Caro Jovem... À vida, não é permitido dizer adeus antes da hora!
Quando um jovem não suporta mais a dor da existência e resolve dizer adeus antes do tempo, a humanidade inteira deveria ficar em prantos. A família e a escola – lugar de encontro e de afetos – deveriam oferecer aos que ficaram ao menos algumas razões para querer permanecer. As religiões todas, sem exceção, deveriam se questionar: os jovens de hoje ainda se reconhecem no rosto “deste deus” que estamos apresentando a eles?
Toda morte prematura – seja por excesso de violência ou falta de sentido – deveria doer em nós e causar-nos verdadeiro choque existencial. Nossa vida, comodamente tão “cheia de sentido”, deveria estremecer por alguns segundos e nos fazer recobrar o sentido de pertença à humanidade e o nosso elo de compaixão com todas as criaturas.
Diante da dor e da finitude, as respostas são sempre escassas. Algumas perguntas, no entanto, são inevitáveis. Na condição de ser humano (e, depois, como cristão), poderia eu ter feito algo por meu semelhante que sofria calado, ainda que fosse um simples “Oi, tudo bem?”. Por que não o fiz? Culpa da pressa? Da minha cegueira interior? Ou da minha falta de compaixão pelo próximo?
Nunca é tarde para entender que todos aqueles que partem também são parte de mim. O meu cristianismo se recusa a ser indiferente à dor de meu irmão. Aliás, a morte de nenhum ser humano pode ser estranha à minha maneira de acreditar na vida. Cada ser é um mistério que não se desvela sozinho. Ninguém pode viver com sentido, se não se permitiu ser amado, seja por uma criatura humana ou por um Ser superior. O amor é a única forma de vida capaz de evitar que a morte se antecipe.
Se você é jovem e, algumas vezes, tem se sentido angustiado, perdido, meio distante ou inquieto por dentro, ou ainda com um milhão de perguntas sem respostas... Não se preocupe. Não há nada de errado com você. Solidão e tristeza são parte constitutiva de nossa humanidade. Viver é reconhecer, o tempo inteiro, a nossa fraqueza e insuficiência, mas sem nos render a elas. Viver é uma batalha diária contra nós mesmos e nossos medos.
Decerto, em algum lugar existe alguém à sua espera, alguém que gostaria de escutar suas aventuras, seus desejos, suas histórias. Em algum lugar do mundo, sempre existe alguém que poderá nos olhar sem nenhum julgamento. Apenas não desista de suas buscas. Não abandone o barco antes de vencer a onda mais forte. Lembre-se que, mesmo em meio ao sofrimento, a vida esconde um sentido. Ainda que exista sempre alguém querendo viver um pouco mais, o tempo não espera mais que o necessário. Apesar de tudo, viver é uma graça!
Por mais que, algumas vezes, você ache que ninguém lhe aceita ou lhe ama de verdade, não se deixe enganar por essa voz fantasiosa. Saiba que alguém sonhou com a sua existência. Mesmo que esse alguém nunca tenha revelado nada a esse respeito. Ah! E mesmo que ninguém nunca tenha feito você se sentir amado e importante, ainda assim não haveria motivos para desistir da vida. Sabe por quê?
“Você é o meu Filho amado, em ti eu ponho meu agrado” (Marcos 1,11). Foi esta a voz que fez Jesus vencer todo seu sofrimento e superar o peso da cruz. Ele escolheu ouvir essa voz desde seu Batismo até o fim! E, embora em algum momento, ele também tenha se sentido abandonado, Jesus sabia que a Voz ainda estava ali. Havia muitas outras vozes dizendo coisas horríveis sobre ele, mas o Mestre da compaixão não deu ouvido a seus inimigos internos. Escutava apenas a Voz que vinha do alto: “Eu acredito que você é capaz”.
Esta mesma voz que fez Jesus vencer suas angústias e “beber o cálice da vida” até o fim continua aí dentro de você! Por isso, não esqueça: “Você é o amado de Deus”. “Você é a amada de Deus”. Estas palavras revelam a mais íntima verdade sobre todos os seres humanos, pertençam eles ou não a alguma religião. Infelizmente, muitos acabam fechando os olhos e os ouvidos a esta verdade e passam a vida inteira mendigando afetos. Outros preferem crer naquelas vozes que só lhe dizem as piores mentiras: “você é fraco, você não é querido, você não é ninguém”. O bom de tudo isso é que a escolha é única e tão somente sua! A quem você tem dado ouvidos? Quem você escolheu para confidenciar suas dores e suas verdades?
Quanto mais nos afastarmos de nossa voz interior, mais acreditaremos nas vozes que desconhecem a nossa verdadeira essência. Como dizia Henri Nouwen, “os seres humanos são muito inconstantes em seus julgamentos. Deus, e apenas Deus, nos conhece em nossa essência, nos ama absolutamente, nos perdoa totalmente e se lembra de nós pelo que realmente somos”. Quando escutamos a voz errada, passamos a duvidar de nossa capacidade e de nossa força. Esquecemos quem realmente somos e para onde estamos indo. A maior dor da existência, não é ser desprezado por alguém, mas sermos abandonados por nós mesmos. Que nenhuma decepção nos faça esquecer quem realmente somos. “Você é o meu Filho amado, em ti eu ponho meu agrado”.
Quando passarmos a acreditar nas vozes que nos chamam de inúteis e detestáveis, então, um grande vazio existencial poderá tomar conta de nosso ser e, o que é pior, nos fazer acreditar que não valemos nada, que merecemos ser desprezados, colocados de lado, esquecidos, rejeitados e abandonados. Hei, pode parar! Essa voz é enganadora! Não dê ouvidos a ela! Nada do que vem de fora pode revelar a verdade última sobre você mesmo.
A autorrejeição, dizia Nouwen, costuma ser vista simplesmente como a expressão neurótica de uma pessoa insegura. Mas a neurose costuma ser a manifestação psíquica de uma escuridão muito mais profunda: a escuridão de não se sentir verdadeiramente acolhido pela existência humana. Segundo ele, “a autorrejeição é a maior inimiga da vida espiritual, porque contradiz a voz sagrada que declara sermos amados. Ser o amado, a amada expressa a verdade fundamental de nossa existência”.
Lembre-se: você é muito mais do que aquilo que pensam ou dizem a seu respeito. Você é muito mais do que aquilo que escrevem ou postam sobre você. Você é o amado, a amada de Deus. E sentir-nos amados por Ele significa assumir a nossa missão nesse mundo. Que não podemos “voltar para casa” antes de cumprir o projeto de amor que Ele nos confiou. Você já tentou descobrir a sua verdadeira vocação nesse mundo?
A verdadeira felicidade, não consiste em achar todas as respostas, mas viver dentro da procura. Sem se desviar da Voz interior que nos chama “amado”. Precisamos reconhecer que, neste mundo, ninguém é plenamente feliz. Todos nós passamos por crises e dificuldades. E todos nós podemos superar nossos medos. Somos todos buscadores. Ninguém está isento das noites escuras da vida. Assim como ninguém está liberado para voltar à morada do Pai antes do tempo.
Um dia, minha madrinha de crisma me olhou com compaixão e disse-me com os olhos cheios de verdade: “Sabe, Galvão... A sua história, com todas as feridas da infância e as agressões de seu padrasto, tinha tudo para dar errado, mas, graças à sua persistência, Deus voltou a acreditar em você novamente”.
Somente bem mais tarde, quando li Etty Hillesum, foi que entendi a verdade aquelas palavras. Quando estava à beira da morte, em meio aos horrores do campo de concentração, Etty rezou: “Vou ajudar-te, meu Deus, a não te extinguires em mim, mas nada posso garantir de antemão. Contudo, uma coisa me parece cada vez mais clara: não és tu que podes ajudar-nos, mas nós é que podemos ajudar-te – e aos fazermos isso, ajudamo-nos a nós mesmos”.
Por isso, caro jovem, não desista dos seus sonhos. Não desista de si mesmo. Porque Deus, embora pareça silencioso e distante, Ele continua acreditando em você!
FRANCISCO GALVÃO, autor do livro “O Cultivo Espiritual em tempos de conectividade”, lançamento Paulus 2018.