Prezados irmãos e irmãs!
Prosseguindo o tema da Confirmação ou Crisma, hoje desejo salientar a «íntima ligação deste sacramento com toda a iniciação cristã» (Sacrosanctum concilium, 71).
Antes de receber a unção espiritual que confirma e fortalece a graça do Batismo, os crismandos são chamados a renovar as promessas feitas um dia pelos pais e padrinhos. Agora são eles mesmos que professam a fé da Igreja, prontos para responder «creio» às perguntas dirigidas pelo Bispo; em particular, prontos para acreditar «no Espírito Santo, que é Senhor e dá a vida, e que hoje, mediante o sacramento da Confirmação, é conferido [a eles] de modo especial, assim como o foi aos Apóstolos no dia de Pentecostes» (Rito da Confirmação, n. 26).
Dado que a vinda do Espírito Santo exige corações recolhidos em oração (cf. At 1, 14), após a oração silenciosa da comunidade, o Bispo, impondo as mãos sobre os crismandos, suplica a Deus que lhes infunda o Santo Espírito Paráclito. Um só é o Espírito (cf. 1 Cor 12, 4), ao descer sobre nós traz consigo uma riqueza de dons: sabedoria, entendimento, conselho, fortaleza, ciência, piedade e santo temor (cf. Rito da Confirmação, nn. 28-29). Ouvimos o trecho da Bíblia com estes dons que o Espírito Santo traz. Segundo o profeta Isaías (11, 2), trata-se das sete virtudes do Espírito, infundidas sobre o Messias para o cumprimento da sua missão. Também São Paulo descreve o fruto abundante do Espírito, que é «caridade, alegria, paz, magnanimidade, afabilidade, bondade, fidelidade, mansidão e temperança» (Gl 5, 22). O único Espírito distribui os múltiplos dons que enriquecem a única Igreja: é o Autor da diversidade mas, ao mesmo tempo, o Criador da unidade. Assim o Espírito oferece todas estas riquezas, que são diversas mas, ao mesmo tempo, cria a harmonia, ou seja, a unidade de todas estas riquezas espirituais que nós cristãos temos.
Segundo a tradição atestada pelos Apóstolos, o Espírito que completa a graça do Batismo é comunicado através da imposição das mãos (cf. At 8, 15-17; 19, 5-6; Hb 6, 2). A este gesto bíblico, para melhor manifestar a efusão do Espírito que permeia quantos a recebem, acrescentou-se depressa uma unção de óleo perfumado, chamado crisma [eis um trecho da oração de bênção do crisma: «Por isso nós vos pedimos, Senhor, dignai-vos santificar e abençoar este óleo, dom da vossa Providência, e comunicar-lhe a virtude do Espírito Santo, pelo poder do vosso Cristo, de cujo santo Nome recebeu o nome de crisma; com ele ungistes os vossos sacerdotes, reis, profetas e mártires (...) recebida a unção santificante, e superada a corrupção do primeiro nascimento, que eles sejam templos da vossa majestade e exalem o perfume de uma vida santa» (Bênção dos óleos, n. 22)], que é usada até hoje, tanto no Oriente como no Ocidente (cf. Catecismo da Igreja Católica, 1289).
O óleo — o crisma — é substância terapêutica e cosmética que, entrando nos tecidos do corpo, cura as ferias e perfuma os membros; devido a estas qualidades foi escolhido pelo simbolismo bíblico e litúrgico para expressar a ação do Espírito Santo que consagra e permeia o batizado, adornando-o de carismas. O Sacramento é conferido mediante a unção do crisma na testa, realizada pelo Bispo com a imposição da mão e mediante as palavras: «Recebe o selo do Espírito Santo que te é oferecido como dom». [A fórmula «receber o Espírito Santo» — «o dom do Espírito Santo» aparece em Jo 20, 22, At 2, 38 e 10, 45-47]. O Espírito Santo é o dom invisível concedido, e o crisma constitui o seu selo visível.
Portanto, recebendo na testa o sinal da cruz com o óleo perfumado, o confirmado recebe uma marca espiritual indelével, o “caráter”, que o configura mais perfeitamente com Cristo, concedendo-lhe a graça de difundir entre os homens o “bom perfume” (cf. 2 Cor 2, 15).
Voltemos a ouvir o convite de Santo Ambrósio aos neocrismados. Diz assim: «Recorda que recebeste o selo espiritual [...] e conserva aquilo que recebeste. Deus Pai marcou-te, Cristo Senhor confirmou-te e colocou no teu coração o penhor do Espírito» (De mysteriis 7, 42: CSEL 73, 106; cf. CIC, 1303). O Espírito é um dom imerecido, que deve ser recebido com gratidão, criando espaço para a sua criatividade inexaurível. É um dom a conservar com atenção, a secundar com docilidade, deixando-se plasmar como cera pela sua caridade inflamada, «para refletir Jesus Cristo no mundo de hoje» (Exort. Apost. Gaudete et exsultate, 23).
Papa Francisco
Catequese na audiência geral de 30.05.2018
Estimados irmãos e irmãs, bom dia!
Depois das catequeses sobre o Batismo, estes dias que se seguem à solenidade de Pentecostes convidam-nos a refletir sobre o testemunho que o Espírito suscita nos batizados, pondo em movimento a sua vida, abrindo-a para o bem dos outros. Aos seus discípulos, Jesus confiou uma grande missão: «Vós sois o sal da terra, vós sois a luz do mundo» (cf. Mt 5, 13-16). Estas imagens fazem pensar no nosso comportamento, pois tanto a carência como o excesso de sal tornam desgostosa a comida, assim como a falta ou o excesso de luz impedem de ver. Somente o Espírito de Cristo nos pode oferecer verdadeiramente o sal que dá sabor e preserva contra a corrupção, e a luz que ilumina o mundo! E esta é a dádiva que recebemos no Sacramento da Confirmação, ou Crisma, sobre o qual desejo refletir convosco. Chama-se “Confirmação” porque confirma o Batismo, fortalecendo a sua graça (cf. Catecismo da Igreja Católica, 1289); assim como a “Crisma”, porque recebemos o Espírito mediante a unção com o “crisma” — óleo misturado com o perfume consagrado pelo Bispo — termo que remete para “Cristo” o Ungido de Espírito Santo.
O primeiro passo é renascer para a vida divina no Batismo; em seguida, é preciso comportar-se como filho de Deus, ou seja, conformar-se com Cristo que age na santa Igreja, deixando-se engajar na sua missão no mundo. Para isto provê a unção do Espírito Santo: «Sem a sua força, nada existe no homem» (cf. Sequência de Pentecostes). Sem a força do Espírito Santo, nada podemos fazer: é o Espírito que nos dá a força para ir em frente. Do mesmo modo como toda a vida de Jesus foi animada pelo Espírito, assim também a vida da Igreja e de cada um dos seus membros está sob a guia do mesmo Espírito.
Concebido pela Virgem por obra do Espírito Santo, Jesus empreende a sua missão depois que, saindo da água do Jordão, é consagrado pelo Espírito que desce e paira sobre Ele (cf. Mc 1, 10; Jo 1, 32). Ele declara-o explicitamente na sinagoga de Nazaré: é bonito o modo como Jesus se apresenta, qual é o bilhete de identidade de Jesus na sinagoga de Nazaré! Ouçamos como o faz: «O Espírito do Senhor está sobre mim, porque me consagrou com a unção; e enviou-me para anunciar a boa nova aos pobres» (Lc 4, 18). Jesus apresenta-se na sinagoga do seu povoado como o Ungido, Aquele que foi ungido pelo Espírito.
Jesus está cheio de Espírito Santo e é a fonte do Espírito prometido pelo Pai (cf. Jo 15, 26; Lc 24, 49; At 1, 8; 2, 33). Na realidade, na noite de Páscoa o Ressuscitado sopra sobre os discípulos, dizendo-lhes: «Recebei o Espírito Santo» (Jo 20, 22); e no dia de Pentecostes a força do Espírito desce sobre os Apóstolos de forma extraordinária (cf. At 2, 1-4), como nós sabemos.
A “Respiração” de Cristo Ressuscitado enche de vida os pulmões da Igreja; e com efeito, a boca dos discípulos, «cheios de Espírito Santo», abrem-se para proclamar a todos as grandes obras de Deus (cf. At 2, 1-11).
O Pentecostes — que celebramos no domingo passado — é para a Igreja o que foi para Cristo a unção do Espírito recebida no Jordão, ou seja, o Pentecostes é o impulso missionário a consumar a vida pela santificação dos homens, para a glória de Deus. Se o Espírito age em cada sacramento, é de modo especial na Confirmação que «os fiéis recebem como Dom o Espírito Santo» (Paulo VI, Const. Apost. Divinae consortium naturae). E no momento de fazer a unção, o Bispo pronuncia estas palavras: “Recebe o Espírito Santo, que te foi concedido como dom”: é a grande dádiva de Deus, o Espírito Santo. E todos nós temos o Espírito dentro. O Espírito está no nosso coração, na nossa alma. E o Espírito guia-nos na vida, a fim de que nos tornemos bom sal e boa luz para os homens.
Se no Batismo é o Espírito Santo que nos imerge em Cristo, na Confirmação é Cristo que nos enche com o seu Espírito, consagrando-nos suas testemunhas, partícipes do mesmo princípio de vida e de missão, segundo o desígnio do Pai celeste. O testemunho prestado pelos confirmados manifesta a recepção do Espírito Santo e a docilidade à sua inspiração criativa. Pergunto-me: como se vê que recebemos o Dom do Espírito? Se cumprirmos as obras do Espírito, se proferirmos palavras ensinadas pelo Espírito (cf. 1 Cor 2, 13). O testemunho cristão consiste em fazer unicamente e tudo aquilo que o Espírito de Cristo nos pede, concedendo-nos a força para o realizar.
Papa Francisco
Catequese na audiência geral 23.05.2018
Amados irmãos e irmãs, bom dia!
Hoje concluímos o ciclo de catequeses sobre o Batismo. Os efeitos espirituais deste sacramento, invisíveis aos olhos mas ativos no coração de quem se tornou criatura nova, são explicitados pela entrega da veste branca e da vela acesa.
Depois do lavacro de regeneração, capaz de recriar o homem segundo Deus na verdadeira santidade (cf. Ef 4, 24), pareceu natural, desde os primeiros séculos, revestir os recém-batizados com uma veste nova, cândida, à semelhança do esplendor da vida obtida em Cristo e no Espírito Santo. A veste branca, expressa simbolicamente o que aconteceu no sacramento e anuncia a condição dos transfigurados na glória divina.
Paulo recorda o que significa revestir-se de Cristo, explicando quais são as virtudes que os batizados devem cultivar: «Escolhidos por Deus, santos e amados, revesti-vos de sentimentos de ternura, de bondade, de humildade, de mansidão, de magnanimidade, suportando-vos uns aos outros e perdoando-vos reciprocamente. Mas acima de tudo, revesti-vos da caridade, que as une todas de modo perfeito» (Cl 3, 12-14).
Também a entrega ritual da chama acendida no círio pascal, recorda o efeito do Batismo: «Recebei a luz de Cristo», diz o sacerdote. Estas palavras recordam que não somos nós a luz, mas a luz é Jesus Cristo (Jo 1, 9; 12, 46), o qual, ressuscitando dos mortos, venceu as trevas do mal. Nós somos chamados a receber o seu esplendor! Assim como a chama do círio pascal acende cada uma das velas, também a caridade do Senhor Ressuscitado inflama os corações dos batizados, colmando-os de luz e calor. E por isso, desde os primeiros séculos, o Batismo chamava-se também “iluminação” e aquele que era batizado dizia-se que estava “iluminado”.
Com efeito, é esta a vocação cristã: «Caminhar sempre como filhos da luz, perseverando na fé (cf. Rito da iniciação cristã dos adultos, n. 226; Jo 12, 36).
Se se tratar de crianças, é tarefa dos pais, juntamente com os padrinhos e as madrinhas, ter o cuidado de alimentar a chama da graça batismal nas suas crianças, ajudando-as a perseverar na fé (cf. Rito do Batismo das Crianças, n. 73). «A educação cristã é um direito das crianças; ela tende a guiá-las gradualmente para o conhecimento do desígnio de Deus em Cristo: assim poderão ratificar pessoalmente a fé na qual foram batizadas» (ibid., Introdução, 3).
A presença viva de Cristo, que deve ser preservada, defendida e incrementada em nós, é lâmpada que ilumina os nossos passos, luz que orienta as nossas opções, chama que aquece os corações no caminho rumo ao Senhor, tornando-nos capazes de ajudar quem percorre o caminho connosco, até à comunhão inseparável com Ele. Naquele dia, diz ainda o Apocalipse, «não haverá mais noite, e não necessitarão de lâmpada nem de luz do sol, porque o Senhor Deus os ilumina; e reinarão para todo o sempre» (cf. 22, 5).
A celebração do Batismo conclui-se com a recitação do Pai-Nosso, própria da comunidade dos filhos de Deus. Com efeito, as crianças renascidas no Batismo receberão a plenitude do dom do Espírito na Confirmação e participarão na Eucaristia, aprendendo o que significa dirigir-se a Deus chamando-lhe “Pai”.
No final destas catequeses sobre o Batismo, repito a cada um de vós o convite que expressei do seguinte modo na Exortação apostólica Gaudete et exsultate: «Deixa que a graça do teu Batismo frutifique num caminho de santidade. Deixa que tudo esteja aberto a Deus e, para isso, opta por Ele, escolhe Deus sem cessar. Não desanimes, porque tens a força do Espírito Santo para tornar possível a santidade e, no fundo, esta é o fruto do Espírito Santo na tua vida (cf. Gal 5, 22-23)» (n. 15).
Papa Francisco
Catequese na audiência Geral de 16.05.2018
Prezados irmãos e irmãs, bom dia!
A catequese sobre o sacramento do Batismo leva-nos a falar hoje sobre o santo lavacro, acompanhado pela invocação à Santíssima Trindade, ou seja, o rito central que propriamente “batiza” — isto é, imerge — no Mistério pascal de Cristo (cf. Catecismo da Igreja Católica, 1239). O sentido deste gesto é evocado por São Paulo aos cristãos de Roma, primeiro perguntando: «Ignorais que todos os que fomos batizados em Jesus Cristo, fomos batizados na sua morte?», e depois respondendo: «Fomos, pois, sepultados com Ele na sua morte pelo Batismo para que, como Cristo ressurgiu dos mortos pela glória do Pai, assim nós também vivamos uma vida nova» (Rm 6, 3-4). O Batismo abre-nos a porta para uma vida de ressurreição, não para uma vida mundana. Uma vida segundo Jesus.
A pia batismal é o lugar em que se faz a Páscoa com Cristo! O homem velho é sepultado com as suas paixões enganadoras (cf. Ef4, 22), para que renasça uma nova criatura; verdadeiramente, passou o que era velho; eis que tudo se fez novo (cf. 2 Cor 5, 17). Nas “Catequeses” atribuídas a São Cirilo de Jerusalém é explicado assim aos neófitos quanto lhes aconteceu na água do Batismo. É bonita esta explicação de São Cirilo: «No mesmo instante morreis e nasceis, e a mesma onda salutar torna-se para vós sepulcro e mãe» (n. 20, Mistagógica 2, 4-6: pg 33, 1079-1082). O renascimento do novo homem exige que seja reduzido a pó o homem corrompido pelo pecado. Com efeito, as imagens do túmulo e do ventre materno, referidas à fonte, são muito incisivas para expressar o que acontece de grandioso através dos simples gestos do Batismo. Apraz-me citar a inscrição que se encontra no antigo Batistério romano do Latrão onde se lê, em latim, esta expressão atribuída ao Papa Sisto III: «A Mãe Igreja dá à luz virginalmente mediante a água os filhos que concebe pelo sopro de Deus. Quantos de vós renascentes desta fonte, esperai o reino dos céus» («Virgineo fetu genitrix Ecclesia natos / quos spirante Deo concipit amne parit. / Caelorum regnum sperate hoc fonte renati»). É bonito: a Igreja que nos faz nascer, a Igreja que é um ventre, é a nossa Mãe através do Batismo.
Se os nossos pais nos geraram para a vida terrena, a Igreja regenerou-nos para a vida eterna no Batismo. Tornamo-nos filhos no seu Filho Jesus (cf. Rm 8, 15; Gl 4, 5-7). Também sobre cada um de nós, renascidos da água e do Espírito Santo, o Pai celestial faz ressoar com amor infinito a sua voz que diz: «Tu és o meu filho amado» (cf. Mt 3, 17). Esta voz paternal, impercetível ao ouvido mas bem audível pelo coração de quem crê, acompanha-nos durante a vida inteira, sem nunca nos abandonar. Durante toda a vida, o Pai diz-nos: “Tu és o meu filho amado, tu és a minha filha amada”. Deus ama-nos muito, como um Pai, e não nos deixa sozinhos. E isto, desde o momento do Batismo. Somos filhos de Deus renascidos para sempre! Com efeito, o Batismo não se repete, porque imprime um selo espiritual indelével: «Este selo não é apagado por pecado algum, embora o pecado impeça o Batismo de produzir frutos de salvação» (CIC, n. 1272). O selo do Batismo nunca se perde! “Padre, mas se alguém se torna um bandido, dos mais terríveis, que mata as pessoas, que comete injustiças, o selo desaparece?”. Não! Aquele filho de Deus, é o homem que faz estas coisas para a própria vergonha, mas o selo não se apaga. E ele continua a ser filho de Deus, que vai contra Deus, mas Deus nunca renega os seus filhos. Compreendestes? Deus nunca renega os seus filhos. Repitamo-lo todos juntos? “Deus nunca renega os seus filhos”. Um pouco mais alto, pois eu, ou sou surdo, ou não entendi: [repetem mais alto] “Deus nunca renega os seus filhos”. Então, assim está bem!
Por conseguinte, incorporados a Cristo por meio do Batismo, os batizados são conformados com Ele, «o primogênito entre uma multidão de irmãos» (Rm 8, 29). Mediante a ação do Espírito Santo, o Batismo purifica, santifica, justifica, para formar em Cristo, de muitos, um só corpo (cf. 1 Cor 6, 11; 12, 13). Exprime-o a unção crismal, «que é sinal do sacerdócio real do batizado e da sua agregação à comunidade do povo de Deus» (Rito do Batismo das Crianças, Introdução, n. 18, 3). Portanto, o sacerdote unge com o sagrado crisma a cabeça de cada batizado, depois de ter pronunciado estas palavras que explicam o seu significado: «É o próprio Deus quem vos consagra com o crisma de salvação para que, inseridos em Cristo, sacerdote, rei e profeta, sejais sempre membros do seu corpo para a vida eterna» (ibid., n. 71).
Irmãos e irmãs, a vocação cristã consiste totalmente nisto: viver unidos a Cristo na santa Igreja, partícipes da mesma consagração para desempenhar a mesma missão neste mundo, dando frutos que perduram para sempre. Com efeito, animado pelo único Espírito, todo o Povo de Deus participa das funções de Jesus Cristo, “Sacerdote, Rei e Profeta”, e assume as responsabilidades de missão e serviço que disto derivam (cf. CIC, 783-786). O que significa participar do sacerdócio real e profético de Cristo? Significa fazer de si uma oferta agradável a Deus (cf. Rm 12, 1), dando-lhe testemunho através de uma vida de fé e de caridade (cf. Lumen gentium, 12), colocando-a ao serviço dos outros, a exemplo do Senhor Jesus (cf. Mt 20, 25-28; Jo 13, 13-17). Obrigado!
Papa Francisco
Catequese na audiência geral de 09.05.2018
Jesus diz-nos: «Permanecei no meu amor. Não saiais do meu amor». E cada um de nós pode perguntar-se no coração - no próprio coração: «Eu permaneço no amor do Senhor? Ou saio, procurando outras coisas, outros divertimentos, outras condutas de vida?».
«Permanecer no amor» é fazer aquilo que Jesus fez por nós. Ele deu a vida. Ele foi o nosso servo: veio para servir-nos. «Permanecer no amor»significa servir os outros, estar ao serviço dos outros.
Que coisa é o amor? Queremos pensar em que coisa é o amor? «Ah, sim, eu vi um filme sobre o amor, era belo... E aquele casal de noivos... E depois acabou mal, que pena!». Não é assim. O amor é uma outra coisa.
O amor é encarregar-se dos outros. O amor não é tocar violinos, tudo romântico... O amor é trabalho. Quantas de vós sois mães, pensai quando os vossos filhos eram pequeninos: como amastes os vossos filhos? Com o trabalho. Tomastes conta deles. Eles choravam... era preciso dar-lhes leite; mudá-los; isto, aquilo...
O amor é sempre trabalho para os outros. Porque o amor faz-se ver nas obras, não nas palavras. Recordai quando se diz: «Palavras, palavras, palavras»; muitas vezes são só palavras. O amor, ao contrário, é concreto.
Cada um deve pensar: o meu amor pela minha família, no bairro, no trabalho: é serviço aos outros? Preocupo-me com os outros? (...) «Eu amo-te.» «E o que fazes por mim se me amas?» Cada um dos doentes do bairro pergunta: «O que fazes por mim?».
Na nossa família, se tu amas os teus filhos, sejam pequenos ou grandes, os pais, os idosos, que fazes por eles? Para ver como é o amor, pergunta-te sempre: que coisa faço?
«Mas padre, onde aprendemos isto?» De Jesus. E na segunda leitura [missa do 6.º Domingo da Páscoa, 1 João 4, 7-10 ou 1 João 4, 11-16] há uma frase que pode abrir-nos os olhos: «Nisto se manifestou o amor de Deus em nós: Deus enviou ao mundo o seu Filho». Nisto está o amor.
Não fomos nós a amar Deus; mas é Ele que nos amou primeiro. O Senhor ama sempre primeiro. Espera-nos com o amor. Também nós podemos fazer-nos a pergunta: eu espero com o amor os outros.
E depois fazer o elenco das perguntas. Por exemplo: os mexericos são amor? Aquele que diz mal dos outros... Não, não é amor. Falar mal das pessoas não é amor. «Oh... eu amo Deus. Faço cinco novenas por mês. Faço isto, aquilo...». Sim, mas... como é a tua língua? Como vai a tua língua? Esta é precisamente a pedra angular para ver o amor. Eu amo os outros? Pergunta-te: como está a minha língua? Dir-te-á se é verdadeiro amor.
Deus amou-nos primeiro. Espera-nos com o amor, sempre. Eu amo primeiro ou espero que me deem alguma coisa para amar? Como os cachorrinhos que esperam o presente, o alimento para comer e depois fazem festa ao dono. O amor é gratuito, em primeiro. Mas o termómetro para saber a temperatura do meu amor é a língua. Não vos esqueçais disto.
Quando estiverdes para fazer o exame de consciência, antes da confissão ou em casa, perguntai-vos: fiz aquilo que Jesus me disse - «permanecei no meu amor»? E como posso sabê-lo? Da maneira como a minha língua se comportou. Se falei mal dos outros, não amei.
Se esta paróquia conseguisse nunca falar mal dos outros, seria de a canonizar! Mas, ao menos, como disse outras vezes: fazei o esforço de não falar mal dos outros. «Padre, dê-nos um remédio para não falar mal dos outros.» É fácil. Está ao alcance de todos. Quando te vem a vontade de falar mal dos outros, morde a língua. Ficará inchada, mas de certeza que não voltarás a falar mal.
Peçamos ao Senhor para «permanecer no amor» e compreender que o amor é serviço, é encarregar-se dos outros. E a graça de compreender que o termómetro de como está o amor é a língua.
Excertos da homilia proferida na paróquia do Santíssimo Sacramento a Tor de'Schiavi, Roma, Itália, 6.5.2018
Fonte: Sala de Imprensa da Santa Sé
Trad. / edição: SNPC
Prezados irmãos e irmãs, bom dia!
Prosseguindo a reflexão sobre o Batismo, hoje gostaria de meditar sobre os ritos centrais, que têm lugar ao pé da pia batismal.
Consideremos antes de tudo a água, sobre a qual é invocado o poder do Espírito, a fim de que tenha a força de regenerar e renovar (cf. Jo 3, 5 e Tt 3, 5). A água é matriz de vida e de bem-estar, enquanto a sua falta provoca o esmorecimento de toda a fecundidade, como acontece no deserto; mas a água pode ser também causa de morte, quando submerge entre as suas ondas, ou em grande quantidade devasta tudo; por fim, a água tem a capacidade de lavar, limpar e purificar.
A partir deste simbolismo natural, universalmente reconhecido, a Bíblia descreve as intervenções e as promessas de Deus através do sinal da água. No entanto, o poder de perdoar os pecados não está na água em si, como explicava Santo Ambrósio aos neófitos: «Viste a água, mas nem toda a água cura: só sara a água que tiver em si a graça de Cristo. [...] A ação é da água, mas a eficácia é do Espírito Santo» (De sacramentis 1, 15).
Por isso, a Igreja invoca a ação do Espírito sobre a água, «a fim de que, aqueles que nela receberem o Batismo, sejam sepultados com Cristo na morte e, com Ele, ressuscitem para a vida imortal» (Rito do Batismo das crianças, n. 60). A prece de bênção diz que Deus preparou a água «para ser sinal do Batismo», recordando as principais prefigurações bíblicas: sobre as águas primordiais pairava o Espírito, para as transformar em germe de vida (cf. Gn 1, 1-2); a água do dilúvio marcou o fim do pecado e o início da nova vida (cf. Gn 7, 6-8, 22); através da água do Mar Vermelho, os filhos de Abraão foram libertados da escravidão do Egito (cf. Êx14, 15-31). A propósito de Jesus, recorda-se o Batismo no Jordão (cf. Mt 3, 13-17), o sangue e a água derramados do seu lado (cf. Jo 19, 31-37), e o mandato dado aos discípulos, para batizar todos os povos em nome da Trindade (cf. Mt 28, 19). Revigorados por esta memória, pede-se a Deus que infunda na água da pia batismal a graça de Cristo morto e ressuscitado (cf. Rito do Batismo das crianças, n. 60). E assim, esta água é transformada em água que traz em si a força do Espírito Santo. E mediante esta água, com a força do Espírito Santo, batizamos as pessoas, os adultos, as crianças, todos.
Santificada a água da pia batismal, é preciso dispor o coração para aceder ao Batismo. Isto acontece mediante a renúncia a Satanás e a profissão de fé, dois gestos estritamente ligados entre si. Na medida em que digo “não” às sugestões do diabo — aquele que divide — torno-me capaz de dizer “sim” a Deus, que me chama a conformar-me com Ele nos pensamentos e nas ações. O diabo divide; Deus une sempre a comunidade, as pessoas num único povo. Não é possível aderir a Cristo, impondo condições. É necessário desapegar-se de certos vínculos para poder realmente abraçar outros; ou estás de bem com Deus, ou com o diabo. Por isso, a renúncia e o ato de fé caminham juntos. É preciso eliminar pontes, deixando-as atrás, para empreender o novo Caminho, que é Cristo.
A resposta às perguntas — «Renunciais a Satanás, a todas as suas obras e a todas as suas seduções?» — é dada na primeira pessoa do singular: «Renuncio». E do mesmo modo é professada a fé da Igreja, dizendo: «Creio». Eu renuncio, eu creio: isto está na base do Batismo. É uma opção responsável, que deve ser traduzida em gestos concretos de confiança em Deus. O ato de fé supõe um compromisso que o próprio Batismo ajudará a manter com perseverança nas várias situações e provas da vida. Recordemos a antiga sabedoria de Israel: «Meu filho, se te apresentares para servir o Senhor, prepara-te para a tentação» (Eclo 2, 1), ou seja, prepara-te para o combate. E a presença do Espírito Santo concede-nos a força para lutar bem.
Estimados irmãos e irmãs, quando molhamos a mão na água benta — ao entrar numa igreja, tocamos a água benta — e fazemos o sinal da Cruz, pensemos com alegria e gratidão no Batismo que recebemos — esta água benta recorda-nos o Batismo — e renovemos o nosso “Amém” — “Estou feliz” — para viver imersos no amor da Santíssima Trindade.
Papa Francisco
Catequese na audiência geral 02.05.2018
Estimados irmãos e irmãs, bom dia!
Continuemos a nossa reflexão sobre o Batismo, sempre à luz da Palavra de Deus.
É o Evangelho que ilumina os candidatos e suscita a adesão de fé: «O Batismo é, de modo totalmente particular, o “sacramento da fé”, uma vez que é a entrada sacramental na vida de fé» (Catecismo da Igreja Católica, 1236). E a fé é a entrega de nós mesmos ao Senhor Jesus, reconhecido como «nascente de água [...] para a vida eterna» (Jo 4, 14), «luz do mundo» (Jo 9, 5), «vida e ressurreição» (Jo 11, 25), como ensina o itinerário percorrido, ainda hoje, pelos catecúmenos já prestes a receber a iniciação cristã. Educados pela escuta de Jesus, pelo seu ensinamento e pelas suas obras, os catecúmenos voltam a viver a experiência da mulher samaritana sedenta de água viva, do cego de nascença que adquire a vista, de Lázaro que sai do sepulcro. O Evangelho traz em si a força de transformar quem o recebe com fé, arrancando-o do domínio do maligno, a fim de que aprenda a servir o Senhor com alegria e novidade de vida.
À pia batismal nunca vamos sozinhos, mas acompanhados pela oração da Igreja inteira, como recordam as ladainhas dos Santos que precedem a prece de exorcismo e a unção pré-batismal com o óleo dos catecúmenos. São gestos que, desde a antiguidade, asseguram a quantos se preparam para renascer como filhos de Deus, que a oração da Igreja os assiste na luta contra o mal, os acompanha no caminho do bem, os ajuda a libertar-se do poder do pecado, a fim de passar para o reino da graça divina. A prece da Igreja. A Igreja reza, e reza por todos, por todos nós! Nós, Igreja, oramos pelos outros. É bom rezar pelos outros. Quantas vezes, quando não temos uma necessidade urgente, não rezamos. Devemos orar pelos outros, unidos à Igreja: “Senhor, peço-vos pelas pessoas que estão em necessidade, por quantos não têm fé...”. Não vos esqueçais: a oração da Igreja está sempre em ação. Mas nós devemos entrar nesta prece e rezar por todo o povo de Deus, e por aqueles que precisam de orações. Por isso, o caminho dos catecúmenos adultos está marcado por reiterados exorcismos pronunciados pelo sacerdote (cf. cic, 1237), ou seja, por orações que invocam a libertação de tudo o que separa de Cristo e impede a íntima união com Ele. Pede-se a Deus até pelas crianças, para que as liberte do pecado original e as consagre como morada do Espírito Santo (cf. Rito do Batismo das crianças, n. 56). As crianças. Rezar pelas crianças, pela sua saúde espiritual e corporal. É um modo de proteger as crianças com a oração. Como testemunham os Evangelhos, o próprio Jesus combateu e expulsou os demônios para manifestar a vinda do reino de Deus (cf. Mt 12, 28): a sua vitória sobre o poder do maligno deixa espaço ao senhorio de Deus, que rejubila e reconcilia com a vida.
O Batismo não é uma fórmula mágica, mas um dom do Espírito Santo que torna quem o recebe capaz de «lutar contra o espírito do mal», acreditando que «Deus enviou ao mundo o seu Filho para destruir o poder de Satanás e transferir o homem das trevas para o seu Reino de luz infinita» (cf. Rito do Batismo das crianças, n. 56). Sabemos por experiência que a vida cristã está sempre sujeita à tentação, sobretudo à tentação de se separar de Deus, da sua vontade, da comunhão com Ele, para voltar a cair na rede das seduções mundanas. E o Batismo prepara-nos, dá-nos força para esta luta quotidiana, até para a luta contra o diabo que — como diz São Pedro — como um leão, procura devorar-nos, destruir-nos.
Além da oração, há a unção no peito com o óleo dos catecúmenos, os quais «dele recebem vigor para renunciar ao diabo e ao pecado, antes de se aproximarem da fonte e ali renascerem para a nova vida» (Bênção dos óleos, Premissas, n. 3). Devido à propriedade do óleo de penetrar nos tecidos do corpo, proporcionando-lhe benefício, os antigos lutadores costumavam ungir-se de óleo para tonificar os músculos e para ativar mais facilmente as garras do adversário. À luz deste simbolismo, os cristãos dos primeiros séculos adotaram o uso de ungir o corpo dos candidatos ao Batismo com o óleo benzido pelo do Bispo [Eis a prece de bênção, expressiva do significado deste óleo: «Ó Deus, sustentáculo e defesa do vosso povo, abençoai este óleo, no qual quisestes oferecer-nos um sinal da vossa fortaleza divina; concedei energia e vigor aos catecúmenos que serão por ele ungidos, a fim de que, iluminados pela vossa sabedoria, compreendam mais profundamente o Evangelho de Cristo; sustentados pelo vosso poder, assumam com generosidade os compromissos da vida cristã; e, tornando-se dignos da adoção de filhos, tenham a alegria de renascer e viver na vossa Igreja»: Bênção dos óleos, n. 21], com a finalidade de significar, mediante este «sinal de salvação», que o poder de Cristo Salvador fortalece para lutar contra o mal e para o derrotar (cf. Rito do Batismo das crianças, n. 105).
É cansativo combater contra o mal, escapar dos seus enganos, recuperar a força depois de uma luta extenuante, mas devemos saber que toda a vida cristã é um combate. Contudo, devemos saber também que não estamos sozinhos, que a Mãe Igreja reza a fim de que os seus filhos, regenerados no Batismo, não sucumbam às emboscadas do maligno, mas que as vençam pelo poder da Páscoa de Cristo. Fortalecidos pelo Senhor Ressuscitado, que derrotou o príncipe deste mundo (cf. Jo 12, 31), também nós podemos repetir com a fé de São Paulo: «Tudo posso n’Aquele que me dá força» (Fl 4, 13). Todos nós podemos vencer, vencer tudo, mas com a força que nos vem de Jesus.
Papa Francisco
Catequese na audiência geral 25.04.2018
Prezados irmãos e irmãs bom dia!
Prosseguimos, neste Tempo de Páscoa, as catequeses sobre o Batismo. O significado do Batismo sobressai claramente da sua celebração, por isso dirijamos a ela a nossa atenção. Considerando os gestos e as palavras da liturgia, podemos compreender a graça e o compromisso deste Sacramento, que deve ser sempre redescoberto. Fazemos memória dela na aspersão com a água benta, que se pode realizar no domingo, no início da Missa, assim como na renovação das promessas batismais, durante a Vigília pascal. Com efeito, quanto se verifica na celebração do Batismo suscita uma dinâmica espiritual que atravessa toda a vida dos batizados; é o início de um processo que nos permite viver unidos a Cristo na Igreja. Portanto, regressar à nascente da vida cristã leva-nos a compreender melhor o dom recebido no dia do nosso Batismo e a renovar o compromisso de lhe corresponder na condição em que estamos hoje. Renovar o compromisso, compreender melhor este dom, que é o Batismo, e recordar o dia do nosso Batismo. Na quarta-feira passada pedi para fazer os deveres de casa e, cada um de nós, recordar o dia do Batismo, em que dia fui batizado. Sei que alguns de vós o sabem, outros não; os que não o sabem, perguntem aos parentes, àquelas pessoas, aos padrinhos, às madrinhas... perguntem: “Qual é a data do meu Batismo?”. Porque o Batismo é um renascimento, é como se fosse o segundo aniversário. Entendestes? Cumprir este dever de casa, perguntar: “Qual é a data do meu Batismo?”.
Antes de tudo, no rito de acolhimento pergunta-se qual é o nome do candidato, porque o nome indica a identidade de uma pessoa. Quando nos apresentamos, dizemos imediatamente o nosso nome: “Chamo-me assim”, para sair do anonimato; anônimo é quem não tem um nome. Para sair do anonimato dizemos imediatamente o nosso nome. Sem um nome permanecemos desconhecidos, sem direitos nem deveres. Deus chama cada um pelo nome, amando-nos individualmente, na realidade da nossa história. O Batismo acende a vocação pessoal a viver como cristão, que se desenvolverá durante a vida inteira. E comporta uma resposta pessoal, não emprestada, com um “copia e cola”. Com efeito, a vida cristã é tecida com uma série de chamadas e respostas: Deus continua a pronunciar o nosso nome ao longo dos anos, fazendo ressoar de muitas maneiras a sua chamada a nos conformarmos com o seu Filho Jesus. Portanto, o nome é importante! É muito importante! Os pais pensam no nome que darão ao filho já antes do nascimento: também isto faz parte da espera de um filho que, no próprio nome terá a sua identidade original, inclusive para a vida cristã ligada a Deus.
Sem dúvida, tornar-se cristão é um dom que vem do alto (cf. Jo 3, 3-8). A fé não se pode comprar, mas sim pedir e receber como dom. “Senhor, concedei-me o dom da fé!”, é uma bonita oração! “Que eu tenha fé!” é uma bonita prece. Pedi-la como dom, mas não se pode comprá-la, pede-se. Com efeito, «o Batismo é o sacramento daquela fé, com a qual os homens, iluminados pela graça do Espírito Santo, respondem ao Evangelho de Cristo» (Rito do Batismo das Crianças, Introdução geral, n. 3). A formação dos catecúmenos e a preparação dos pais, assim como a escuta da Palavra de Deus na própria celebração do Batismo, tendem a suscitar e a despertar uma fé sincera, em resposta ao Evangelho.
Se os catecúmenos adultos manifestam pessoalmente aquilo que desejam receber como dom da Igreja, as crianças são apresentadas pelos pais, com os padrinhos. O diálogo com eles permite que exprimam a vontade de que os pequenos recebam o Batismo e, à Igreja, a intenção de o celebrar. «Expressão de tudo isto é o sinal da cruz, que o celebrante e os pais traçam na testa das crianças» (Rito do Batismo das Crianças, Introdução, n. 16). «O sinal da cruz... manifesta a marca de Cristo impressa naquele que vai passar a pertencer-lhe e significa a graça da redenção que Cristo nos adquiriu pela sua cruz» (Catecismo da Igreja Católica, n. 1.235). Na celebração fazemos o sinal da cruz nas crianças. Mas gostaria de retomar um tema do qual já vos falei. As nossas crianças sabem fazer bem o sinal da cruz? Muitas vezes vi crianças que não sabem fazer o sinal da cruz. E vós, pais, mães, avôs, avós, padrinhos e madrinhas, deveis ensinar a fazer bem o sinal da cruz, porque isto significa repetir o que se fez no Batismo. Entendestes bem? Ensinar as crianças a fazer bem o sinal da cruz. Se o aprenderem desde a infância, fá-lo-ão bem mais tarde, quando forem adultos.
A cruz é o distintivo que manifesta quem somos: o nosso falar, pensar, olhar e agir estão sob o sinal da cruz, ou seja, sob o sinal do amor de Jesus até ao fim. As crianças são marcadas na testa. Os catecúmenos adultos são marcados também nos sentidos, com estas palavras: «Recebei o sinal da cruz nos ouvidos, para ouvir a voz do Senhor»; «nos olhos, para ver o esplendor da face de Deus»; «nos lábios, para responder à palavra de Deus»; «no peito, para que Cristo habite nos vossos corações mediante a fé»; «nos ombros, para sustentar o jugo suave de Cristo» (Rito da iniciação cristã dos adultos, n. 85). Tornamo-nos cristãos na medida em que a cruz se imprime em nós como uma marca “pascal” (cf. Ap 14, 1; 22, 4), tornando visível, inclusive exteriormente, o modo cristão de enfrentar a vida. Fazer o sinal da cruz quando acordamos, antes das refeições, diante de um perigo, em defesa contra o mal, à noite antes de dormir, significa dizer a nós mesmos e aos outros a quem pertencemos, quem desejamos ser. Por isso é muito importante ensinar as crianças a fazer bem o sinal da cruz. E, como fazemos ao entrar na igreja, podemos fazê-lo também em casa, conservando num pequeno vaso adequado um pouco de água benta — algumas famílias fazem-no: assim, cada vez que entramos ou saímos, fazendo o sinal da cruz com aquela água recordamo-nos que somos batizados. Não vos esqueçais, repito: ensinai as crianças a fazer o sinal da cruz!
Papa Francisco
Catequese na audiência Geral 18.04.2018
Estimados irmãos e irmãs bom dia e feliz Páscoa!
Vedes que hoje há flores: as flores indicam júbilo, alegria. Em certos lugares, a Páscoa é chamada também “Páscoa florida”, porque floresce Cristo Ressuscitado: é a nova flor; floresce a nossa justificação; floresce a santidade da Igreja. Por isso, muitas flores: é a nossa alegria. Nós festejamos a Páscoa toda a semana, a semana inteira. E por isso nos desejamos mais uma vez, todos nós, os bons votos de “Feliz Páscoa”. Digamos juntos: “Feliz Páscoa”, todos! [respondem: “Feliz Páscoa!”]. Gostaria que desejássemos também os votos de “Feliz Páscoa” — porque ele foi o Bispo de Roma — ao amado Papa Bento, que nos acompanha pela televisão. Ao Papa Bento, todos desejemos Feliz Páscoa [dizem: “Feliz Páscoa!”]. E um grande aplauso!
Com esta catequese encerramos o ciclo dedicado à Missa, que é precisamente a comemoração, mas não apenas como memória; vive-se de novo a Paixão e a Ressurreição de Jesus. A última vez chegamos até à Comunhão e à oração após a Comunhão; depois desta prece, a Missa termina com a Bênção concedida pelo sacerdote e com a despedida do povo (cf. Ordenamento Geral do Missal Romano, 90). Assim como tinha começado com o sinal da cruz, em nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo, é ainda em nome da Trindade que se conclui a Missa, ou seja, a ação litúrgica.
Todavia, sabemos que quando a Missa termina, tem início o compromisso do testemunho cristão. Os cristãos não vão à Missa para cumprir um dever semanal e depois esquecer-se, não! Os cristãos vão à Missa para participar na Paixão e Ressurreição do Senhor, e em seguida viver mais como cristãos: tem início o compromisso do testemunho cristão! Saímos da igreja para «ir em paz» levar a Bênção de Deus às atividades diárias, aos nossos lares, aos ambientes de trabalho, às ocupações da cidade terrena, “glorificando o Senhor com a nossa vida”. Mas se eu sair da igreja tagarelando e dizendo: “Olha para isto, para aquilo...”, com a língua comprida, a Missa não entrou no meu coração. Porquê? Porque não sou capaz de viver o testemunho cristão. Cada vez que saio da Missa, devo sair melhor que quando entrei, com mais vida, com mais força, com mais vontade de dar testemunho cristão. Através da Eucaristia, o Senhor Jesus entra em nós, no nosso coração e na nossa carne, a fim de podermos «exprimir na vida o sacramento recebido da fé» (Missal Romano, Coleta da Segunda-Feira na Oitava de Páscoa).
Portanto, da celebração à vida, conscientes de que a Missa tem o seu cumprimento nas escolhas concretas de quem se deixa comprometer pessoalmente nos mistérios de Cristo. Não devemos esquecer que celebramos a Eucaristia para aprender a tornar-nos homens e mulheres eucarísticos. Que significa isto? Significa deixar que Cristo aja nas nossas obras: que os seus pensamentos sejam os nossos, os seus sentimentos os nossos, as suas escolhas as nossas. E isto é santidade: agir como Cristo é santidade cristã. Quem o exprime com exatidão é São Paulo; quando fala da própria assimilação a Jesus, diz assim: «Fui crucificado com Cristo. Eu vivo, mas já não sou eu; é Cristo que vive em mim. A minha vida presente, na carne, eu vivo-a na fé no Filho de Deus, que me amou e se entregou por mim» (Gl 2, 19-20). Este é o testemunho cristão. A experiência de Paulo ilumina-nos também a nós: na medida em que mortificarmos o nosso egoísmo, ou seja, fizermos morrer o que se opõe ao Evangelho e ao amor de Jesus, cria-se dentro de nós maior espaço para o poder do seu Espírito. Os cristãos são homens e mulheres que deixam alargar a própria alma com a força do Espírito Santo, depois de ter recebido o Corpo e o Sangue de Cristo. Permiti que a vossa alma se alargue! Não estas almas tão estreitas e fechadas, pequenas, egoístas, não! Almas largas, almas grandes, com vastos horizontes... Deixai que a vossa alma se alargue com a força do Espírito, depois de receber o Corpo e o Sangue de Cristo.
Dado que a presença real de Cristo no Pão consagrado não acaba com a Missa (cf. Catecismo da Igreja Católica, 1374), a Eucaristia é conservada no Tabernáculo para a Comunhão aos enfermos e para a adoração silenciosa do Senhor no Santíssimo Sacramento; com efeito, o culto eucarístico fora da Missa, quer de forma particular quer comunitária, ajuda-nos a permanecer em Cristo (cf. ibid., 1378-1380).
Portanto, os frutos da Missa estão destinados a amadurecer na vida de todos os dias. Podemos dizer assim, forçando um pouco a imagem: a Missa é como o grão, o grão de trigo que depois, na vida comum, cresce, cresce e amadurece nas boas obras, nas atitudes que nos tornam semelhantes a Jesus. Portanto, os frutos da Missa estão destinados a amadurecer na vida de todos os dias. Na verdade, aumentando a nossa união a Cristo, a Eucaristia atualiza a graça que o Espírito nos concedeu no Batismo e na Confirmação, a fim que o nosso testemunho cristão seja credível (cf. ibid., 1391-1392).
Além disso, o que faz a Eucaristia, acendendo nos nossos corações a caridade divina? Separa-nos do pecado: «Quanto mais participarmos na vida de Cristo e progredirmos na sua amizade, tanto mais difícil nos será romper com Ele pelo pecado mortal» (ibid., 1395).
A frequência regular do Banquete eucarístico renova, fortalece e aprofunda o vínculo com a comunidade cristã à qual pertencemos, segundo o princípio de que a Eucaristia faz a Igreja (cf. ibid., 1396), unindo todos nós.
Por fim, participar na Eucaristia engaja-nos em relação aos outros, de maneira especial aos pobres, educando-nos a passar da carne de Cristo para a carne dos irmãos, onde Ele espera ser por nós reconhecido, servido, honrado e amado (cf. ibid., 1397).
Trazendo o tesouro da união com Cristo em vasos de barro (cf. 2 Cor 4, 7), temos contínua necessidade de regressar ao santo altar até podermos, no paraíso, participar plenamente da bem-aventurança do banquete de núpcias do Cordeiro (cf. Ap 19, 9).
Demos graças ao Senhor pelo caminho de redescoberta da Santa Missa, que Ele nos concedeu percorrer juntos, e deixemo-nos atrair com fé renovada por este encontro real com Jesus, morto e ressuscitado por nós, nosso contemporâneo. E que a nossa vida seja sempre “florida” assim, como a Páscoa, com as flores da esperança, da fé e das boas obras. Que encontremos sempre a força para isto na Eucaristia, na união com Jesus. Feliz Páscoa a todos!
Papa Francisco
Catequese na audiência geral 04.04.2018
Estimados irmãos e irmãs, bom dia!
Hoje é o primeiro dia de primavera: boa primavera! Mas o que acontece na primavera? Florescem as plantas, florescem as árvores. Far-vos-ei algumas perguntas. Uma árvore ou uma planta doentes, florescem bem, se estão doentes? Não! Uma árvore, uma planta que não for regada pela chuva ou artificialmente, pode florescer bem? Não! E uma árvore ou uma planta das quais foram tiradas as raízes, ou que não as têm, podem florescer? Não! Mas pode-se florescer sem raízes? Não! E esta é uma mensagem: a vida cristã deve ser uma vida que precisa de florescer em obras de caridade, em gestos de bem. Mas se tu não tens raízes, não poderás florescer; e quem é a raiz? Jesus! Se ali, nas raízes, não estiveres com Jesus, não florescerás! Se não regares a tua vida com a oração e os sacramentos, terás flores cristãs? Não! Porque a oração e os sacramentos irrigam as raízes e a nossa vida floresce. Faço-vos votos a fim de que esta primavera seja para vós uma primavera florida, como será a Páscoa florescida. Florida de boas obras, de virtudes, de gestos de bem para os outros. Recordai isto, é um pequeno verso muito bonito da minha Pátria: “O que a árvore tem de florescido vem daquilo que tem de enterrado”. Nunca cortemos as raízes com Jesus.
E agora continuemos com a catequese sobre a Santa Missa. A celebração da Missa, da qual percorremos os vários momentos, visa a Comunhão, ou seja, a nossa união com Jesus. A comunhão sacramental: não a comunhão espiritual, que podes fazer em casa, dizendo: “Jesus, gostaria de te receber espiritualmente”. Não, a comunhão sacramental, com o corpo e o sangue de Cristo. Celebramos a Eucaristia para nos alimentarmos de Cristo, que se oferece a nós quer na Palavra quer no Sacramento do altar, para nos conformar-nos com Ele. É o próprio Senhor quem o diz: «Quem come a minha carne e bebe o meu sangue permanece em mim, e Eu nele» (Jo 6, 56). Com efeito, o gesto de Jesus que deu aos discípulos o seu Corpo e Sangue na última Ceia, continua ainda hoje através do ministério do sacerdote e do diácono, ministros ordinários da distribuição do Pão da vida e do Cálice da salvação aos irmãos.
Na Missa, depois de ter partido o Pão consagrado, ou seja, o corpo de Jesus, o sacerdote mostra-o aos fiéis, convidando-os a participar no banquete eucarístico. Conhecemos as palavras que ressoam do santo altar: «Felizes os convidados para a Ceia do Senhor: eis o Cordeiro de Deus, que tira os pecados do mundo». Inspirado num trecho do Apocalipse — «Felizes os convidados para a ceia das núpcias do Cordeiro» (Ap 19, 9): diz “núpcias” porque Jesus é o Esposo da Igreja — este convite chama-nos a experimentar a íntima união com Cristo, fonte de alegria e de santidade. É um convite que rejubila e, ao mesmo tempo, impele a um exame de consciência, iluminado pela fé. Com efeito, se por um lado vemos a distância que nos separa da santidade de Cristo, por outro acreditamos que o seu Sangue é «derramado para a remissão dos pecados». Todos nós fomos perdoados no batismo, e todos nós somos perdoados ou seremos perdoados cada vez que nos aproximarmos do sacramento da penitência. E não nos esqueçamos: Jesus perdoa sempre. Jesus não se cansa de perdoar. Somos nós que nos cansamos de pedir perdão. Precisamente pensando no valor salvífico deste Sangue, Santo Ambrósio exclama: «Eu, que peco sempre, devo ter sempre à disposição o remédio» (De sacramentis, 4, 28: pl 16, 446a). Nesta fé, também nós dirijamos o olhar para o Cordeiro de Deus que tira os pecados do mundo, e invoquemo-lo: «Ó Senhor, não sou digno de participar na vossa mesa: mas dizei uma só palavra e eu serei salvo». Dizemos isto em cada Missa.
Somos nós que nos movemos em procissão para receber a Comunhão, caminhamos rumo ao altar em procissão para receber a Comunhão, mas na realidade é Cristo que vem ao nosso encontro para nos assimilar a si. Há um encontro com Jesus! Nutrir-se da Eucaristia significa deixar-se transformar naquilo que recebemos. Santo Agostinho ajuda-nos a compreender isto, quando narra acerca da luz recebida ao ouvir Cristo dizer: «Eu sou o alimento dos grandes. Cresce, e comer-me-ás. E não serás tu que me transformarás em ti, como o alimento da tua carne, mas tu serás transformado em mim» (Confissões, VII, 10, 16: pl 32, 742). Cada vez que recebemos a Comunhão, assemelhamo-nos mais a Jesus, transformamo-nos mais em Jesus. Do mesmo modo que o pão e o vinho são transformados no Corpo e Sangue do Senhor, assim quantos os recebem com fé são transformados em Eucaristia viva. Ao sacerdote que, distribuindo a Eucaristia, te diz: «O Corpo de Cristo», tu respondes: «Amém», ou seja, reconheces a graça e o compromisso que comporta tornar-se Corpo de Cristo. Pois quando recebes a Eucaristia, tornas-te corpo de Cristo. Isto é bonito, é muito bonito. Enquanto nos une a Cristo, arrancando-nos dos nossos egoísmos, a Comunhão abre-nos e une-nos a todos aqueles que são um só nele. Eis o prodígio da Comunhão: tornamo-nos aquilo que recebemos!
A Igreja deseja profundamente que também os fiéis recebam o Corpo do Senhor com hóstias consagradas na própria Missa; e o sinal do banquete eucarístico exprime-se com maior plenitude se a sagrada Comunhão for feita sob as duas espécies, não obstante saibamos que a doutrina católica ensina que sob uma só espécie recebemos Cristo inteiro (cf. Ordenamento Geral do Missal Romano, 85; 281-282). Segundo a praxe eclesial, o fiel aproxima-se normalmente da Eucaristia em forma processional, como dissemos, e comunga de pé, com devoção, ou então de joelhos, como estabelece a Conferência episcopal, recebendo o sacramento na boca ou, onde for permitido, nas mãos, como preferir (cf. OGMR, 160-161). Após a Comunhão, o silêncio, a oração silenciosa, ajuda-nos a conservar no coração o dom recebido. Prolongar um pouco aquele momento de silêncio, falando com Jesus no coração, ajuda-nos muito, assim como cantar um salmo ou um hino de louvor (cf. OGMR, 88), que nos ajude a estar com o Senhor.
A Liturgia eucarística é concluída pela oração depois da Comunhão. Nela, em nome de todos, o sacerdote dirige-se a Deus para lhe dar graças por nos ter tornado seus comensais e pede que aquilo que recebemos transforme a nossa vida. A Eucaristia revigora-nos a fim de darmos frutos de boas obras para viver como cristãos. É significativa a oração de hoje, na qual pedimos ao Senhor que «a participação nos seu sacramento seja para nós remédio de salvação, nos cure do mal e nos confirme na sua amizade» (Missal Romano, Quarta-Feira da 5ª Semana de Quaresma). Aproximemo-nos da Eucaristia: receber Jesus que nos transforma nele torna-nos mais fortes. O Senhor é tão bom e tão grande!
Papa Francisco
Catequese na audiência geral 21.03.2017
Queridos irmãos e irmãs, bom dia!
Continuemos com a Catequese sobre a Santa Missa. Na última Ceia, depois de ter tomado o pão e o cálice do vinho, e de ter dado graças a Deus, sabemos que Jesus «partiu o pão». A esta ação corresponde, na Liturgia eucarística da Missa, a fração do Pão, precedida pela oração que o Senhor nos ensinou, ou seja, o “Pai-Nosso”.
E assim começam os ritos de Comunhão, prolongando o louvor e a súplica da Oração eucarística com a recitação comunitária do“Pai-Nosso”. Esta não é uma das tantas orações cristãs, mas é a oração dos filhos de Deus: é a grande oração que Jesus nos ensinou. Com efeito, entregue a nós no dia do nosso Batismo, o “Pai-Nosso” faz ressoar em nós os mesmos sentimentos de Jesus Cristo. Quando rezamos o “Pai-Nosso”, oramos como Jesus. Foi a oração que Jesus proferiu e que nos ensinou; quando os discípulos lhe disseram: “Mestre, ensina-nos a rezar como tu rezas”. E Jesus rezava deste modo. É tão bonito rezar como Jesus! Formados pelo seu divino ensinamento, ousamos dirigir-nos a Deus chamando-o “Pai” porque renascemos como seus filhos através da água e do Espírito Santo (cf. Ef 1, 5). Na verdade, ninguém poderia chamá-lo familiarmente “Abbá” — “Pai” — sem ter sido gerado por Deus, sem a inspiração do Espírito, como ensina São Paulo (cf. Rm 8, 15). Devemos pensar: ninguém pode chamá-lo “Pai” sem a inspiração do Espírito. Quantas vezes as pessoas dizem “Pai Nosso”, mas não sabem o que estão a dizer. Porque sim, é o Pai, mas será que quando dizes “Pai” sentes que Ele é o Pai, o teu Pai, o Pai da humanidade, o Pai de Jesus Cristo? Tens uma relação com este Pai? Quando rezamos o “Pai-Nosso”, entramos em relação com o Pai que nos ama, mas é o Espírito quem nos confere esta relação, este sentimento de sermos filhos de Deus.
Que oração melhor do que aquela que Jesus nos ensinou pode predispor-nos para a Comunhão sacramental com Ele? Além da Missa, o “Pai-Nosso” é rezado, durante a manhã e à noite, nas Laudes e nas Vésperas; deste modo, a atitude filial em relação a Deus e de fraternidade para com o próximo contribuem para dar forma cristã aos nossos dias.
Na Oração do Senhor — no “Pai-Nosso” — pedimos o «pão de cada dia», no qual entrevemos uma especial referência ao Pão eucarístico, do qual necessitamos para viver como filhos de Deus. Imploramos também «o perdão dos nossos pecados», e para sermos dignos de receber o perdão de Deus comprometemo-nos a perdoar a quem nos tem ofendido. E isto não é fácil. Perdoar as pessoas que nos ofenderam não é fácil; é uma graça que devemos pedir: “Senhor, ensina-me a perdoar como tu me perdoaste”. É uma graça. Com as nossas forças não podemos: perdoar é uma graça do Espírito Santo. Assim, enquanto nos abre o coração a Deus, o “Pai-Nosso” dispõe-nos também ao amor fraterno. Por fim, peçamos ainda a Deus para «nos libertar do mal» que nos separa d’Ele e nos divide dos nossos irmãos. Compreendemos bem que estas são exigências muito adequadas para nos prepararmos para a Sagrada Comunhão (cf. Ordenamento Geral do Missal Romano, 81).
Com efeito, quanto pedimos no “Pai-Nosso” é prolongado pela oração do sacerdote que, em nome de todos, suplica: «Livrai-nos de todos os males, ó Pai, e dai-nos hoje a vossa paz». E depois recebe uma espécie de selo no rito da paz: em primeiro lugar, invoca-se de Cristo que o dom da sua paz (cf. Jo 14, 27) — tão diferente da paz do mundo — faça crescer a Igreja na unidade e na paz, segundo a sua vontade; portanto, com o gesto concreto trocado entre nós, expressamos «a comunhão eclesial e o amor recíproco, antes de receber o Sacramento» (OGMR, 82). No Rito romano a troca do sinal de paz, colocado desde a antiguidade antes da Comunhão, visa a Comunhão eucarística. Segundo a admoestação de São Paulo, não é possível comungar o único Pão que nos torna um só Corpo em Cristo, sem nos reconhecermos pacificados pelo amor fraterno (cf. 1 Cor 10, 16-17; 11, 29). A paz de Cristo não pode enraizar-se num coração incapaz de viver a fraternidade e de a reparar depois de a ter ferido. É o Senhor quem concede a paz: Ele dá-nos a graça de perdoar a quem nos tem ofendido.
O gesto da paz é seguido pela fração do Pão, que desde o tempo dos apóstolos conferiu o nome a toda a celebração da Eucaristia (cf. OGMR, 83; Catecismo da Igreja Católica, 1329). Cumprido por Jesus durante la última Ceia, partir o Pão é o gesto revelador que permitiu aos discípulos reconhecê-lo depois da sua ressurreição. Recordemos os discípulos de Emaús, os quais, falando do encontro com o Ressuscitado, narram «como o tinham reconhecido ao partir o pão» (cf. Lc 24, 30-31.35).
A fração do Pão eucarístico é acompanhada pela invocação do «Cordeiro de Deus», figura com a qual João Batista indicou em Jesus «aquele que tira o pecado do mundo» (Jo 1, 29). A imagem bíblica do cordeiro fala da redenção (cf. Êx 12, 1-14; Is 53, 7; 1 Pd 1, 19; Ap 7, 14). No Pão eucarístico, partido pela vida do mundo, a assembleia orante reconhece o verdadeiro Cordeiro de Deus, ou seja, Cristo Redentor, e suplica-o: «Tende piedade de nós... dai-nos a paz».
«Tende piedade de nós», «dai-nos a paz» são invocações que, da oração do “Pai-Nosso” à fração do Pão, nos ajudam a predispor a alma a participar no banquete eucarístico, fonte de comunhão com Deus e com os irmãos.
Não nos esqueçamos da grande oração: a que Jesus nos ensinou, e que é a oração com a qual Ele rezava ao Pai. E esta oração prepara-nos para a Comunhão.
Papa Francisco
Catequese na audiência Geral 14.03.2018
Queridos irmãos e irmãs, bom dia!
Continuemos as catequeses sobre a Santa Missa, e com esta catequese reflitamos sobre a Oração eucarística. Quando se conclui o rito da apresentação do pão e do vinho, tem início a Oração eucarística, que qualifica a celebração da Missa e constitui o seu momento central, que leva à sagrada Comunhão. Corresponde a quanto o próprio Jesus fez, à mesa com os Apóstolos na Última Ceia, quando «deu graças» sobre o pão e depois sobre o cálice do vinho (cf. Mt 26, 27; Mc 14, 23; Lc 22, 17.19; 1 Cor 11, 24): a sua ação de graças revive em cada nossa Eucaristia, associando-nos ao seu sacrifício de salvação.
Nesta Oração solene — a Oração eucarística é solene — a Igreja exprime o que ela cumpre quando celebra a Eucaristia e o motivo pelo qual a celebra, ou seja fazer comunhão com Cristo realmente presente no pão e no vinho consagrados. Depois de convidar o povo a elevar os corações ao Senhor e dar-lhe graças, o sacerdote pronuncia a Oração em voz alta, em nome de todos os presentes, dirigindo-se ao Pai por meio de Jesus Cristo no Espírito Santo. «O significado desta Oração é que toda a assembleia dos fiéis se una com Cristo para magnificar as grandes obras de Deus e para oferecer do sacrifício» (Ordenamento Geral do Missal Romano, 78). E para nos unir devemos compreender. Por isso, a Igreja quis celebrar a Missa na língua que as pessoas entendem, a fim de que cada um possa unir-se a este louvor e a esta grande oração juntamente com o sacerdote. Na verdade, «o sacrifício de Cristo e o sacrifício da Eucaristia são um único sacrifício» (Catecismo da Igreja Católica, 1367).
No Missal há várias fórmulas de Oração eucarística, todas constituídas por elementos caraterísticos, que gostaria de recordar agora (cf. OGMR, 79; CIC, 1352-1354). Todas são belíssimas. Antes de tudo, há o Prefácio, que é uma ação de graças pelos dons de Deus, em particular pelo envio do seu Filho como Salvador. O Prefácio conclui-se com a aclamação do «Santo», normalmente cantada. É bom cantar o “Santo”: “Santo, Santo, Santo é o Senhor”. É bom cantá-lo. Toda a assembleia une a própria voz àquela dos Anjos e dos Santos para louvar e glorificar a Deus.
Depois há a invocação do Espírito a fim de que com o seu poder consagre o pão e o vinho. Invocamos o Espírito para que venha e no pão e no vinho esteja presente Jesus. A ação do Espírito Santo e a eficácia das próprias palavras de Cristo proferidas pelo sacerdote, tornam realmente presente, sob as espécies do pão e do vinho, o seu Corpo e o seu Sangue, o seu sacrifício oferecido na cruz de uma vez para sempre (cf. CIC, 1375). Nisto Jesus foi claríssimo. Ouvimos como São Paulo no início narra as palavras de Jesus: «Este é o meu corpo, este é o meu sangue». «Este é o meu sangue, este é o meu corpo». O próprio Jesus disse isto. Não devemos formular pensamentos estranhos: “Mas, isso será possível...”. É o corpo de Jesus; ponto final! A fé: ajuda-nos a fé; com um ato de fé acreditamos que é o corpo e o sangue de Jesus. É o “mistério da fé”, como dizemos depois da consagração. O sacerdote diz: «Mistério da fé» e respondemos com uma aclamação. Celebrando o memorial da morte e ressurreição do Senhor, na expetativa da sua vinda gloriosa, a Igreja oferece ao Pai o sacrifício que reconcilia céu e terra: oferece o sacrifício pascal de Cristo oferecendo-se com Ele e pedindo, em virtude do Espírito Santo, para se tornar “em Cristo um só corpo e um só espírito” (Oração eucarística III; cf. Sacrosanctum Concilium, 48 OGMR, 79f). A Igreja deseja unir-nos a Cristo e tornar-se com o Senhor um só corpo e um só espírito. É esta a graça e o fruto da Comunhão sacramental: nutrimo-nos do Corpo de Cristo para nos tornarmos, nós que o comemos, o seu Corpo vivo hoje no mundo.
Este é o mistério de comunhão, a Igreja une-se à oferta de Cristo e à sua intercessão e nesta luz, «Nas catacumbas, a Igreja é muitas vezes representada como uma mulher em oração, de braços largamente abertos em atitude orante. Como Cristo, que estendeu os braços na Cruz, assim, por Ele, com Ele e n’Ele, a Igreja se oferece e intercede por todos os homens» (CIC, 1368). A Igreja que ora, a Igreja orante. É bom pensar que a Igreja ora, reza. Há um trecho no livro dos Atos dos Apóstolos, quando Pedro estava no cárcere, no qual a comunidade cristã diz: “Orava incessantemente por Ele”. A Igreja que ora, a Igreja orante. E quando vamos à Missa é para fazer isto: fazer Igreja orante.
A Oração eucarística pede a Deus que receba todos os seus filhos na perfeição do amor, em união com o Papa e o Bispo, mencionados pelo nome, sinal de que celebramos em comunhão com a Igreja universal e com a Igreja particular. A súplica, como oferenda, é apresentada a Deus por todos os membros da Igreja, vivos e defuntos, na expetativa da bem-aventurada esperança de partilhar a herança eterna do céu, com a Virgem Maria (cf. CIC, 1369-1371). Ninguém nem nada fica esquecido na Oração eucarística, mas cada coisa é reconduzida a Deus, como recorda a doxologia que a conclui. Ninguém é esquecido. E se eu tiver uma pessoa, parentes, amigos, que estão em necessidade ou passaram deste mundo para o outro, posso nomeá-los neste momento, interiormente e em silêncio ou escrever para que o nome seja pronunciado. “Padre, quanto devo pagar para que o meu nome seja dito?” — “Nada”. Entendestes isto? Nada! Não se paga a Missa. Ela é o sacrifício de Cristo, que é gratuito. A redenção é gratuita. Se quiseres, faz uma oferta, mas não se paga. É importante entender isto.
Esta fórmula codificada de oração, talvez a possamos ouvir um pouco distante — é verdade, é uma fórmula antiga — mas se compreendermos bem o seu significado, então certamente participaremos melhor. De facto, ela exprime tudo o que realizamos na celebração eucarística: e além disso ensina-nos a cultivar três atitudes que nunca deveriam faltar aos discípulos de Jesus. As três atitudes: primeira, aprender a “dar graças, sempre e em todos os lugares”, e não só em determinas ocasiões, quando tudo corre bem; segunda, fazer da nossa vida um dom de amor, livre e gratuito; terceira, fazer comunhão concreta, na Igreja e com todos. Portanto, esta Oração central da Missa educa-nos, aos poucos, a fazer de toda a nossa vida uma “eucaristia”, isto é uma ação de graças.
Papa Francisco
Catequese da audiência geral 7.03.2018
Bom dia, queridos irmãos e irmãs!
Continuemos as catequeses sobre a Santa Missa. À Liturgia da Palavra — sobre a qual meditei nas catequeses passadas — segue-se a outra parte constitutiva da Missa, que é a Liturgia eucarística. Nela, através dos sinais sagrados, a Igreja torna continuamente presente o Sacrifício da nova aliança, selada por Jesus no altar da Cruz (cf. Conc. Ecum. Vat. II, Const. Sacrosanctum concilium, 47). O primeiro altar cristão foi o da Cruz, e quando nos aproximamos do altar para celebrar a Missa, a nossa memória vai ao altar da Cruz, onde se realizou o primeiro sacrifício. O sacerdote, que na Missa representa Cristo, cumpre aquilo que o próprio Senhor fez e confiou aos discípulos na última Ceia: tomou o pão e o cálice, deu graças e distribuiu-os aos discípulos, dizendo: «Tomai e comei... bebei: isto é o meu Corpo... isto é o cálice do meu Sangue. Fazei isto em memória de mim!».
Obediente ao mandato de Jesus, a Igreja dispôs a Liturgia eucarística em momentos que correspondem às palavras e aos gestos realizados por Ele na vigília da sua Paixão. Assim, na preparação dos dons levam-se ao altar o pão e o vinho, ou seja, os elementos que Cristo tomou nas suas mãos. Na Prece eucarística damos graças a Deus pela obra da redenção, e as ofertas tornam-se o Corpo e o Sangue de Jesus Cristo. Seguem-se a fração do Pão e a Comunhão, mediante a qual revivemos a experiência dos Apóstolos que receberam os dons eucarísticos das mãos do próprio Cristo (cf. Ordenamento Geral do Missal Romano, 72).
Portanto, ao primeiro gesto de Jesus: «Tomou o pão e o cálice do vinho», corresponde a preparação dos dons. É a primeira parte da Liturgia eucarística. É bom que o pão e o vinho sejam apresentados ao sacerdote pelos fiéis, porque eles significam a oferta espiritual da Igreja ali congregada para a Eucaristia. É bom que precisamente os fiéis levem o pão e o vinho ao altar. Não obstante hoje «os fiéis já não levem, como outrora, o próprio pão e vinho, destinados à Liturgia, todavia o rito da apresentação destes dons conserva o seu valor e significado espiritual» (ibid., n. 73). E a este propósito, é significativo que, ao ordenar um novo presbítero, o Bispo, quando lhe entrega o pão e o vinho, diz: «Recebe as ofertas do povo santo para o sacrifício eucarístico» (Pontifical Romano — Ordenação dos bispos, dos presbíteros e dos diáconos). O povo de Deus que leva a oferta, o pão e o vinho, a grande oferta para a Missa! Portanto, nos sinais do pão e do vinho, o povo fiel põe a própria oferta nas mãos do sacerdote, que a coloca no altar, ou mesa do Senhor, «que é o centro de toda a Liturgia eucarística» (OGMR, n. 73). Ou seja, o centro da Missa é o altar, e o altar é Cristo; é necessário olhar sempre para o altar, que constitui o cerne da Missa. Por conseguinte, no «fruto da terra e do trabalho do homem» oferece-se o compromisso dos fiéis a fazer de si mesmos, obedientes à Palavra divina, um «sacrifício agradável a Deus Pai Todo-Poderoso», «pelo bem de toda a sua santa Igreja». Deste modo, «a vida dos fiéis, o seu louvor, o seu sofrimento, a sua oração e o seu trabalho unem-se aos de Cristo e à sua oblação total, adquirindo assim um novo valor» (Catecismo da Igreja Católica, 1.368).
Sem dúvida, a nossa oferta é pouca coisa, mas Cristo tem necessidade deste pouco. O Senhor pede-nos pouco e dá-nos muito. Pede-nos pouco. Na vida diária, pede-nos a boa vontade; pede-nos um coração aberto; pede-nos a vontade de ser melhores, para receber Aquele que se oferece a si mesmo a nós na Eucaristia; pede-nos estas oblações simbólicas que depois se tornarão o seu Corpo e o seu Sangue. Uma imagem deste movimento oblativo de oração é representada pelo incenso que, consumido no fogo, liberta uma fumaça perfumada que se eleva: incensar as ofertas, como se faz nos dias santos, incensar a cruz, o altar, o presbítero e o povo sacerdotal manifesta visivelmente o vínculo ofertorial que une todas estas realidades ao sacrifício de Cristo (cf. OGMR, n. 75). E não vos esqueçais: há o altar, que é Cristo, mas sempre em referência ao primeiro altar, que é a Cruz; e ao altar, que é Cristo, levamos o pouco dos nossos dons, o pão e o vinho, que depois se tornarão muito: o próprio Jesus que se oferece a nós!
É tudo isto que exprime também a oração do ofertório. Nela, o sacerdote pede a Deus que aceite os dons que a Igreja lhe oferece, invocando o fruto do admirável intercâmbio entre a nossa pobreza e a sua riqueza. No pão e no vinho apresentamos-lhe a oblação da nossa vida, a fim de que seja transformada pelo Espírito Santo no sacrifício de Cristo, tornando-se com Ele uma única oferenda espiritual agradável ao Pai. Enquanto concluímos assim a preparação dos dons, dispomo-nos para a Prece eucarística (cf. ibid., n. 77).
A espiritualidade da doação de si, que este momento da Missa nos ensina, possa iluminar os nossos dias, os relacionamentos com os outros, aquilo que levamos a cabo e os sofrimentos que encontramos, ajudando-nos a construir a cidade terrena à luz do Evangelho.
Papa Francisco
Catequese na audiência geral 02.03.2018
Amados irmãos e irmãs, bom dia!
Bom dia mesmo se o dia é um pouco feio. Mas se a alma estiver em alegria é sempre um dia bom. Portanto, bom dia! Hoje a audiência será feita em dois lugares: um pequeno grupo de doentes está na Sala, devido ao tempo e nós estamos aqui. Mas nós vemo-los e eles vêem a nós através dos grandes écrans. Saudemo-los com um aplauso.
Continuemos com a Catequese sobre a Missa. A escuta das Leituras bíblicas, prolongada na homilia, ao que corresponde? Corresponde a um direito: o direito espiritual do povo de Deus a receber com abundância o tesouro da Palavra de Deus (cf. Introdução ao Lecionário, 45). Cada um de nós, quando vai à Missa, tem o direito de receber abundantemente a Palavra de Deus bem lida, bem proclamada e depois, bem explicada na homilia. É um direito! E quando a Palavra de Deus não é bem lida, não é pregada com fervor pelo diácono, pelo sacerdote ou pelo bispo não se cumpre um direito dos fiéis. Nós temos o direito de ouvir a Palavra de Deus. O Senhor fala para todos, Pastores e fiéis. Ele bate à porta do coração de quantos participam na Missa, cada um na sua condição de vida, idade, situação. O Senhor consola, chama, suscita rebentos de vida nova e reconciliada. E isto por meio da sua Palavra. A sua Palavra bate ao coração e muda os corações!
Por isso, depois da homilia, um tempo de silêncio permite sedimentar no ânimo a semente recebida, a fim de que nasçam propósitos de adesão ao que o Espírito sugeriu a cada um. O silêncio depois da homilia. Um bom silêncio deve ser feito ali e cada um deve pensar naquilo que ouviu.
Depois deste silêncio, como prossegue a Missa? A resposta pessoal de fé insere-se na profissão de fé da Igreja, expressa no “Credo”. Todos nós recitamos o “Credo” na Missa. Recitado por toda a assembleia, o Símbolo manifesta a resposta comum a quanto se ouviu juntos acerca da Palavra de Deus (cf. Catecismo da Igreja Católica, 185-197). Há uma ligação vital entre a escuta e a fé. Estão unidas. Com efeito, ela — a fé — não nasce da fantasia de mentes humanas mas, como recorda São Paulo, «é pelo ouvir, e o ouvir pela palavra de Deus» (Rm 10, 17). Por conseguinte, a fé alimenta-se com a escuta e leva ao Sacramento. Assim, a recitação do “Credo” faz com que a assembleia litúrgica «medite novamente e professe os grandes mistérios da fé, antes da sua celebração na Eucaristia» (Ordenamento Geral do Missal Romano, 67).
O Símbolo de fé vincula a Eucaristia ao Batismo, recebido «no nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo», e recorda-nos que os Sacramentos são compreensíveis à luz da fé da Igreja.
A resposta à Palavra de Deus acolhida com fé expressa-se depois na súplica comum, denominada Oração universal, porque abraça as necessidades da Igreja e do mundo (cf. OGMR, 69-71; Introdução ao Lecionário, 30-31). É chamada também Oração dos fiéis.
Os padres do Vaticano II quiseram inserir de novo esta oração depois do Evangelho e da homilia, sobretudo aos domingos e dias festivos, para que, «com a participação do povo, se façam preces pela santa Igreja, pelos que nos governam, por aqueles a quem a necessidade oprime, por todos os homens e pela salvação de todo o mundo» (Const. Sacrosanctum concilium, 53; cf. 1 Tm 2, 1-2). Por conseguinte, sob a guia do sacerdote que introduz e conclui, «o povo, exercendo o seu sacerdócio batismal, oferece a Deus orações pela salvação de todos» (OGMR, 69). E depois das intenções particulares, propostas pelo diácono ou por um leitor, a assembleia une a sua voz invocando: «Ouvi-nos Senhor».
Com efeito, recordemos quanto nos disse o Senhor Jesus: «Se vós estiverdes em mim, e as minhas palavras estiverem em vós, pedi tudo o que quiserdes, e vos será feito» (Jo 15, 7). “Mas nós não acreditamos nisto, porque temos pouca fé”. Mas se nós tivéssemos uma fé — diz Jesus — como o grão de mostarda, teríamos recebido tudo. “Pedi tudo o que quiserdes, e vos será feito”. E neste momento da oração universal depois do Credo, é o momento de pedir ao Senhor as coisas mais fortes na Missa, as coisas de que precisámos, aquilo que desejamos. “Vos será feito”; de uma maneira ou doutra mas “vos será feito”. “Tudo é possível para aquele que crê”, disse o Senhor. O que respondeu aquele homem ao qual o Senhor se dirigiu para dizer estas palavras — tudo é possível para aquele que crê — ? Respondeu: “Senhor, eu creio. Ajuda a minha pouca fé”. Também nós podemos dizer: “Senhor, eu creio. Mas ajuda a minha pouca fé”. E devemos proferir a oração com este espírito de fé: “Senhor, eu creio, mas ajuda a minha pouca fé”. As pretensões de lógicas mundanas, ao contrário, não levantam voo rumo ao Céu, assim como permanecem desatendidos os pedidos autorreferenciais (cf. Tg 4, 2-3). As intenções pelas quais se convida o povo fiel a rezar devem dar voz às necessidades concretas da comunidade eclesial e do mundo, evitando recorrer a fórmulas convencionais e míopes. A oração “universal”, que conclui a liturgia da Palavra, exorta-nos a fazer nosso o olhar de Deus, que cuida de todos os seus filhos.
Papa Francisco
Catequese na audiência geral 14.02.2018
O tempo da Quaresma é um momento favorável para corrigir os acordos dissonantes da nossa vida cristã e acolher a nova e alegre alegria da Páscoa do Senhor. A Igreja, na sua sabedoria materna, propõe prestar atenção especial a tudo o que pode arrefecer e oxidar nosso coração de fé.
As tentações a que estamos expostos são múltiplas. Cada um de nós conhece as dificuldades que enfrentamos. E é triste ver como, diante das vicissitudes diárias, as vozes são criadas que, aproveitando a dor e a incerteza, não pode semear nada além de desconfiança. E se o fruto da fé é de caridade - como a Madre Teresa de Calcutá adorava repetir - o fruto da desconfiança é a desculpa e resignação. Desconfiança, apatia e resignação: os demônios que cauterizam e paralisam a alma do povo que acredita.
A Quaresma é um tempo precioso para expor estas e outras tentações e deixar os nossos corações de volta para bater de acordo com a batida do coração de Jesus. Toda esta liturgia é impregnado com tal sentimento e poderíamos dizer que ecoa em três palavras que existem ofertas para "Aquecimento do coração de fé": pare , olhe e volte .
Pare um pouco, deixe esta agitação e este correr sem significado que preenche a alma com a amargura de sentir que você nunca chegar a lugar algum. Pare, deixe esta obrigação de viver de forma acelerada, que dispersa, divide e acaba destruindo o tempo da família, o tempo da amizade, o tempo das crianças, o tempo dos avós, o tempo da gratuidade ... o tempo de Deus.
Pare um pouco antes da necessidade de aparecer e ser visto por todos, estar constantemente "na janela", o que nos faz esquecer o valor da intimidade e da lembrança.
Pare um pouco antes do olhar altivo, o comentário fugaz e desdenhoso que vem de ter esquecido a ternura, a piedade e o respeito pelo encontro com os outros, especialmente aqueles vulneráveis, feridos e até imersos no pecado e no erro.
Pare um pouco antes da compulsão de querer controlar tudo, conhecer tudo, devastar tudo, que vem de ter esquecido a gratidão pelo dom da vida e por tão bem recebido.
Pare um pouco antes do ruído ensurdecedor que se atrofia e surpreende nossos ouvidos e nos faz esquecer o poderoso e criativo poder do silêncio.
Pare um pouco antes da atitude de fomentar sentimentos esterilizados e inférteis que derivam do fechamento e da autocompasão e levam a esquecer de encontrar outros para compartilhar os encargos e os sofrimentos.
Pare diante do vazio do que é instantâneo, momentâneo e efêmero, que nos priva das raízes, dos laços, do valor dos caminhos e de nos conhecer sempre a caminho.
Pare. Pare para olhar e contemplar!
Olhe. Olhe para os sinais que impedem a extinção da caridade, que mantêm viva a chama da fé e da esperança. Faces vivas da ternura e bondade de Deus que trabalha entre nós.
Olhe para o rosto de nossas famílias que continuam a apostar dia a dia, com grande esforço para avançar na vida e, entre muitas falhas e estreiteza, não perca nenhuma tentativa de fazer de casa uma escola de amor.
Olhe para os rostos que nos desafiam, os rostos de nossos filhos e jovens cheios de futuro e esperança, cheios de amanha e potencial que exigem dedicação e proteção. Crestes vivos de amor e vida que sempre atravessam nossos cálculos mesquinhos e egoístas.
Olhe para os rostos de nossos velhos enrugados pelo passar dos tempos: enfrenta os portadores da memória viva do nosso povo. Rostos da sabedoria trabalhadora de Deus.
Olhe para os rostos dos nossos doentes e de tantos que se encarregam disso; enfrenta que em sua vulnerabilidade e seu serviço nos lembram que o valor de cada pessoa nunca pode ser reduzido a uma questão de cálculo ou utilidade.
Olhe para os rostos arrependidos de muitos que tentam compensar seus erros e erros e, a partir de suas misérias e suas dores, lutam para transformar situações e seguir em frente.
Olhe e contemple o rosto do Amor Crucificado, que hoje da cruz continua a ser portador de esperança; mão estendida para aqueles que se sentem crucificados, que experimentam o peso do fracasso, desilusão e desapontamento em suas vidas.
Olhe e contemple o rosto concreto de Cristo crucificado, crucificado pelo amor de todos sem exclusão. De tudo? Sim, de todos. Olhando para o rosto dele é o convite esperançoso desta época da Quaresma para ganhar os demônios da desconfiança, da desculpa e da resignação. Cara que nos convida a exclamar: o Reino de Deus é possível!
Pare, olhe e volte . Volte para a casa do seu pai. Retorne sem medo para os braços ansiosos e estendidos de seu Pai, rico em piedade, que está esperando por você ( Ef 2 : 4)!
Voltar! Sem medo: este é o momento oportuno para voltar para casa, para a casa de "meu Pai e seu Pai" (ver Jn 20,17). Este é o momento de deixar o coração tocar ... Permanecer no caminho do mal é apenas uma fonte de ilusão e tristeza. A verdadeira vida é algo muito diferente, e nossos corações sabem bem. Deus não se cansa ou se cansa de estender sua mão (veja Bolla Misericordiae Vultus , 19).
Volte sem medo para experimentar a ternura de cura e reconciliação de Deus! Deixe o Senhor curar as feridas do pecado e cumprir a profecia feita a nossos pais: 'Eu te darei um coração novo e em vós porei um espírito novo. Tirarei de vós o coração de pedra e vos darei um coração de carne "( Ez 36,26).
Pare, olhe, volte!
Papa Francisco
Homilia na missa de quarta-feira de cinzas -
14.02.2018
Prezados irmãos e irmãs, bom dia!
Continuemos as catequeses sobre a Santa Missa. Tínhamos chegado às Leituras.
O diálogo entre Deus e o seu povo, desenvolvido na Liturgia da Palavra da Missa, alcança o ápice na proclamação do Evangelho. Precede-o o cântico do Aleluia — ou então, na Quaresma, outra aclamação — com o qual «a assembleia dos fiéis acolhe e saúda o Senhor que está prestes a falar no Evangelho».[1] Do mesmo modo que os mistérios de Cristo iluminam toda a revelação bíblica, assim, na Liturgia da Palavra, o Evangelho constitui a luz para compreender o sentido dos textos bíblicos que o precedem, tanto do Antigo como do Novo Testamento. Com efeito, «de toda a Escritura, assim como de toda a celebração litúrgica, Cristo é o centro e a plenitude».[2] Jesus Cristo está sempre no centro, sempre.
Por isso, a própria liturgia distingue o Evangelho das outras leituras, circundando-o de honra e veneração especiais.[3] Com efeito, a sua leitura é reservada ao ministro ordenado, que no final beija o Livro; pomo-nos à escuta de pé, traçando um sinal da cruz na testa, nos lábios e no peito; os círios e o incenso honram Cristo que, mediante a leitura evangélica, faz ressoar a sua palavra eficaz. Destes sinais a assembleia reconhece a presença de Cristo, o qual lhe dirige a “boa notícia” que converte e transforma. Tem lugar um discurso direto, como atestam as aclamações com as quais se responde à proclamação: «Glória a Vós, ó Senhor» e «Louvor a Vós, ó Cristo». Levantamo-nos para ouvir o Evangelho: ali é Cristo quem nos fala. É por isso que prestamos atenção, porque se trata de um diálogo direto. É o Senhor quem nos fala.
Portanto, na Missa não lemos o Evangelho para saber o que aconteceu, mas ouvimos o Evangelho para tomar consciência do que fez e disse Jesus outrora; e aquela Palavra é viva, a Palavra de Jesus que está no Evangelho é viva e chega ao meu coração. Por isso, ouvir o Evangelho é muito importante, com o coração aberto, porque é Palavra viva. Santo Agostinho escreve que «a boca de Cristo é o Evangelho. Ele reina no céu, mas não cessa de falar na terra».[4] Se é verdade que na Liturgia «Cristo ainda anuncia o Evangelho»,[5] consequentemente, participando na Missa, devemos dar-lhe uma resposta. Nós ouvimos o Evangelho e devemos dar uma resposta na nossa vida.
Para transmitir a sua mensagem, Cristo serve-se inclusive da palavra do sacerdote que, após o Evangelho, pronuncia a homilia.[6]Recomendada vivamente pelo Concílio Vaticano II come parte da própria Liturgia,[7] a homilia não é um discurso de circunstância — nem sequer uma catequese, como esta que agora faço — nem uma conferência, nem sequer uma lição; a homilia é outra coisa. O que é a homilia? É «um retomar este diálogo que já está estabelecido entre o Senhor e o seu povo»,[8] para que seja posta em prática na vida. A autêntica exegese do Evangelho é a nossa vida santa! A Palavra do Senhor termina a sua corrida fazendo-se carne em nós, traduzindo-se em obras, como aconteceu em Maria e nos Santos. Recordai aquilo que eu disse na última vez, a Palavra do Senhor entra pelos ouvidos, chega ao coração e vai às mãos, às boas obras. E também a homilia segue a Palavra do Senhor, fazendo inclusive este percurso para nos ajudar, a fim de que a Palavra do Senhor chegue às mãos, passando pelo coração.
Já abordei o tema da homilia na Exortação Evangelii gaudium, onde recordei que o contexto litúrgico «exige que a pregação oriente a assembleia, e também o pregador, para uma comunhão com Cristo na Eucaristia, que transforme a vida».[9]
Quem profere a homilia deve cumprir bem o seu ministério — aquele que prega, sacerdote, diácono ou bispo — oferecendo um serviço real a todos aqueles que participam na Missa, mas também quantos o ouvem, devem desempenhar a sua parte. Antes de tudo, prestando a devida atenção, ou seja, assumindo as justas disposições interiores, sem pretensões subjetivas, consciente de que cada pregador tem qualidades e limites. Se às vezes há motivos para se entediar, porque a homilia é longa, ou não está centrada, ou é incompreensível, outras vezes, ao contrário, o obstáculo é o preconceito. E quem pronuncia a homilia deve estar consciente de que não faz algo próprio, mas prega dando voz a Jesus, prega a Palavra de Jesus. E a homilia deve ser bem preparada, deve ser breve, breve! Dizia-me um sacerdote que certa vez tinha ido a outra cidade, onde moravam os pais, e o pai disse-lhe: “Sabes, estou feliz, porque com os meus amigos encontramos uma igreja onde se celebra a Missa sem homilia!”. E quantas vezes vemos que na homilia alguns adormecem, outros conversam, ou saem para fumar um cigarro... Por isso, por favor, que a homilia seja curta, mas bem preparada. E como se prepara uma homilia, caros sacerdotes, diáconos, bispos? Como se prepara? Com a oração, com o estudo da Palavra de Deus e fazendo uma síntese clara e breve, não deve superar 10 minutos, por favor! Concluindo, podemos dizer que na Liturgia da Palavra, mediante o Evangelho e a homilia, Deus dialoga com o seu povo, que o ouve com atenção e veneração e, ao mesmo tempo, reconhece-o presente e ativo. Portanto, se nos pusermos à escuta da “boa notícia”, seremos convertidos e transformados por ela e, consequentemente, capazes de transformar a nós mesmos e ao mundo. Porquê? Porque a Boa Notícia, a Palavra de Deus entra pelos ouvidos, vai ao coração e chega às mãos para fazer boas obras.
Papa Francisco
Catequese na audiência Geral 7.02.2018
imagem: site do Vaticano 2020
[1] Ordenamento Geral do Missal Romano, 62.
[2] Introdução ao Lecionário, 5.
[3] Cf. Ordenamento Geral do Missal Romano, 60 e 134.
[4] Sermão 85, 1: PL 38, 520; cf. também Tratado sobre o Evangelho de João, XXX, I: PL 35, 1632; CCL 36, 289.
[5] Conc. Ecum. Vat. II, Const. Sacrosanctum concilium, 33.
[6] Cf. Ordenamento Geral do Missal Romano, 65-66; Introdução ao Lecionário, 24-27.
[7] Cf. Conc. Ecum. Vat. II, Const. Sacrosanctum concilium, 52.
[8] Exort. ap. Evangelii gaudium, 137.
Hoje damos continuidade às catequeses sobre a Santa Missa. Depois de termos refletido sobre os ritos de introdução, consideremos agora a Liturgia da Palavra, que é uma parte constitutiva porque nos reunimos precisamente para ouvir aquilo que Deus fez e ainda tenciona realizar por nós. É uma experiência que acontece “diretamente” e não por ter ouvido falar, pois «quando na Igreja se lê a Sagrada Escritura, é o próprio Deus que fala ao seu povo; e Cristo, presente na palavra, anuncia o Evangelho» (Ordenamento Geral do Missal Romano, 29; cf. Const. Sacrosanctum concilium, 7; 33). E quantas vezes, enquanto se lê a Palavra de Deus, se comenta: “Olha aquele..., olha aquela... olha o chapéu que ela tem: é ridículo...”. E começa-se a fazer comentários. Não é verdade? Devem-se fazer comentários durante a leitura da Palavra de Deus? [respondem: “não!”]. Não, porque se tu tagarelas com as pessoas não ouves a Palavra de Deus. Quando se lê a Palavra de Deus na Bíblia — a primeira Leitura, a segunda, o Salmo responsorial e o Evangelho — devemos ouvir, abrir o coração, pois é o próprio Deus que nos fala, e não podemos pensar noutras coisas nem falar de outros assuntos. Entendestes?... Explicar-vos-ei o que acontece nesta Liturgia da Palavra.
As páginas da Bíblia deixam de ser um escrito, para se tornar Palavra viva, pronunciada por Deus. É Deus quem, através da pessoa que lê, nos fala e nos interpela, a nós que ouvimos com fé. O Espírito «que falou por meio dos profetas» (Credo), inspirando os autores sagrados, faz com que «a Palavra de Deus atue realmente nos corações aquilo que faz ressoar aos ouvidos» (Lecionário, Introd., 9). Mas para ouvir a palavra de Deus é necessário ter também o coração aberto para receber a palavra no coração. Deus fala e nós prestamos-lhe ouvidos, para depois pôr em prática quanto ouvimos. É muito importante ouvir. Às vezes, talvez, não entendemos bem porque algumas leituras são um pouco difíceis. Mas Deus fala-nos igualmente de outro modo. [É preciso estar] em silêncio e ouvir a Palavra de Deus. Não vos esqueçais disto. Na Missa, quando começam as leituras, ouçamos a Palavra de Deus.
Temos necessidade de o ouvir! Com efeito, é uma questão de vida, como bem lembra a expressão incisiva de que «não só de pão vive o homem, mas de toda a palavra que sai da boca de Deus» (Mt 4, 4). A vida que nos dá a Palavra de Deus. Neste sentido, falamos da Liturgia da Palavra como da “mesa” que o Senhor prepara para alimentar a nossa vida espiritual. A da liturgia é uma mesa abundante, que haure amplamente dos tesouros da Bíblia (cf. SC, 51), tanto do Antigo como do Novo Testamento, porque neles é anunciado pela Igreja o único e idêntico mistério de Cristo (cf. Lecionário, Introd., 5). Pensemos na riqueza das leituras bíblicas oferecidas pelos três ciclos dominicais que, à luz dos Evangelhos Sinóticos, nos acompanham ao longo do ano litúrgico: uma grande riqueza. Aqui desejo recordar também a importância do Salmo responsorial, cuja função consiste em favorecer a meditação do que se ouve na leitura que o precede. É bom que o Salmo seja valorizado através do cântico, pelo menos no refrão (cf. OGMR, 61; Lecionário, Introd., 19-22).
A proclamação litúrgica das mesmas leituras, com os cânticos tirados da Sagrada Escritura, exprime e favorece a comunhão eclesial, acompanhando o caminho de todos e de cada um. Portanto, compreende-se por que são proibidas algumas escolhas subjetivas, como a omissão de leituras ou a sua substituição com textos não bíblicos. Ouvi dizer que alguém, quando há uma notícia, lê o jornal, porque é a manchete do dia. Não! A Palavra de Deus é a Palavra de Deus! Depois podemos ler o jornal. Mas ali lê-se a Palavra de Deus. É o Senhor que nos fala. Substituir aquela Palavra com outras empobrece e compromete o diálogo entre Deus e o seu povo em oração. Ao contrário, [exige-se] a dignidade do ambão e o uso do Lecionário, a disponibilidade de bons leitores e salmistas. Mas é preciso procurar bons leitores, que saibam ler, e não aqueles que leem [deturpando as palavras] e não se entende nada. É assim. Bons leitores! Devem preparar-se e ensaiar antes da Missa, para ler bem. E isto cria um clima de silêncio receptivo.
Sabemos que a palavra do Senhor é uma ajuda indispensável para não nos perdermos, como oportunamente reconhece o Salmista que, dirigindo-se ao Senhor, confessa: «A vossa palavra é uma lâmpada que ilumina os meus passos, uma luz no meu caminho» (Sl119 [118], 105). Como poderíamos enfrentar a nossa peregrinação terrena, com as suas dificuldades e provações, sem ser regularmente alimentados e iluminados pela Palavra de Deus que ressoa na liturgia?
Sem dúvida, não é suficiente escutar com os ouvidos, sem acolher no coração a semente da Palavra divina, permitindo que ela produza frutos. Lembremo-nos da parábola do semeador e dos vários resultados alcançados, conformidade com os diversos tipos de terreno (cf. Mc 4, 14-20). A ação do Espírito, que torna eficaz a resposta, tem necessidade de corações que se deixem modelar e cultivar, de modo que quanto é ouvido na Missa passe para a vida de todos os dias, segundo a admoestação do Apóstolo Tiago: «Sede cumpridores da Palavra e não apenas ouvintes, enganando-vos a vós mesmos» (Tg 1, 22). A Palavra de Deus percorre um caminho dentro de nós. Escutamo-la com os ouvidos e ela passa para o coração; não permanece nos ouvidos, mas deve chegar ao coração; e do coração às mãos, às boas obras. Eis o percurso da Palavra de Deus: dos ouvidos ao coração e às mãos. Aprendamos estas coisas. Obrigado!
Papa Francisco
Catequese na audiência Geral - 31.01.2018
No percurso de catequeses sobre a celebração eucarística, vimos que o Ato penitencial nos ajuda a despojar-nos das nossas presunções e a apresentar-nos a Deus como realmente somos, conscientes de sermos pecadores, na esperança de sermos perdoados.
Precisamente do encontro entre a miséria humana e a misericórdia divina adquire vida a gratidão expressa no “Glória”, «um hino antiquíssimo e venerável com o qual a Igreja, congregada no Espírito Santo, glorifica e suplica a Deus Pai e ao Cordeiro» (Ordenamento Geral do Missal Romano, 53).
O início deste hino — “Glória a Deus nas alturas” — retoma o cântico dos Anjos no nascimento de Jesus em Belém, anúncio jubiloso do abraço entre céu e terra. Este canto inclui-nos também a nós reunidos em oração: «Gloria a Deus nas alturas e paz na terra aos homens de boa vontade».
Após o “Glória”, ou então, na sua ausência, imediatamente depois do Ato penitencial, a oração adquire forma particular na prece denominada “coleta”, por meio da qual se expressa o caráter próprio da celebração, que varia de acordo com os dias e os tempos do ano (cf. ibid., 54). Mediante o convite «oremos», o sacerdote exorta o povo a recolher-se com ele num momento de silêncio, com a finalidade de tomar consciência de estar na presença de Deus e fazer emergir, cada qual no próprio coração, as intenções pessoais com as quais participa na Missa (cf. ibid., 54). O sacerdote diz «oremos»; e depois há um momento de silêncio, e cada um pensa naquilo de que precisa, que deseja pedir, na oração.
O silêncio não se reduz à ausência de palavras, mas consiste em predispor-se a ouvir outras vozes: a do nosso coração e, sobretudo, a voz do Espírito Santo. Na liturgia, a natureza do silêncio sagrado depende do momento em que se realiza: «Durante o Ato penitencial e após o convite à oração, ajuda o recolhimento; depois da leitura ou da homilia, é uma exortação a meditar brevemente sobre o que se ouviu; após a Comunhão, favorece a prece interior de louvor e de súplica» (ibid., 45). Portanto, antes da oração inicial, o silêncio ajuda a recolher-nos em nós mesmos e a pensar por que estamos ali. Eis, então, a importância de ouvir o nosso espírito para o abrir depois ao Senhor. Talvez tenhamos vivido dias de cansaço, de alegria, de dor, e queremos dizê-lo ao Senhor, invocar a sua ajuda, pedir que esteja próximo de nós; temos familiares e amigos doentes, ou que atravessam provações difíceis; desejamos confiar a Deus o destino da Igreja e do mundo. É para isto que serve o breve silêncio antes que o sacerdote, recolhendo as intenções de cada um, recite em voz alta a Deus, em nome de todos, a oração comum que conclui os ritos de introdução, realizando precisamente a “coleta” das intenções individuais. Recomendo vivamente aos sacerdotes que observem este momento de silêncio e não se apressem: «oremos», e que se faça silêncio. Recomendo isto aos presbíteros. Sem este silêncio, corremos o risco de descuidar o recolhimento da alma.
O sacerdote recita esta súplica, esta oração de coleta, de braços abertos: é a atitude do orante, assumida pelos cristãos desde os primeiros séculos — como testemunham os afrescos das catacumbas romanas — para imitar Cristo de braços abertos no madeiro da cruz. Ali Cristo é o Orante e, ao mesmo tempo, a oração! No Crucificado reconhecemos o Sacerdote que oferece a Deus o culto que lhe é agradável, ou seja, a obediência filial.
No Rito Romano as orações são concisas, mas ricas de significado: podem fazer-se muitas meditações bonitas sobre estas preces. Muito belas! Voltar a meditar os seus textos, até fora da Missa, pode ajudar-nos a aprender como dirigir-nos a Deus, o que pedir, que palavras usar. Possa a liturgia tornar-se para todos nós uma verdadeira escola de oração.
Papa Francisco
Audiência Geral 10.01.18
imagem: site do vaticano 2020
Hoje gostaria de entrar no vivo da celebração eucarística. A Missa é composta por duas partes, que são a Liturgia da Palavra e a Liturgia eucarística, tão estreitamente unidas entre si, a ponto de formar um único ato de culto (cf. Sacrosanctum concilium, 56; Ordenamento Geral do Missal Romano, 28). Portanto, introduzida por alguns ritos preparatórios e concluída por outros, a celebração é um único corpo e que não se pode separar, mas para uma melhor compreensão procurarei explicar os seus vários momentos, cada um dos quais é capaz de tocar e abranger uma dimensão da nossa humanidade. É necessário conhecer estes santos sinais para viver plenamente a Missa e apreciar toda a sua beleza.
Quando o povo está reunido, a celebração abre-se com os ritos introdutórios, que incluem a entrada dos celebrantes ou do celebrante, a saudação — “O Senhor esteja convosco”, “A paz esteja convosco” — o ato penitencial — “Confesso”, no qual nós pedimos perdão pelos nossos pecados — o Kyrie eleison, o hino do Glória e a oração da coleta: chama-se “oração da coleta” não porque ali se faz a coleta das ofertas: é a coleta das intenções de oração de todos os povos; e aquela coleta da intenção dos povos eleva-se ao céu como prece. A sua finalidade — destes ritos introdutórios — é fazer com «que os fiéis reunidos formem uma comunidade e se predisponham a ouvir com fé a palavra de Deus e a celebrar dignamente a Eucaristia» (Ordenamento Geral do Missal Romano, 46). Não é um bom hábito olhar para o relógio e dizer: “Estou a tempo, chego depois do sermão e assim cumpro o preceito”. A Missa começa com o sinal da cruz, com estes ritos introdutórios, porque ali começamos a adorar Deus como comunidade. E por isso é importante procurar não chegar atrasado mas, ao contrário, antecipadamente, a fim de preparar o coração para este rito, para esta celebração da comunidade.
Geralmente, enquanto se executa o cântico de entrada, o sacerdote com os outros ministros chega processionalmente ao presbitério, e aqui saúda o altar com uma inclinação e, em sinal de veneração, beija-o e, quando há incenso, incensa-o. Porquê? Porque o altar é Cristo: é figura de Cristo. Quando fitamos o altar, olhamos precisamente para onde está Cristo. O altar é Cristo. Estes gestos, que correm o risco de passar despercebidos, são muito significativos, porque exprimem desde o início que a Missa é um encontro de amor com Cristo o qual , «oferecendo o seu corpo na cruz [...] se tornou altar, vítima e sacerdote» (Prefácio pascalV). Com efeito, sendo sinal de Cristo, o altar «é o centro da ação de graças que se realiza com a Eucaristia» (Ordenamento Geral do Missal Romano, 296), e toda a comunidade em volta do altar, que é Cristo; não para olhar na cara, mas para fitar Cristo, porque Cristo está no centro da comunidade e não longe dela.
Depois há o sinal da cruz. O sacerdote que preside faz o sinal e de igual modo o fazem todos os membros da assembleia, conscientes de que o ato litúrgico se realiza «em nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo». E aqui passo para outro tema muito pequeno. Vistes como as crianças fazem o sinal da cruz? Não sabem o que fazem: às vezes fazem um desenho, que não é o sinal da cruz. Por favor: mãe e pai, avós, ensinai às crianças, desde o início — desde pequeninos — a fazer bem o sinal da cruz. E explicai-lhes que significa ter a cruz de Jesus como proteção. E a Missa começa com o sinal da cruz. A oração inteira move-se, por assim dizer, no espaço da Santíssima Trindade — “Em nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo” — que é espaço de comunhão infinita; tem como origem e fim o amor de Deus Uno e Trino, manifestado e doado a nós na Cruz de Cristo. Com efeito, o seu mistério pascal é dom da Trindade, e a Eucaristia brota sempre do seu Coração trespassado. Portanto, fazendo o sinal da cruz, não só recordamos o nosso Batismo, mas afirmamos que a prece litúrgica é o encontro com Deus em Jesus Cristo, que por nós se encarnou, morreu na cruz e ressuscitou glorioso.
Em seguida, o sacerdote dirige a saudação litúrgica, com a expressão: «O Senhor esteja convosco», ou outra semelhante — existem diversas — e a assembleia responde: «E com o teu espírito». Estamos em diálogo; estamos no início da Missa e temos que pensar no significado de todos estes gestos e palavras. Entramos numa “sinfonia”, na qual ressoam vários tons de vozes, e inclusive momentos de silêncio, em vista de criar o “acordo” entre todos os participantes, ou seja, de nos reconhecermos animados por um único Espírito e por um mesmo fim. Com efeito, «a saudação sacerdotal e a resposta do povo manifestam o mistério da Igreja congregada» (Ordenamento Geral do Missal Romano, 50). Exprime-se assim a fé comum e o desejo recíproco de estar com o Senhor e de viver a unidade com a humanidade inteira.
Esta é uma sinfonia orante, que se vai criando e apresenta imediatamente um momento muito comovedor, pois quem preside convida todos a reconhecer os próprios pecados. Todos somos pecadores. Não sei, talvez algum de vós não seja pecador... Se alguém não é pecador, levante a mão, por favor, assim todos veremos. Mas não há mãos levantadas, está bem: tendes uma boa fé! Todos somos pecadores; é por isso que no início da Missa pedimos perdão. É o ato penitencial. Não se trata apenas de pensar nos pecados cometidos, mas muito mais: é o convite a confessar-nos pecadores diante de Deus e da comunidade, perante os irmãos, com humildade e sinceridade, como o publicado no templo. Se verdadeiramente a Eucaristia torna presente o Mistério pascal, ou seja, a passagem de Cristo da morte para a vida, então a primeira coisa que devemos fazer é reconhecer quais são as nossas situações de morte para poder ressuscitar com Ele para a nova vida. Isto leva-nos a compreender como é importante o ato penitencial. E por isso retomaremos este tema na próxima catequese.
Vamos passo a passo na explicação da Missa. Mas recomendo-vos: por favor, ensinai bem as crianças a fazer o sinal da cruz!
Papa Francisco
Audiência Geral 20.12.2017
imagem: pexels.com
Retomando o caminho de catequeses sobre a Missa, hoje perguntemo-nos: por que ir à Missa aos domingos?
A celebração dominical da Eucaristia está no centro da vida da Igreja (cf. Catecismo da Igreja Católica, n. 2177). Nós, cristãos, vamos à Missa aos domingos para encontrar o Senhor Ressuscitado, ou melhor, para nos deixarmos encontrar por Ele, ouvir a sua palavra, alimentar-nos à sua mesa e assim tornar-nos Igreja, isto é, seu Corpo místico vivo no mundo.
Compreenderam isto, desde o princípio, os discípulos de Jesus, que celebraram o encontro eucarístico com o Senhor no dia da semana ao qual os judeus chamavam “o primeiro da semana” e os romanos “dia do sol”, porque naquele dia Jesus tinha ressuscitado dos mortos e aparecido aos discípulos, falando com eles, comendo com eles, concedendo-lhes o Espírito Santo (cf. Mt 28, 1; Mc 16, 9.14; Lc 24, 1.13; Jo 20, 1.19), como ouvimos na Leitura bíblica. Também a grande efusão do Espírito no Pentecostes teve lugar no domingo, cinquenta dias depois da Ressurreição de Jesus. Por estas razões, o domingo é um dia santo para nós, santificado pela celebração eucarística, presença viva do Senhor entre nós e para nós. Portanto, é a Missa que faz o domingo cristão! O domingo cristão gira em volta da Missa. Que domingo é, para o cristão, aquele no qual falta o encontro com o Senhor?
Existem comunidades cristãs que, infelizmente, não podem beneficiar da Missa todos os domingos; no entanto, também elas, neste dia santo, são chamadas a recolher-se em oração em nome do Senhor, ouvindo a Palavra de Deus e mantendo vivo o desejo da Eucaristia.
Algumas sociedades secularizadas perderam o sentido cristão do domingo iluminado pela Eucaristia. Isto é pecado! Em tais contextos é preciso reavivar esta consciência, para recuperar o significado da festa, o significado da alegria, da comunidade paroquial, da solidariedade e do descanso que revigora a alma e o corpo (cf. Catecismo da Igreja Católica, nn. 2177-2188). De todos estes valores a Eucaristia é a nossa mestra, domingo após domingo. Por isso, o Concílio Vaticano II quis reiterar que «o domingo é, pois, o principal dia de festa a propor e inculcar no espírito dos fiéis; seja também o dia da alegria e do repouso, da abstenção do trabalho» (Const. Sacrosanctum concilium, 106).
A abstenção dominical do trabalho não existia nos primeiros séculos: é uma contribuição específica do cristianismo. Por tradição bíblica, os judeus descansam no sábado, enquanto na sociedade romana não estava previsto um dia semanal de abstenção dos trabalhos servis. Foi o sentido cristão do viver como filhos e não como escravos, animado pela Eucaristia, que fez do domingo — quase universalmente — o dia do descanso.
Sem Cristo estamos condenados a ser dominados pelo cansaço do dia a dia, com as suas preocupações, e pelo medo do amanhã. O encontro dominical com o Senhor dá-nos a força para viver o presente com confiança e coragem, e para progredir com esperança. Por isso nós, cristãos, vamos encontrar-nos com o Senhor aos domingos, na celebração eucarística.
A Comunhão eucarística com Jesus, Ressuscitado e Vivo eternamente, antecipa o Domingo sem ocaso, quando já não haverá cansaço nem dor, nem luto, nem lágrimas, mas só a alegria de viver plenamente e para sempre com o Senhor. Inclusive sobre este abençoado descanso nos fala a Missa dominical, ensinando-nos, no decorrer da semana, a confiar-nos nas mãos do Pai que está no Céu.
Como podemos responder a quem diz que não é preciso ir à Missa, nem sequer aos domingos, porque o importante é viver bem, amar o próximo? É verdade que a qualidade da vida cristã se mede pela capacidade de amar, como disse Jesus: «Disto todos saberão que sois meus discípulos, se vos amardes uns aos outros» (Jo 13, 35); mas como podemos praticar o Evangelho sem haurir a energia necessária para o fazer, um domingo após o outro, na fonte inesgotável da Eucaristia? Não vamos à Missa para oferecer algo a Deus, mas para receber dele aquilo de que verdadeiramente temos necessidade. Recorda-o a oração da Igreja, que assim se dirige a Deus: «Tu não precisas do nosso louvor, mas por um dom do teu amor chamas-nos a dar-te graças; os nossos hinos de bênção não aumentam a tua grandeza, mas obtém para nós a graça que nos salva» (Missal Romano, Prefácio comum IV).
Em síntese, por que ir à Missa aos domingos? Não é suficiente responder que é um preceito da Igreja; isto ajuda a preservar o seu valor, mas sozinho não basta. Nós, cristãos, temos necessidade de participar na Missa dominical, porque só com a graça de Jesus, com a sua presença viva em nós e entre nós, podemos pôr em prática o seu mandamento, e assim ser suas testemunhas credíveis.
Papa Francisco
Catequese da Audiência Geral 13.12.2017
Prosseguindo as Catequeses sobre a Missa, podemos questionar-nos: o que é essencialmente a Missa? A Missa é o memorial do Mistério pascal de Cristo. Ela torna-nos partícipes da sua vitória sobre o pecado e a morte, e confere pleno significado à nossa vida.
Por esta razão, a fim de compreender o valor da Missa devemos então entender em primeiro lugar o significado bíblico do “memorial”. Ele «não é somente a lembrança dos acontecimentos do passado, mas... tornam-se de certo modo presentes e atuais. É assim que Israel entende a sua libertação do Egito: sempre que se celebrar a Páscoa, os acontecimentos do Êxodo tornam-se presentes à memória dos crentes, para que conformem com eles a sua vida» (Catecismo da Igreja Católica, 1363). Jesus Cristo, com a sua paixão, morte, ressurreição e ascensão ao céu levou a cumprimento a Páscoa. E a Missa é o memorial da sua Páscoa, do seu “êxodo”, que cumpriu por nós, para nos fazer sair da escravidão e nos introduzir na terra prometida da vida eterna. Não é somente uma lembrança, não, é mais do que isso: significa evocar o que aconteceu há vinte séculos.
A Eucaristia leva-nos sempre ao ápice da ação de salvação de Deus: o Senhor Jesus, tornando-se pão partido para nós, derrama sobre nós toda a sua misericórdia e o seu amor, como fez na cruz, de modo a renovar o nosso coração, a nossa existência e a nossa forma de nos relacionarmos com Ele e com os irmãos. O Concílio Vaticano II afirma: «Sempre que no altar se celebra o sacrifício da cruz, na qual Cristo, nossa Páscoa, foi imolado, realiza-se também a obra da nossa redenção» (Cost. dogm. Lumen gentium, 3).
Cada celebração da Eucaristia é um raio daquele sol sem ocaso que é Jesus ressuscitado. Participar na Missa, em particular aos domingos, significa entrar na vitória do Ressuscitado, ser iluminados pela sua luz, abrasados pelo seu calor. Através da celebração eucarística o Espírito Santo torna-nos partícipes da vida divina que é capaz de transfigurar todo o nosso ser mortal. E na sua passagem da morte para a vida, do tempo para a eternidade, o Senhor Jesus arrasta também a nós com Ele para fazer a Páscoa. Na Missa faz-se a Pascoa. Nós, na Missa, estamos com Jesus, morto e ressuscitado e Ele arrasta-nos em frente, para a vida eterna. Na Missa unimo-nos a Ele. Aliás, Cristo vive em nós e nós vivemos n’Ele: «Estou crucificado com Cristo — diz Paulo — , já não sou eu que vivo, mas é Cristo que vive em mim. A minha vida presente, na carne, eu a vivo na fé no Filho de Deus, que me amou e se entregou por mim» (Gl 2, 19-20). Paulo pensava desta forma.
Com efeito, o seu sangue liberta-nos da morte e do medo da morte. Liberta-nos não só do domínio da morte física, mas da morte espiritual que é o mal, o pecado, que se apodera de nós todas as vezes que somos vítimas do pecado nosso e alheio. E então a nossa vida é contaminada, perde beleza, perde significado, desflorece.
Ao contrário, Cristo restitui-nos a vida; Cristo é a plenitude da vida, e quando enfrentou a morte aniquilou-a para sempre: «ressuscitando dos mortos, venceu a morte e renovou vida», confessa a Igreja celebrando a Eucaristia (Oração eucarística IV). A Páscoa de Cristo é a vitória definitiva sobre a morte, porque Ele transformou a sua morte em ato supremo de amor. Morreu por amor! E na Eucaristia, Ele quer comunicar-nos este seu amor pascal, vitorioso. Se o recebermos com fé, também nós podemos amar verdadeiramente a Deus e ao próximo, podemos amar como Ele nos amou, oferecendo a vida.
Se o amor de Cristo estiver em mim, posso doar-me plenamente ao outro, na certeza interior que mesmo se o outro me ferir eu não morrerei; caso contrário, teria que me defender. Os mártires ofereceram a própria vida devido a esta certeza da vitória de Cristo sobre a morte. Só se experimentarmos este poder de Cristo, o poder do seu amor, seremos realmente livres de nos doarmos sem medo. É este o significado da Missa: entrar nesta paixão, morte, ressurreição, ascensão de Jesus; quando vamos à Missa é como se fôssemos ao calvário, a mesma coisa. Mas pensai: no momento da Missa vamos ao calvário — usemos a imaginação — e sabemos que aquele homem ali é Jesus. Mas, será que nos permitiríamos conversar, tirar fotografias, dar um pouco de espetáculo? Não! Porque é Jesus! Certamente estaríamos em silêncio, no pranto e também na alegria de sermos salvos. Quando entramos na Igreja para celebrar a Missa pensemos nisto: entro no calvário, onde Jesus oferece a sua vida por mim. E assim desaparece o espetáculo, desaparecem as tagarelices, os comentários e estas coisas que nos afastam de algo tão bonito que é a Missa, o triunfo de Jesus.
Penso que agora é mais claro que a Páscoa se torna presente e ativa todas as vezes que celebramos a Missa, ou seja, o sentido do memorial. A participação na Eucaristia faz-nos entrar no mistério pascal de Cristo, concedendo-nos a oportunidade de passar com Ele da morte para a vida, ou seja, no calvário. A Missa significa repercorrer o calvário, não é um espetáculo.
Papa Francisco
Catequese na Audiência Geral 22.11.2017
Página 11 de 15