação da violência
A Sagrada Escritura foi sendo inspirada ao longo dos séculos. É uma história de salvação que passa pelas marcas da história da humanidade, constituída de momentos de fraternidade, de paz, de luta pela justiça, mas também marcada pelo pecado da divisão, da guerra, do abuso do poder.
Muitas vezes os sentimentos humanos são atribuídos a Deus, apresentando-o como vingativo, violento e cheio de ira. Muitos textos da Sagrada Escritura carregam essa marca da projeção da violência humana em Deus, caracterizando-o como um Deus justiceiro.
A Revelação atingiu sua plenitude no mistério da encarnação de Jesus Cristo, que é por excelência uma pessoa de paz, de não violência, de prática da fraternidade.
Jesus revela que Deus é Pai (Abbá) e os homens e as mulheres são irmãos e irmãs. A fraternidade anunciada por Jesus é composta de um caminho de misericórdia, que pede e oferece perdão; um caminho em que se assume a postura do samaritano, o qual se inclina sobre a dor do que sofreu violência, dele cuida e com ele supera o sofrimento.
Do Novo Testamento deriva uma consequência prática: quem conhece Jesus promove a paz, jamais estimula a violência. Quem, em Cristo, sabe que foi agraciado com a paz deve se tornar um reconciliador, um construtor de paz.
Como lembra um antigo escrito cristão: “Deus enviou-o (seu Filho) para nos salvar, para persuadir, e não para violentar, pois em Deus não há violência” (Carta a Diogneto, VII, 4; cf. Texto-base da CF-2018).
O magistério da Igreja e a superação da violência
A Igreja guarda o tesouro deixado por seu fundador, cabendo-lhe a missão do anúncio do evangelho da paz e da superação da violência.
Quando estudamos a história da Igreja, percebemos que nem sempre ela foi fiel à sua missão; muitas vezes escolheu o caminho do não diálogo, chegando a extremos escandalosos.
A Igreja não esconde os erros da sua história, mas aprende com eles e busca cada dia refazer a escolha do seguimento de Jesus. Ela segue o seu Mestre – que não agiu com violência, mas morreu de morte violenta – e, guiada pela sua presença ressuscitada e pelo seu Espírito, por meio da comunhão e da missão, busca oferecer a todos os povos um caminho para vencer a violência.
Poder-se-ia aqui fazer memória de inúmeros homens e mulheres que, ao longo dos séculos, deram testemunho de superação da violência. Contudo, esta reflexão se centrará na primavera da Igreja no século XX, o Concílio Ecumênico Vaticano II e os papas contemporâneos.
Em sua reflexão sobre a comunidade humana internacional, a constituição pastoral sobre a Igreja no mundo de hoje Gaudium et Spes indica como elementos que se deve ter presentes para uma convivência pacífica e para o progresso da paz: a índole comunitária da vocação humana; a interdependência da pessoa humana e da sociedade humana; a promoção do bem comum; o respeito pela pessoa humana; o respeito e amor pelos adversários; a igualdade essencial entre todas as pessoas; a superação da ética individualista; a responsabilidade e a participação social; a solidariedade humana (n. 24-32).
São João XXIII, na encíclica Pacem in Terris, afirma que, em nosso tempo, não é racional que a guerra seja usada como instrumento da justiça (cf. n. 67). Ele, que viveu de perto os horrores da guerra, cita Pio XII: “Com a paz, nada se perde. Tudo, com a guerra, pode ser perdido” (n. 62).
O Beato Paulo VI, em sua memorável Populorum Progressio, reafirma a completa exclusão da violência do ideal de sociedade coerente com a dignidade humana. São João Paulo II, na Mensagem para o Dia Mundial da Paz de 2002, recorda que “não há paz sem justiça, nem justiça sem perdão”.
Na sua mensagem para o Dia Mundial da Paz de 2007, Bento XVI recorda que a raiz da ausência de paz está localizada no contexto da desigualdade social: “Na raiz de não poucas tensões que ameaçam a paz, estão certamente as inúmeras injustas desigualdades ainda tragicamente presentes no mundo. De entre elas são, por um lado, particularmente insidiosas as desigualdades no acesso a bens essenciais, como a comida, a água, a casa, a saúde; e, por outro lado, as contínuas desigualdades entre homem e mulher no exercício dos direitos humanos fundamentais”. Fica evidente aqui a necessidade de superar a violência superando as desigualdades sociais.
Em tempos recentes, o papa Francisco recorda que a superação da violência passa pela fraternidade, fundamento e caminho para a paz. Surge espontaneamente a pergunta: Poderão um dia os homens e as mulheres deste mundo corresponder plenamente ao anseio de fraternidade neles gravado por Deus Pai? Conseguirão, meramente com as suas forças, vencer a indiferença, o egoísmo e o ódio e aceitar as legítimas diferenças que caracterizam os irmãos e as irmãs? Parafraseando as palavras do Senhor Jesus, poderemos sintetizar assim a resposta que ele nos dá: dado que há um só Pai, que é Deus, vós sois todos irmãos (cf. Mt 23,8-9). A raiz da fraternidade está contida na paternidade de Deus. Trata-se, por conseguinte, de uma paternidade eficazmente geradora de fraternidade, porque o amor de Deus, quando é acolhido, se transforma no mais admirável agente de transformação da vida e das relações com o outro, abrindo os seres humanos à solidariedade e à partilha ativa.
3.Agir na realidade
A superação da violência não é uma teoria, mas deve ser um caminho de ativa transformação. Essa mudança passa pela pessoa, pela comunidade e pela sociedade. A conversão conjugada dessas três realidades é uma trilha segura para todo desejo de superação.
Antropologia da mudança
As pessoas não estão inseridas no mundo para viver isoladamente, mas dependem do “outro” para viver. Essa condição, que favorece a prática relacional, desafia a todos – como sujeitos da própria história – a cuidar do outro, ou seja, a fazer parte da história do outro.
A superação da violência passa pela conversão pessoal. É preciso assumir a espiritualidade do seguimento de Jesus, o modelo de pessoa que escolheu ser não violento. A conversão, compreendida na mudança de atitudes e comportamentos, é a principal proposta que a liturgia quaresmal oferece.
O mundo muda quando a pessoa muda. Para que isso aconteça, é preciso adotar uma postura correspondente à de Jesus, promovendo a cultura da paz, adotando mídias alternativas, que não tratam a violência com sensacionalismo, participando dos conselhos paritários e de políticas públicas para a superação da violência, valorizando a instituição familiar, vivendo uma vida menos consumista, pedindo e oferecendo perdão, adotando a cultura da empatia. E recordando-se sempre de que o outro não é apenas o outro: ele é irmão.
Comunidades comprometidas
Cabe aqui fazer uma salutar memória da caminhada pastoral da Igreja no Brasil, a qual, ao longo dos anos, motivada pelo espírito da profecia e da luta pela fraternidade, por meio de suas pastorais sociais, tem dado passos gigantescos na superação da violência.
As Diretrizes Gerais da Ação Evangelizadora da Igreja no Brasil 2015-2019 (DGAE) recordam: com as atitudes de alteridade e gratuidade, expressões do amor, os discípulos missionários promovem a justiça, a paz, a reconciliação e a fraternidade. Desse modo, oferecem à sociedade atual o testemunho do perdão e da reconciliação (Lc 23,34), que devem ser incessantemente manifestados e transmitidos (Mt 18,21-22) em um contexto de crescente violência. O caráter radical do amor de Deus atinge sua extrema manifestação no amor aos inimigos. A reconciliação supera toda divisão que nos afasta de Deus e nos separa uns dos outros (DGAE 12).
– Destaca-se o trabalho da Pastoral da Mulher Marginalizada como uma luz para o enfrentamento e a superação da violência contra a mulher.
– Outras experiências de superação e, consequentemente, de humanização dos processos sociais podem ser observadas na Pastoral da Saúde, da Pessoa Idosa, da Pessoa com Deficiência, da Criança e da Sobriedade, em que o “carisma” do cuidado se faz presente.
– O cuidado e a justiça iluminam os trabalhos da Pastoral Carcerária, Indigenista, do Menor, da Mulher Marginalizada, da Terra e o Grito dos Excluídos, em que os embates por políticas públicas de prevenção e superação da violência são por elas assumidos.
– Nas CEBs, na Pastoral Operária e no laicato, é possível compreender a missão de ser sal e luz no mundo.
– Outro trabalho de grande significado é aquele realizado com os usuários de álcool e drogas nos centros de recuperação, como a Associação Esperança e Vida e a Fazenda da Esperança, ou por pessoas de boa vontade que fazem de suas aptidões profissionais uma missão, acrescentando a “fé” e o “cuidado” no seu agir em relação ao outro.
Por fim, considerando a proposta da Pastoral do Menor, é possível recordar que ninguém nasce infrator. Cabe a todos a missão de ir ao encontro do “outro”. Esse “outro” é o mesmo que o Evangelho de Mateus nos apresenta: “Estive preso e foste me visitar”.
No decorrer da história, várias iniciativas sociais da Igreja foram sendo assumidas pela sociedade e se tornaram políticas públicas. Portanto, o olhar social da Igreja exigiu posicionamento do Estado em relação ao sofrimento humano por ele negligenciado.
Sociedade: a mudança de paradigma
Pensar a superação da violência no interior do sistema capitalista, que mantém sua centralidade no lucro econômico, e não no ser humano, exige grande esforço na identificação e compreensão das iniciativas que sinalizam possibilidades de enfrentamento e superação da violência. Essas iniciativas, pensadas e desenvolvidas em harmonia com a manutenção desse sistema, no qual o ser humano é apenas um objeto para o consumo, tornam-se “paliativos” para a cultura da não violência (cf. Texto-base da CF-2018).
Portanto, enquanto uma mudança de paradigmas não acontece, é preciso voltar-se para algumas iniciativas que favorecem a construção de uma cultura da paz, mediante a consolidação de políticas públicas e a participação de conselhos paritários de direitos, para o enfrentamento da violência que se desenvolve nos âmbitos de sua abrangência, como é o caso da violência doméstica na sociedade brasileira.
Urge uma reação cidadã, com incidências transformadoras em vários níveis. Só assim será fortalecida a cultura da liberdade e da autonomia, para mitigar a violência e o desrespeito à dignidade.
Sofre-se pela falta de lideranças com estatura, em diferentes níveis. Encontra-se, com maior facilidade, quem levanta a voz para a reclamação e a lamentação, ou mesmo para o vandalismo. Há carência de pessoas que se dediquem a uma atuação mais criativa, corajosamente inovadora e cidadã, especialmente no âmbito governamental, primeiro responsável pelo bem comum. Os descompassos produzidos por tantos desencontros e equívocos nas escolhas das prioridades sociais – por falta de competência humanística e de ajustada visão antropológica de muitos profissionais da política –, ao lado da sede mesquinha de dinheiro, resultam na incapacidade de gerar redes de solidariedade.
Conclusão
A superação da violência começa pelo respeito à dignidade da pessoa humana, defendendo e promovendo a dignidade da vida humana em todas as etapas da existência, desde a fecundação até a morte natural, tratando o ser humano como fim, e não como meio. A proposta é a superação da violência. Para concluir, bastam as palavras do papa Francisco no encontro com os presidentes Abbas (Palestina) e Peres (Israel) no ano de 2014: “Ouvimos um chamado e devemos responder: o chamado a romper a espiral do ódio e da violência, a rompê-la com uma única palavra: ‘irmão’. Mas, para dizer essa palavra, devemos todos levantar os olhos ao céu e reconhecer-nos filhos de um único Pai”.
Luis Fernando da Silva
Pe. Luis Fernando da Silva, presbítero da Diocese de São João da Boa Vista/SP, secretário-executivo da Campanha da Fraternidade, membro do Fundo Nacional de Solidariedade e diretor editorial das Edições CNBB.
In: Vida Pastoral – janeiro/fevereiro 2018
O desejo de tirar a própria vida entre os jovens encontra na era digital uma nova forma de se propagar.
Jogo da Baleia Azul e série “13 Reasons Why” mostram por que é preciso quebrar o silêncio em torno desse desafio.
A questão do suicídio, especialmente, entre os jovens é urgente e inadiável. Jovens no mundo inteiro estão tirando a sua própria vida. É um problema que vem rompendo o silêncio com a emergência do jogo da ´baleia azul’ nas redes sociais e da série ’13 Reansons why’. O jogo e a série de TV não é o problema: é apenas uma parte ínfima, quase desprezível, do problema.
Reportagens de diferentes jornais e revistas revelam dados estatísticos impressionantes. Na mais recente pesquisa feita pela OMS (Organização Mundial da Saúde), divulgada no Jornal O Globo em 05.09.2014, a organização lança o primeiro relatório global sobre o suicídio, revelando que a violência auto infligida é um problema de saúde pública. A pesquisa aponta que cerca de 804 mil pessoas se suicidaram em 2012, ou seja, uma média de 11,4 mortes por 100 mil habitantes. Tais números tem um grande impacto econômico na saúde pública. Em números absolutos, o Brasil figura como o oitavo país com mais suicídios.
Globalmente, o suicídio representa 50% das mortes violentas entre os homens e 71% entre as mulheres, e é a segunda principal causa de morte entre jovens de 15 e 29 anos, perdendo apenas para os acidentes de trânsito.
Falar sobre o suicídio nos coloca diante do irrepresentável, que é a nossa própria morte. Com isso, a morte torna-se algo da ordem do indizível. O tema do suicídio é ainda mais difícil de lidar. Há uma diferença entre enfrentar uma morte “natural” ou ter que enfrentar uma morte por suicídio, onde as pessoas ao redor, sobretudo, a família, passam a se indagar sobre o que poderiam ter feito, quais foram os motivos desse ato, culpando-se e interpelando-se.
Importante nesse debate é diferenciar o suicídio propriamente dito da tentativa de suicídio e da ideação suicida, comportamentos que também rondam os jovens de hoje. O suicídio é caracterizado por um ato auto-agressivo global, realizado conscientemente pelo próprio sujeito, quando acredita que este ato deverá causar de um modo eficiente e suficiente o efeito esperado. Já a tentativa de suicídio seria um ato não fatal de automutilação, auto-envenenamento ou de intoxicações medicamentosas. Este ato ocorre deliberadamente, porém não há uma intenção de morte. E a ideação suicida refere-se ao pensamento de se matar. Há ainda uma nova categoria surgindo entre a juventude que é denominada como suicídio inconsciente, em que o sujeito se coloca em situações de risco, com comportamentos autodestrutivos.
É possível afirmar que as fantasias de suicídio não são evitáveis na adolescência, pois fazem parte de sua condição subjetiva no tempo presente. Os adolescentes sentem uma espécie de prazer com as fantasias de suicídio, numa tentativa de posse sobre si mesmo, uma pseudo-apropriação do seu corpo. Vale mencionar aqui a “brincadeira do desmaio”, tão frequente entre os jovens, onde os adolescentes chegam à perda de consciência pela apneia. Os amigos pressionam o peito daquele que quer desmaiar, provocando falta de oxigenação no cérebro e, consequentemente, o desmaio. Ao desmaiar, é como se o adolescente entrasse em contato com a experiência da morte, numa sensação de se desligar de seu corpo.
Sintomaticamente, o jogo da Baleia Azul é viral. São 50 desafios que envolvem automutilação e atividades arriscadas em geral. O último desafio é tirar a própria vida: só assim, eles dizem, você ganha o jogo. “Ganhar o jogo”, para muitos de nossos adolescentes e jovens, é se livrar da obrigação de continuar vivendo. Por que, afinal, é mais provável que as pessoas queiram se matar quando são jovens?
O fenômeno da automutilação tem sido observado em muitos adolescentes. É comum que os jovens afirmem se cortar para, segundo eles, aliviar a ansiedade. Diante de angústias que não conseguem dominar, por vezes, os adolescentes e jovens buscam sensações que os reassegurem e através da dor que eles próprios se infligem tentam contê-las. Recorrem a feridas físicas que podem controlar para diminuir o sofrimento psíquico, deixando de serem vítimas passivas para tornarem-se ativos nos limites que se impõem.
O papel da Escola Católica
Hoje, educar significa defender vidas. É preciso que se capte bem um ponto fundamental: processos vitais e processos cognitivos se tornam, nesse contexto, praticamente sinônimos. Note-se que isto significa adotar uma definição bastante nova do que se entende por “vida” e também do que se chama “conhecimento”.
A escola deve ser consciente, por um lado, de que não é a única instância educativa, mas pelo outro, não pode renunciar a ser aquela instância que tem o papel fundamental de suscitar nos jovens um novo sentido para a vida.
Educar hoje em nossos centros educativos requer de nós, educadores católicos, romper com um paradigma de “crise de sentido”. Num livro clássico sobre o sentido para a vida, o teólogo Clodovis Boff, apresenta-nos que o sentido é algo fundamental para a vida humana e que viver sem sentido é algo impossível, pois faz parte da nossa ontologia, porém muitos ignoram essa essência, insistem em viver com o Ter e não com o Ser, viver por viver, vivendo assim sem sentido, fato que traz muitos danos tanto para o ser humano como para toda a sociedade. (BOFF, Clodovis. O livro do sentido: crise e busca de sentido hoje (parte crítico-analítica). Volume 1.São Paulo: Paulus, 2014).
A Escola Católica precisa de encontrar caminhos para fazer eco ao imperativo cristológico: “Eu vim para que vocês tenham vida, e vida em abundância” (Jo 10, 10). Aqui se encontra a nossa contribuição enquanto educação católica. A tarefa de todo educador, não apenas do professor, é a de formar ser humanos felizes e equilibrados, orientados para um projeto de vida que seja capaz de dialogar com os sentimentos mais profundos dos jovens hoje.
A crise de sentido, que assola os jovens hoje, nasce a partir da configuração da nossa sociedade que é fundamentalmente desencantada. As coisas perderam seu sabor, principalmente pelas influencias dos maus usos das novas tecnologias e do capitalismo, tonando a vida apática, sem sentido, sem graça e tediosa, pois eliminamos a dimensão transcendente da vida, de modo que nada mais tem valor e encanto.
Para Clodovis Boff, e para nós educadores cristãos, só há uma alternativa para o sentido que ser humano busca, que é a Transcendência. Uma autêntica e verdadeira experiência de Deus. Podemos vislumbrar o sentido da vida a partir do anúncio do Reino de Deus. A partir do evangelho, podemos afirmar que o sentido da vida cristã se encontra na adesão a Jesus e seu projeto. Jesus, Deus encarnado na história, é o sentido último da vida humana. Precisamos educar nos tempos de hoje com esse postulado, fazendo deste princípio o núcleo fundamental de todo o projeto pedagógico de nossas escolas. Assim vamos dar uma grande contribuição para o mundo atual nesse contexto de suicídio e crise no valor fundamental da vida.
Carlos Eduardo Cardozo
Especialista em Juventude. Trabalha na Equipe Diretiva do Colégio Stella Maris, da Rede Filhas de Jesus, no Rio de Janeiro. Integra o GT de Pastoral e ERE da ANEC-RIO. É autor do livro Jovens construindo juventudes, dentre outros artigos na área dos estudos de juventude.
Começando a Quaresma de 2017, introduzimos também o tema da Campanha da Fraternidade, que neste ano fala dos Biomas brasileiros, ligando a realização da vida humana com as realidades do território. A libertação do povo depende de sua sintonia com a terra, como diz a bíblia: “Se o Senhor nos quer bem, ele nos introduzirá nela e nos dará esta terra, onde corre leite e mel” (Nm 14,8).
“Fraternidade: biomas brasileiros e defesa da vida” é o tema da Campanha deste ano. A fundamentação bíblica, identificada no lema: “Cultivar e guardar a criação” (Gn 2,15). Na criação, Deus aparece como sendo um oleiro, quando diz: “Então o Senhor Deus formou o ser humano com o pó do solo, soprou-lhe nas narinas o sopro da vida, e ele tornou-se um ser vivente” (Gn 2,7).
A natureza criada deve ser fonte de vida e de dar condições para que o ser vivente tenha condição de se sobreviver. Mas tudo deve contribuir para que a pessoa humana viva com dignidade, porque ela é o objetivo de toda a criação. Aí está a importância dos seis biomas do território brasileiro. Cada um deles deve oferecer o necessário para a população construir seus objetivos de vida.
A destruição dos biomas é uma transgressão à natureza. É tirar sua capacidade de preservação da vida, que depende de terra produtiva, fértil e trabalhável. Todos eles (Amazônia, Caatinga, Cerrado, Mata Atlântica, Pampa e Pantanal) têm sua biodiversidade prejudicada. Em determinados locais é impensável uma recuperação total, porque a exploração chegou a um grau máximo.
A dimensão econômica do poder é uma tentação. Não basta ter o necessário para uma sobrevivência com dignidade. O acúmulo mata a vida, porque impossibilita que outros sejam também felizes. Nessas condições não importa destruir, devastar, provocar deserto e matar o bioma. A força do poder não mede as consequências desastrosas para a grande massa impossibilitada para competir.
A reflexão da Quaresma nos ajuda a superar a ideologia do poder destruidor. É um caminho de conversão, porque o ser humano foi criado em íntima união com a terra. Terra que precisa ser cuidada com carinho, com respeito e responsabilidade. O trabalho feito nela tem que ser com sustentabilidade e assim ser preservada contra todo tipo de ação predatória, porque quem mais sofre é a pessoa humana.
Dom Paulo Mendes Peixoto
Arcebispo de Uberaba.
A arte do diálogo
Quem se propõe a praticar ecumenismo tem que ter condições de viver autenticamente a arte do diálogo. Nem sempre as pessoas conseguem conduzir bem um diálogo, seja com os irmãos de outra Igreja, seja com colegas de trabalho, seja até mesmo na própria família. Às vezes, aquilo que chamamos de diálogo acaba sendo outra coisa que, em vez de facilitar o relacionamento, acaba atrapalhando.
Vamos expor aqui algumas atitudes que perturbam o diálogo ecumênico. Recordando nossas próprias experiências, podemos acrescentar outras situações de impasse a esta lista de obstáculos.
a) Chamar de diálogo o que, de fato, é monólogo
Diálogo inclui calar e ouvir, mas trata-se de ouvir mesmo, de verdade, procurando entender as razões do outro.
b) Apresentar-se na defensiva, partindo do pressuposto de que o outro está mal-intencionado.
Sem uma certa boa vontade não há diálogo possível. Para começo de conversa, teremos que admitir que o outro usa de boa fé, até prova em contrário.
c) Substituir conhecimento de causa por preconceitos
O que sabemos sobre o outro? Como adquirirmos esse conhecimento? Fica difícil ter uma opinião correta sobre os irmãos de outras Igrejas se tudo que sabemos a respeito deles foi aprendido em polêmicas onde eles eram atacados e nos atacavam. Que tal ouvir com caridade o que eles próprios têm a dizer a respeito de sua fé?
d) Querer resolver em minutos problemas que têm raízes na história de muitos séculos
Nossas divergências estão bem plantadas na educação que recebemos. Muitas gerações cresceram ouvindo que o outro não era verdadeiro cristão. E não houve apenas calorosas discussões ao longo da história; houve guerras religiosas, correu sangue dos dois lados. Resumindo: há muito pecado cimentando a briga. Portanto, agora temos que ter paciência para corrigir o relacionamento que levamos tanto tempo estragando.
e) Começar por aquilo que nos separa
O que nos une é maior. É o próprio amor que todos temos a Jesus. Isso dá um excelente começo de conversa.
f) Despreparo em relação à doutrina da sua própria Igreja
Muitos católicos defendem a Igreja com argumentos que não têm mais (ou nunca tiveram) apoio naquilo que a própria Igreja ensina. Com isso se perdem na conversa e dão ao outro uma imagem errada a respeito da nossa identidade de fé. Ecumenismo é tarefa para quem sabe das coisas.
g) Espiritualidade deficiente
Não existe nada mais cativante do que a santidade. Fica muito difícil brigar com quem é transparência de Deus. Quem não cultiva a própria santidade dá ao outro uma triste ideia dos frutos que sua Igreja é capaz de produzir.
Para refletir
- No nosso diálogo ecumênico, quais os erros que mais cometemos?
- Vamos reler a letra g e comentar o texto.
(Texto extraído e adaptado do subsídio "Diálogo e Ecumenismo" da Catequese do Regional Leste 2)
Algumas indagações
Muita gente quer saber como ser ecumênico. Perguntam: O que é que se faz nesse campo? Que métodos usaremos? Que atividades são recomendáveis? Dizendo de outra forma, querem saber quais são as ações, as estratégias desse novo campo pastoral.
São indagações razoáveis. É importante saber o que fazer. Mas o ecumenismo de fato não é um conjunto de ações. É muito mais um modo de entender a própria fé. É, basicamente, um tipo de espiritualidade, se entendemos como espiritualidade aquele “filtro” através do qual vemos e interpretamos pessoas e acontecimentos.
Ser ecumênico exige conversão
Não há prática ecumênica que funcione quando não se é ecumênico de fato, sinceramente, do fundo do coração. Enquanto a conversão não nos transformar em pessoas que querem paz, que se despem de preconceitos, que se alegram com o bem praticado pelo outro, qualquer ato ecumênico pode ser dominação diplomaticamente disfarçada. Muitos irmãos evangélicos desconfiam do nosso ecumenismo. Supõem que queremos vencê-los com a simpatia em vez de tentar dominá-los pela força. Infelizmente, alguns católicos confirmam esses receios dos irmãos, pretendendo usar o ecumenismo como meio dissimulado de conquista.
Como chegar a um só rebanho e um só pastor
O Papa João Paulo II dizia que a oração é a alma do ecumenismo e que, nessa oração, deve-se pedir a conversão de coração. Vejam bem: não é conversão dos outros à nossa Igreja; é conversão do coração de todos, católicos e não católicos, ao projeto de Jesus. Queremos um só rebanho e um só pastor? Sim, mas isso não significa necessariamente uniformidade e – é bom não esquecer – o único pastor em questão é Jesus. Ele é maior do que tudo que nos pode separar. E, unidos nele, podemos até ser diferentes no que não for essencial, enriquecendo o cristianismo com modos variados de viver a fé.
Ser ecumênico é estar no caminho da santidade
Para um projeto desse tipo, é preciso cultivar algumas qualidades fundamentais: humildade, amor à verdade, despojamento, gratuidade, ternura fraterna, partilha desinteressada, lealdade, sinceridade, pureza de intenções, discernimento, carinho com a própria identidade de fé (é amando nossa Igreja que vamos compreender o amor que o outro tem à sua própria comunidade de fé). Teremos também que nos livrar de alguns vícios: apego ao poder, vaidade, egoísmo grupal, triunfalismo, preconceitos, orgulho, manipulação da verdade em favor dos nossos interesses ocultos ou declarados.
Não é difícil perceber que, com ou sem ecumenismo, cultivando essas qualidades e vencendo esses defeitos, estaríamos num magnífico caminho de santidade. E isso, afinal, é a melhor meta que pode ter um cristão, em qualquer Igreja.
- Que significa, na prática do ecumenismo, ser um só rebanho e um só pastor? Quem é o Pastor?
- Na Catequese, formamos as “virtudes ecumênicas” descritas aqui?
(Texto extraído e adaptado do subsídio "Diálogo e Ecumenismo" da Catequese do Regional Leste 2)
Algumas perguntas
O Papa Francisco constantemente nos pede diálogo ecumênico e inter-religioso, assim como o Papa João Paulo II. Muitos católicos ouvem, têm vontade de fazer alguma coisa, mas esbarram em algumas perguntas incômodas: Podemos fazer diálogo quando não há reciprocidade? Como é que se faz com grupos que nos atacam de forma agressiva? Como é que vamos conversar com quem não quer aproximação conosco?
Não são perguntas descabidas.
O diálogo já começou!
O movimento ecumênico conta com a adesão efetiva de muitas Igrejas protestantes e ortodoxas. Seis delas participam conosco do Conselho Nacional de Igrejas Cristãs – CONIC (Igreja Evangélica de Confissão Luterana no Brasil, Igreja Metodista, Igreja Anglicana, Igreja Ortodoxa Siriana, Igreja Presbiteriana Unida, Igreja Cristã Reformada). Com essas, a conversa já começou e, mesmo que alguns membros tenham resistência ao ecumenismo, há caminhos abertos e compromissos assumidos em conjunto.
Infelizmente, nem todos entram na barca do ecumenismo
O universo evangélico é muito diversificado. Há Igrejas de todo tipo, inclusive algumas cujas intenções, infelizmente, temos que reconhecer que não são sérias. Nesse caso, cabe mostrar onde se está tomando o nome de Deus em vão para enganar o povo. Existem também umas outras que, embora sejam organizações dignas de muito respeito, não nos vêem com bons olhos e prepararam seus fiéis para nos vencer numa guerra em nome de Jesus.
O que já podemos fazer
É claro que não podemos forçar o outro a entrar em diálogo. O que fazer? Algo sempre se pode fazer: rezar pela união dos cristãos, pedir a Jesus que ilumine os que são seus discípulos. Podemos também esclarecer pacificamente alguns aspectos da fé que o outro não compreende.
O que não devemos fazer
Mesmo nos casos mais difíceis, podemos indicar pelo menos algumas coisas que não devemos fazer. Vejam:
- Responder à agressão com agressão. Seria pôr mais lenha na fogueira. Alguns até gostariam que respondêssemos às provocações: brigar com a “grande” Igreja Católica dá publicidade!
- Julgar todos os grupos religiosos pelo comportamento de alguns. Não é tudo “farinha do mesmo saco”.
- Deixar de amar as pessoas, mesmo se supomos que estejam mal intencionadas.
- Gastar em “preparação para a guerra” as energias que podem ser empregadas para formar serenamente os católicos. Se aprendermos mais sobre a fé católica, não é para “vencer o debate”; é para amar melhor a Deus e aos irmãos.
- Desistir de colaborar com aqueles que querem dialogar conosco.
Um exemplo bonito
Nesse terreno, muito ecumenicamente, talvez pudéssemos aprender alguma coisa do comportamento de um santo irmão da Igreja Batista, o pastor Martin Luther King. Ao encontrar sua casa queimada pelos brancos, e sua família ao desabrigo, em vez de pensar em retribuir a agressão, ele fez um estranho convite a seus irmãos negros: “Vamos amá-los tanto que um dia terão vergonha de ter feito isto conosco”. É isso aí! Só existe um jeito cristão de acabar com um inimigo: transformá-lo em amigo, com a força da ternura desarmada, sem segundas intenções.
- Confiram sua realidade ecumênica com o que está escrito acima.
- Estamos cometendo alguns dos “pecados” contra o ecumenismo, assinalados aqui?
(Texto extraído e adaptado do subsídio "Diálogo e Ecumenismo" da Catequese do Regional Leste 2)
imagem: pexels.com
Querendo começar a dialogar com os irmãos cristãos de outras Igrejas, alguns desanimam porque a conversa acaba virando discussão sobre as divergências doutrinárias. Isso acontece porque essas pessoas tomam um caminho que não é o mais conveniente para o diálogo. Não é por aí que se começa.
O Documento “Diálogo e Anúncio” (do Pontifício Conselho para o diálogo inter-religioso) nos inspira um caminho mais interessante, em quatro etapas. Vejam só:
É a boa convivência que podemos ter com vizinhos, amigos, companheiros de trabalho, conhecidos de outra Igreja. Nesse convívio trocamos pequenos favores, conversamos, partilhamos alegrias, problemas, descobertas. Aí descobrimos que o irmão da outra Igreja pode ser ótima pessoa e talvez ele comece a pensar o mesmo a nosso respeito.
Diante das necessidades da comunidade, há muita coisa que cristãos de Igrejas diferentes podem fazer juntos para socorrer os que sofrem. Para fazer em conjunto uma campanha de agasalho, uma passeata para pedir posto de saúde, um trabalho de alfabetização de adultos, não é preciso discutir doutrinas. Mas esse trabalho em conjunto ajudará a perceber que o ideal que anima a todos é alimentado nas respectivas Igrejas. Cada um pode começar a descobrir que a Igreja do outro também dá bons frutos.
Em cerimônias ecumênicas ou nas alegrias e aflições diárias, cristãos de denominações diferentes podem unir-se em oração solidária. Isso já requer um certo cuidado com a sensibilidade e a habitual maneira de cada grupo se dirigir a Deus, mas há um vasto repertório de tradições comuns que pode ser partilhado nesta hora. Se houver verdadeiro clima de oração, dificilmente alguém será tentado a aproveitar o momento para “dar lições” ou contestar a fé do companheiro.
Se as três etapas anteriores tiverem sido bem vividas, haverá muito pouco espírito belicoso na hora de confrontar as inevitáveis diferenças. Ainda assim, esta etapa será realizada em mais profundidade pelos peritos mais preparados em cada grupo. Discutir doutrina com quem sabe pouca doutrina não é muito esclarecedor e pode dar uma falsa ideia da Igreja em questão.
“Devagar com o andor que o santo é de barro!” – costuma dizer o povo. Isso se aplicaria ao diálogo ecumênico. É urgente e indispensável, mas precisa ser feito sem ânsia de resultado imediato, devagar, dando tempo para o Espírito do Senhor nos converter a todos.
- Na sua comunidade, vocês chegam a fazer o diálogo de vida, de ação e de oração?
- De que modo isto também poderia entrar na Catequese?
Inês Broshuis
(Texto extraído e adaptado do subsídio "Diálogo e Ecumenismo" da Catequese do Regional Leste 2)
imagem: pexels.com
Quando tratamos de ecumenismo, algumas pessoas ficam um pouco confusas, divididas entre a vontade de acolher o irmão de outra Igreja e um sentimento de que isso não seria exatamente uma atitude correta.
No fundo desse mal-estar, frequentemente se encontra a idéia que cada um tem do que sejam as exigências da salvação. Em outras palavras, a pessoa raciocina mais ou menos assim: “Eu sei que é na Igreja Católica que está a salvação. Se eu aceito esta pessoa que tem outro jeito de ser cristã, não estarei me desinteressando da salvação dela? Não deveria fazer o possível para convertê-la à minha Igreja para que ele possa salvar-se?”
De fato, se a pessoa achar que todos os não-católicos estão condenados, cortados da salvação, só lhes restam dois caminhos: lutar contra as outras Igrejas ou tentar usar o ecumenismo como uma maneira diplomática de atrair o outro para o nosso rebanho (e isso seria uma traição ao próprio espírito do ecumenismo).
Já faz muito tempo que a Igreja proclamou a possibilidade de salvação dos não católicos. Mas parece que, apesar de estarmos vivendo no universo da comunicação instantânea e global, a notícia custa muito a chegar à maioria dos católicos.
Entre outras coisas, lemos na Constituição Lumen Gentium, nº 16:
“Aqueles, portanto, que, sem culpa, ignoram o evangelho de Cristo e sua Igreja, mas buscam a Deus com coração sincero e tentam, sob o influxo da graça, cumprir por obras a sua vontade conhecida através do ditame da consciência, podem conseguir a salvação eterna, e a Divina Providência não nega os auxílios necessários àqueles que sem culpa ainda não chegaram ao conhecimento de Deus e se esforçam, não sem a divina graça, por levar uma vida reta.”
O Concílio diz isso sobre quem nem sequer tem conhecimento da existência de Deus. Com mais razão afirmaremos a possibilidade de salvação dos irmãos que, batizados como nós, crêem em Jesus e vivem essa fé em outra Igreja, com a pura consciência de estarem fazendo o melhor para servir ao Senhor.
Para refletir
1. Você acha que é importante abordar a questão da salvação na Catequese? Por quê?
2. Hoje em dia, consideramos o termo “salvação” num sentido mais amplo: salvar o homem todo e todos os homens. Que dimensão acrescenta isto ao ecumenismo?
Inês Broshuis
(Texto extraído e adaptado do subsídio "Diálogo e Ecumenismo" da Catequese do Regional Leste 2)
imagem: pexels.com
O Catecismo da Igreja Católica diz coisas muito bonitas sobre o Batismo: é fundamento da vida cristã, é a porta da vida no Espírito, nos torna membros de Cristo, nos faz participar do seu sacerdócio...
São coisas que todos nós já ouvimos alguma vez na vida, nas muitas oportunidades de catequese pelas quais passamos.
O que não estamos acostumados a ouvir é que este Batismo também acontece, com os mesmos efeitos, em outras Igrejas que não são a nossa.
O reconhecimento da validade do Batismo de outras Igrejas é passo de grandes consequências para o nosso relacionamento com os demais cristãos.
Onde houver um Batismo válido, teremos que admitir que o irmão cristão é, como nós, membro do Corpo de Cristo e participa do seu sacerdócio. Temos que admitir que a outra Igreja, na qual aconteceu esse sacramento, de alguma maneira faz parte da única Igreja de Jesus, na qual também estamos nós.
O mesmo Catecismo da Igreja Católica, citando texto do Concílio, afirma:
“Com efeito, aqueles que crêem em Cristo e foram validamente batizados estão constituídos em uma certa comunhão, embora não perfeita, com a Igreja Católica. Justificados pela fé no Batismo, são incorporados a Cristo e, por isso, com razão, são honrados com o nome de cristãos e merecidamente reconhecidos pelos filhos da Igreja Católica como irmãos no Senhor.” (CIC 1217)
Que Igrejas são essas, cujo Batismo é oficialmente considerado válido pela Igreja Católica? Como há centenas de Igrejas que se consideram cristãs (e muitas outras sendo fundadas diariamente), é impossível fazer listas exatas. Mas, consultando notas ao texto do Código de Direito Canônico, vemos, por exemplo, que é sempre válido o Batismo feito nas Igrejas Orientais, na Igreja Anglicana, na Luterana e na Metodista.
Se o rito for executado direitinho, também é válido o Batismo dos presbiterianos, batistas, adventistas, congregacionais e de muitos pentecostais. Cristãos batizados corretamente nessas Igrejas não podem ser batizados de novo se resolverem tornar-se católicos.
Em geral, para considerar a validade do Batismo entram em cena três critérios:
a) que seja feito com água
b) que seja feito em nome da Trindade
c) que quem batiza tenha, de fato, legítima intenção de inserir o batizado na Igreja de Cristo.
Por falta de alguns desses elementos, há Igrejas cujo Batismo costuma ser considerado duvidoso (por exemplo: Mormons, Igreja Brasileira etc.) e outros grupos religiosos onde o Batismo é visto como decididamente inválido (Testemunhas de Jeová, Ciência Cristã, Umbanda).
O ecumenismo começa justamente com essas Igrejas onde possuímos em comum esse grande fundamento do Batismo, embora tenhamos que ser respeitosos e dialogantes com todos os tipos de crença sinceras. Mas para isso é preciso que se ensine aos católicos como é que sua Igreja vê essa questão. Quantos católicos você conhece que estão bem informados nesse assunto? Não seria importante conhecer mais a fundo essa questão? Não estaremos tratando como rivais os que deveriam ser acolhidos como irmãos?
Vamos ler Jo 15,1-8
Quem são os ramos de que o Evangelho fala?
Podemos pensar que as diversas Igrejas cristãs são os ramos do mesmo tronco?
Que consequências isso traz para o ecumenismo
Inês Broshuis
(Texto extraído e adaptado do subsídio "Diálogo e Ecumenismo" da Catequese do Regional Leste 2)
Um fato
Certa vez, alguém convidou um agente de pastoral para um trabalho ecumênico junto com a Igreja Metodista e ele respondeu: “Não me meto nessas coisas porque sou católico!”
Pode ser que fosse mesmo católico, mas era pelo menos um católico que desconhecia o que a sua própria Igreja ensina sobre o relacionamento e a colaboração com outros cristãos.
Ser ecumênico, hoje, na Igreja Católica, não é decisão opcional de gente avançada em busca de novidades. É parte integrante da doutrina da Igreja. Se alguém duvida, leia com cuidado o que dizia o Papa João Paulo II: ...“o ecumenismo, o movimento a favor da unidade dos cristãos, não é só uma espécie de apêndice, que se vem juntar à atividade tradicional da Igreja. Pelo contrário, pertence organicamente à sua vida e ação, devendo, por conseguinte, permeá-la no seu todo” ... (Ut Unum Sint 20)
Poderíamos dizer com outras palavras: nós, católicos, não escolhemos ser ecumênicos apesar de sermos católicos, nem fazemos disso uma preferência particular, à margem da nossa participação na Igreja; somos ecumênicos exatamente por sermos católicos. E ao termos tal atitude, estamos seguindo orientações já antigas, que vêm do Concílio Vaticano II (1962-1965):
“Este Sagrado Concílio exorta todos os fiéis a que, reconhecendo os sinais dos tempos, solicitamente participem do trabalho ecumênico” (Unitatis Redintegratio, 4).
Alguns, com certa razão, haveriam de perguntar: “Não haveria riscos aí? Como vamos ser ecumênicos se ninguém nos preparou para isso? Tanta gente nem sabe muito bem a doutrina fundamental da Igreja Católica, e agora temos que entrar em diálogo com Igrejas diferentes? Vai dar a maior confusão!... “
É verdade que outras prioridades têm capturado a atenção da nossa Igreja e poucos se preocupam em nos dar elementos para lidar com a exigência do ecumenismo. Mas, a cada dia que passa, torna-se mais urgente capacitar leigos e clero para essa aproximação fraterna, desejosa de paz.
Nosso mundo moderno, urbano, pluralista, nos coloca todo dia em contato com pessoas de outras denominações religiosas. O cotidiano nos apresenta situações que exigem uma tomada de posição.
Esse posicionamento, é claro, será um tanto diferenciado, de acordo com o grau de afinidade que tivermos com outros grupos religiosos. Por exemplo, estamos muito próximos das Igrejas ortodoxas. As chamadas Igrejas protestantes históricas também não nos são estranhas. Com várias delas já há entendimentos em nível oficial e participação conjunta em organismos ecumênicos. Mas com algumas Igrejas pentecostais a dificuldade é maior.
E temos também que exercer o devido espírito crítico quando algum grupo religioso se estabelece com intenções mais questionáveis, se houve sinais de manipulação interesseira dos sentimentos do povo.
É chegado o tempo de mudar de atitude, de buscar o diálogo em vez de preparar para a guerra. A mudança nos trará um outro enorme benefício, além da própria paz, da concórdia, do respeito mútuo, da fraternidade, da humildade, que são sempre coisas ótimas! É que, para conversar em paz com os de fora, vamos ter que conhecer melhor o que a nossa Igreja crê. Ou seja: para sermos ecumênicos teremos que ser melhores católicos.
Qual a sua experiência com outras Igrejas cristãs? Foi positiva?
Pode-se ser ecumênico sem conhecer bem a sua própria religião? O que isso tem a ver com a catequese?
Inês Broshuis
(Texto extraído e adaptado do subsídio "Diálogo e Ecumenismo" da Catequese do Regional Leste 2)
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