“Nesta era de tanta interatividade, cada rosto feliz
esconde um deserto no recôndito da alma”
(Francisco Galvão, do livro “O Cultivo Espiritual em tempos de conectividade”, Paulus, 2018)
Vivemos em uma sociedade cada vez mais midiatizada e conectada. Além da agitação e da pressa, o nosso cotidiano é atravessado por inúmeras conexões. O espaço para o silêncio e a pausa está cada vez mais escasso. Aliás, nunca estivemos tão conectados uns com os outros, mas, ao mesmo tempo, tão distantes de nossa interioridade como nos dias atuais.
De alguma forma, estamos sempre sendo expulsos pela pressa, embora nem sempre saibamos, ao certo, para onde estamos indo. Vivemos sempre ocupados e atarefados, embora nem sempre encontremos sentido naquilo que realizamos. Como dizia Henri Nouwen, um dos meus autores espirituais preferidos, “é raro um momento em que não tenhamos o que fazer; movemo-nos pela vida de um modo tão aturdido, que nem ao menos temos calma e sossego para imaginar se vale a pena pensar, dizer ou fazer as coisas que pensamos, dizemos ou fazemos”.
Catequistas, professores, padres, freiras... ateus ou agnósticos. Todos, de um modo ou de outro, carecem de transcendência e disciplina espiritual para encontrar sentido e plenitude. O cultivo espiritual é o que nos possibilita ser inteiros em nossos sonhos e em nossas relações. Quanto mais distantes de nosso eu verdadeiro, mais fragmentados serão nossos encontros e experiências. Precisamos reencontrar o caminho de volta à nossa morada interior. Caso contrário, continuaremos reféns de nossos apegos, angústias e das falsas expectativas em relação a Deus e as pessoas.
Sem um pouco de silêncio e recolhimento, a nossa própria existência continuará vazia de significado. Podemos até ser competentes naquilo que fazemos e, inclusive, ser reconhecidos pelo nosso trabalho, mas, se não fizermos as pazes com a nossa solidão mais profundo, nenhum elogio ou afeto será capaz de saciar a nossa sede de infinito.
O catequista é chamado a uma criatividade fecunda e contínua. Para isto, ele deve está sempre ligado à Videira, através da oração e da intimidade. Caso contrário, o seu “ser criativo” não passará de um sino vazio, que poderá fazer muito barulho, porém incapaz de tocar os corações e direcioná-los à morada do verdadeiro Amor.
Estar conectado é importante e, em certas circunstâncias, até inevitável, mas, não podemos jamais esquecer-nos de cuidar de nosso espírito. É ele quem dita as regras de nossa vida e nos conecta àquela Voz interior que, silenciosamente, nos aponta o caminho da verdadeira felicidade.
FRANCISCO GALVÃO, religioso Paulino, mestrando em comunicação social pela PUC Minas e autor do livro “O Cultivo Espiritual em tempos de conectividade”, lançamento Editora Paulus.
Nesta semana, com grande alegria, estou em Belo Horizonte para conduzir a disciplina de Pastoral na era digital do curso de Especialização “Pastoral numa igreja em saída”, da FAJE. Acredito que vale a pena fazermos uma breve reflexão sobre este tema que abrange também a catequese. Pastoral, explicando de maneira simples, é a ação da Igreja no mundo que dá continuidade à ação e missão de Jesus Cristo, em vista do Reino de Deus. A catequese é uma dessas iniciativas do povo de Deus com o objetivo último de evangelizar. Entretanto, antes de agir, é preciso ser, entender o que está acontecendo na realidade contemporânea, renovar e reconstruir nossa mentalidade e visão de mundo para uma ação mais efetiva, que diga algo de valor e toque a vida das pessoas. Como Bento XVI ensina: “O fazer é cego sem o saber, e o saber é cego sem o amor”.
O segredo para um agir pastoral mais efetivo está na vivência autêntica e equilibrada destes três substantivos: o fazer, o saber e o amor. Já dizia São Tiago: “A fé sem obras é morta” (Tg 2, 20). São João Evangelista também advertia: “Quem não ama, não conhece a Deus, porque Deus é amor” (I Jo 4, 8). E ainda: “A vida se manifestou nós a vimos e a testemunhamos” (I Jo 1, 2). O agente de pastoral deve viver e encarar a realidade com os pés no chão e de preferência com os pés em movimento. Nossa evangelização não pode ser movida apenas por impulsos e moções espirituais. É preciso realizar um diagnóstico criterioso da realidade, sair do território paroquial, ver com os próprios as cruzes e alegrias cotidianas.
Nesse sentido, nossa espiritualidade deve ser encarnada nas nossas ações, como expressa Teilhard de Chardin na obra “Hino do Universo”: “Senhor, mais uma vez nestas estepes da Ásia não tenho pão, nem vinho, nem altar, então [...] vos oferecerei, eu, o vosso sacerdote e sobre o altar da terra inteira, o trabalho e o sofrimento do mundo”. Deus se manifesta no cosmos, na realidade humana em todos os níveis e esferas globais, sociais e pessoais. Destaca-se, assim, a importância do método “ver, julgar e agir”, contemplado no método ciberteológico de Antonio Spadaro: “experiência, reflexão, ação e avaliação”. É importante esse acréscimo, avaliar nossas ações.
Aprendi com uma professora da Escola de Humanidades da PUCRS, Leda Lísia Franciosi Portal, que o ser pessoa vem antes de ser professor e que aquilo que nós somos e que foi nos constituindo ao longo da vida vai nos dizer que tipo de professor nós somos. Este é um ensinamento que vale para os agentes de pastoral, catequistas, padres, religiosos, leigos, pais, mães, todo o povo de Deus, todas as funções exercidas na sociedade. Isso significa que antes de querermos formar alguém precisamos ser formados, antes de querer curar alguém, precisamos ser curados, antes de querer evangelizar alguém, precisamos ser evangelizados. Jesus fez várias correções fraternas nesse sentido: “médico, cura-te a ti mesmo” (Lc 4, 23) e ainda “nem todo aquele que me diz: ‘Senhor, Senhor!’, entrará no Reino dos Céus” (Mt 7, 21). Isso não quer dizer que precisamos estar prontos e termos certeza de tudo para podermos fazer alguma coisa pelos outros e pelo mundo, pois se não, nunca faremos nada. Na verdade, significa termos a humildade de reconhecer que estamos partilhando dessa mesma busca por completude e comunhão com Deus.
A era digital que se caracteriza por uma superexposição da vida, ou melhor, por uma vida hipercomunicativa, exige autenticidade, transparência e testemunho pessoal muito maiores. O evangelizador atual não pode falar da boca para fora, precisa professar somente aquilo que realmente vive e buscar viver aquilo que realmente crê. Portanto, não se pode passar uma imagem utópica de uma vida perfeita que, de tão perfeita, chega a parecer desumana e artificial, se não, a vida do evangelizador passará por falsa. Às vezes, o evangelizador precisa expor um pouco das suas dificuldades para mostrar que é humano, que erra, mas que busca verdadeiramente fazer o que Jesus nos ensinou. Mostrar que passamos pelas mesmas dificuldades, que compartilhamos os mesmos desafios torna as pessoas mais próximas. Temos que ter prudência também para não expor em demasia a nós e, principalmente, a outras pessoas, publicar somente aquilo que pode edificar e servir de exemplo de superação.
Pierre Lévy diz que a cultura expressa o desejo de construir laços sociais e que as novas formas de comunidade contemporâneas são fundadas no compartilhamento de realidades, saberes e interesses em comum, na aprendizagem cooperativa e processos abertos de colaboração. “O apetite para as comunidades virtuais encontra um ideal de relação humana desterritorializada, transversal, livre. As comunidades virtuais são os motores, os atores, a vida diversa e surpreendente do universal por contato” (LÉVY, 2000, p. 130). Então, quem é meu próximo hoje? Àquele que eu permito que se aproxime, que tenha parte comigo, independente do espaço e do tempo em que habita. Por isso, o testemunho e as narrativas de histórias reais são hipervalorizados na sociedade em rede.
Pastoral na era digital seria esse esforço por rever nosso mundo, nossa fé e nossas relações sob o prisma deste novo contexto e nova cultura digital que permeia o nosso dia-a-dia e que afeta profundamente nosso ser, pensar e agir. Partindo da experiência pessoal da fé e da rede, propõe-se fazer a experiência da fé na rede e o que a experiência relacional on-line implica na vida de fé como um todo, inclusive off-line. O passo seguinte é refletir sobre as experiências vividas e avaliar nossas ações evangelizadoras.
Só será possível entender a fé de forma plena quando se compreender as questões que o mundo coloca para a própria fé. Dessas novas perspectivas, surge a necessidade de um novo campo teológico que dê conta de tal estudo, a ciberteologia, a qual nós já mencionamos em posts anteriores. Pensar como mostrar às gerações digitais a importância da fé em um certo homem chamado Jesus, que nós cristãos acreditamos ser Deus, que viveu há dois mil anos atrás numa época, cultura e mesmo religião tão diferente da que vivemos, é o desafio que está de fronte a todo agente de pastoral, catequista e evangelizador hoje.
Por trás de nossas ações pastorais, além do nosso ser pessoal, está também nossa concepção de Igreja. Sobre isso, vamos conjeturar juntos no próximo post, aguardem...
Aline Amaro da Silva
Jornalista e especialista em Ciberteologia e Cibergraça
Julho 2017
Referências:
LÉVY, Pierre. Cibercultura. 2.ed. São Paulo: Editora 34, 2000.
TEILHARD DE CHARDIN, Pierre. Hino do Universo. São Paulo: Paulus, 1994.
Olá catequistas!
Ao aproximar-me do Tempo Pascal, recordei de uma postagem que fiz há alguns anos inspirada por um retiro de Semana Santa. Já ouvimos de pensadores de áreas distintas do conhecimento frases do tipo: Somos aquilo que lemos (educação). Somos aquilo que comemos (biologia). Somos aquilo que vemos e falamos (comunicação). Isso nos faz perceber que somos constituídos também por aquilo que postamos, curtimos e compartilhamos.
Trazendo essas afirmações para a realidade da fé, podemos constatar que: Se nos habituamos a ler diariamente a Palavra de Deus, vamos nos transformando naquilo que lemos, no Verbo de Deus. Quanto mais comemos do Pão da Palavra e do Pão Eucarístico participando da missa, vamos nos transformando naquilo que nos alimenta, Jesus. Na medida que vamos contemplando Jesus seja na adoração eucarística, seja na vida dos pobres e necessitados, vamos nos transfigurando à imagem de Cristo. “A boca fala do que o coração está cheio” (Mt 12,34). Se falamos de Deus é sinal de que ele habita em nós, significa que tivemos uma experiência profunda como a da Samaritana que não se conteve e teve que testemunhar o seu encontro com Jesus. Da mesma forma as redes sociais vão tecendo e expondo quem nós somos, o que gostamos, as ideias que compartilhamos, a quem seguimos e com quem nos relacionamos.
Ser cristão é ser um novo Cristo. Aproveitemos o tempo oportuno da Ressurreição do Senhor para nos perguntar: Será que hoje eu, você, poderíamos afirmar como São Paulo – “Já não sou eu que vivo, mas é Cristo que vive em mim. Minha vida presente na carne, vivo-a pela fé no Filho de Deus, que me amou e se entregou a si mesmo por mim” (Gal 2,20)? Mas, de fato, o que estamos vendo, lendo, falando e comunicando aos outros? Será que somos sinais da presença viva de Jesus hoje no mundo? A partir dessa reflexão, podemos constatar que Deus pode habitar o ciberespaço através de nós. Quando Cristo vive em mim e eu estou presente na rede, o Verbo se faz bit (parafraseando o título do livro de Moisés Sbardelotto) e habita entre os “nós” da rede que são as pessoas que dela participam.
Se o meu perfil deve transparecer o rosto de Cristo, então, o que postar nas redes sociais? No livro “Conectados para o Encontro”, simples e acessível, fruto da experiência da fé e da rede, Vinicius Farias fala em 10 passos para evangelizar nas redes sociais, mas vou destacar apenas aquilo que é essencial.
O primeiro passo e o mais importante é buscar a fonte das boas postagens. Em qualquer ação evangelizadora, frente de missão, atividade e decisão na nossa vida é preciso ser sustentada por uma intimidade com Deus através da meditação da Palavra e oração. Essa é a fonte da autenticidade de uma vida em Cristo, fonte do sucesso de uma postagem, pois, para causar efeito é necessário ser você mesmo. Como diz Bento XVI: “as pessoas que nelas [nas redes] participam devem esforçar-se por serem autênticas, porque nestes espaços não se partilham apenas ideias e informações, mas em última instância a pessoa comunica-se a si mesma” (Mensagem para o 47º Dia Mundial das Comunicações Sociais, 2013).
Tendo essa base sólida da experiência de Deus, vamos aproveitar algumas dicas do marketing digital para constituirmos um comportamento adequado no ciberespaço, isso serve tanto para evangelizadores quanto para catequistas. Aliás, todo o catequista deve imbuir-se da missão de ser um evangelizador digital!
Construa sua presença digital:
- Foto de perfil: imagem de boa qualidade, que represente você e seja facilmente reconhecível
- Foto de capa: é o que mais chama a atenção no seu perfil, oportunidade de divulgar algo que é importante para você
- Defina seu tom de voz, isso determina sua imagem e reputação
- Planeje seu conteúdo
- Use bons títulos e sempre coloque imagens. Conteúdo visual recebe 37% mais curtidas e engajamento do que posts sem imagens.
- Avalie seu resultado e inspire-se em ações de sucesso
- Erros: não responder mensagens, focar só em promover seu “peixe”.
Por que você posta? Objetivos comuns do evangelizador nas redes sociais:
- Fazer um convite, especialmente para quem está longe.
- Partilhar acontecimentos da vida bons ou ruins.
- Expressar opiniões e sentimentos.
- Criar, fortalecer e expandir vínculos.
- Desafio: Expressar e refletir o próprio Deus.
Evite postar:
- Correntes: a maioria das correntes tem um fundo de superstição misturada com mensagens cristãs. O mundo não vai acabar senão compartilharmos...
- “Defesa” da fé: não discuta religião com ninguém, principalmente não ataque outras crenças para defender a sua, lembre-se que “a Igreja cresce por atração e não por proselitismo” (vários papas já disseram isso).
Sinta-se livre para postar:
- Histórias da vida e testemunho: “testemunhar com coerência, no próprio perfil digital e no modo de comunicar escolhas, preferências, opiniões que sejam profundamente coerentes com o Evangelho, mesmo quando não se fale dele de forma explícita” (Spadaro, 2016, p. 37-38).
- Acontecimentos que demonstrem fé, amor, amizade, família.
- “Vede como se amam”: Pelo exemplo, deve-se suscitar o desejo de uma vida autêntica em Deus, alegria sadia e espontânea.
Na hora de escrever o post:
- Use corretamente a gramática: a linguagem da internet é sintética e precisa.
- Tenha bom senso: o que postamos não é privado, torna-se público, mundial.
- NÃO USE CAIXA ALTA NO TEXTO. Parece que você está gritando e bravo, dando um tom histérico, ofensivo ou odioso.
- Cuide-se com a exposição pessoal e a polêmica. Tenha discernimento!
- Não poste qualquer coisa, não queira opinar sobre tudo que acontece.
- Faça textos curtos e diretos: “[...] as pessoas que usam as redes sociais treinam seus olhos para achar informações relevantes de forma rápida e intuitiva”.
Concluindo:
Seja criativo e espontâneo. Poste aquilo que crês, vive aquilo que postas, pois o mundo atual anseia por autenticidade e coerência. A encarnação é o máximo da proximidade, portanto, Cristo quer habitar, tornar-se próximo também no ciberespaço. Isso se dá através da nossa própria vida e presença digital. Para postar coisas que acontecem no dia a dia, é preciso um olhar espiritual que percebe os sinais de Deus nos pequenos acontecimentos, uma postura de abertura, reconhecimento e reflexão para o novo de Deus. Devemos “aprender a olhar como Cristo, a falar como Cristo e a agir como Cristo” (FARIAS, 2015, p. 49). Com esse olhar, coisas aparentemente insignificantes, tornam-se manifestações da glória de Deus. Através da fotografia podemos captar criativamente cenas do cotidiano. Se fizer citações de passagens bíblicas, santos ou pensadores, comente-as, explique porque isso foi importante para você, partilhe o que isso mudou em sua vida. Precisamos mostrar que não apenas dizemos, mas comunicamos uma vivência.
Desejo a todos os catequistas uma vida nova em Cristo! Feliz Páscoa! Feliz Ressurreição!
Aline Amaro da Silva
Referências:
BENTO XVI. Redes sociais: portais de verdade e de fé; novos espaços de evangelização. Mensagem para o 47º Dia Mundial das Comunicações Sociais. Roma, 2013.
FARIAS, Vinicius. Conectados para o Encontro. São Paulo: Paulus, 2015.
SPADARO, Antonio. Quando a fé se torna social. São Paulo: Paulus, 2016.
Falar de catequese na era digital sem falar de ciberteologia é como querer refletir sobre a internet sem estudar a cibercultura. A ciberteologia é o campo teológico que dá base à reflexão sobre os impactos da rede no nosso modo de viver, ensinar e comunicar a fé, isto é, nos dá os fundamentos para pensarmos uma catequese que dialogue, inculture e construa relações com a geração net. Nesse artigo, vamos tentar reconstruir os passos que levaram à concepção da ciberteologia.
Antes de se constituir o conceito de ciberteologia que eu adotei nas minhas pesquisas, que é a definição formulada por Pe. Antonio Spadaro em seu livro Ciberteologia de 2012, o termo já havia sido utilizado para outros fins. Por exemplo, designava qualquer conteúdo teológico publicado na rede, ou ainda denominava uma teologia da comunicação digital. Entretanto, acredito que a ciberteologia é muito mais ampla e tem muito mais a contribuir com nossa vida pessoal e comunitária.
Em primeiro lugar, devemos reconhecer que a tecnologia digital, em especial, a internet móvel, transformou todo o ambiente ao nosso redor (casa, ônibus, faculdade, empresa), bem como nossas relações em todos os níveis (família, amigos, colegas de estudo e de trabalho). Sinais dos tempos são os eventos que caracterizam uma época e servem de chave para interpretarmos a ação de Deus na história. Percebe-se aqui como a rede se encaixa na definição criada no Concílio Vaticano II de sinais dos tempos, pois o período em que vivemos foi intitulado de era digital.
A partir disso, podemos entender a rede não mais como mero instrumento, mas como um ambiente social de onde podemos vislumbrar nossa realidade de um ângulo privilegiado. Mais ainda, como um lugar teológico do qual possamos partir para uma profunda reflexão sobre a vivência cristã na era digital. Portanto, a ciberteologia encontra na internet o seu lugar teológico do qual produz seu saber teológico.
O Concílio Vaticano II já afirmava que a tecnologia muda nossa maneira de pensar (IGREJA CATÓLICA, 1965, n. 5) e podemos facilmente constatar isso, observando o comportamento dos jovens e crianças da geração net. Se a tecnologia digital modificou nossa forma de comunicar, viver e até mesmo pensar, será que não afetou também nosso modo de pensar e viver a fé? Se a teologia é definida classicamente como o pensamento, a reflexão, a inteligência da fé, será que a cultura digital não mudou o modo de fazer teologia? Dessas questões fundamentais, Pe. Antonio Spadaro elabora a ciberteologia: pensar a fé cristã nos tempos da rede.
Não existe ciberteologia sem percorrer duas estradas: a experiência da fé e a experiência da rede. Os passos metodológicos da ciberteologia são semelhantes ao ver, julgar e agir: experiência, reflexão, ação e avaliação. É muito importante este último item. Em nossa pastoral e na catequese às vezes esquecemos de avaliar a trajetória percorrida, perpetuando os mesmos erros e nos perguntando: Por que nossa evangelização não atinge as pessoas? Já perguntou a elas o que está errado?
A comunicação hoje é tão presente no nosso dia-a-dia através da tecnologia digital que se tornou elemento essencial na nossa vida. Dessa forma, a ciberteologia não deve ser considerada uma teologia da comunicação, pois não reflete sobre a comunicação em si, mas aborda a vida hipercomunicativa que experimentamos cotidianamente. A missão da ciberteologia é pensar a fé nos tempos de internet para vivermos de forma sadia e santa nossas relações num mundo que incorporou a tecnologia digital em todas as suas esferas.
Se você quiser saber mais sobre ciberteologia, acesse outro artigo que fiz sobre o assunto: https://alineamarodasilva.wordpress.com/2016/10/04/o-que-e-ciberteologia/
Aline Amaro da Silva
Jornalista, pesquisa o tema ciberteologia, cibergraça. Assessora catequistas com o tema da catequese na era digital
Ainda seguindo a reflexão sobre o tema gerações, vamos agora apresentar algumas características das gerações que estão presentes no Brasil neste momento convivendo e se influenciando mutuamente. A ideia também é perceber onde eu e você nos encaixamos. Claro que alguns atributos próprios de uma geração podem não fazer parte dos nossos traços de personalidade. Isso pode ocorrer devido a fatores como maior ou menor contato com a tecnologia, ambiente social, político e econômico que se vive, entre outros. Então, vamos lá! Gerações: qual é a sua?
Belle Époque ou Tradicional é a geração dos nossos avós ou bisavós, pode ser também a geração do seu pároco ou fundador da sua comunidade. Nasceram entre 1920 e 1940, viveram no período da Segunda Guerra Mundial, desenvolveram, assim, as virtudes da compaixão, solidariedade, disciplina, dedicação ao trabalho, respeito às autoridades e regras, sacrifício em prol de objetivos e ideais.
Devido ao cenário positivo do pós-guerra, houve um aumento significativo na natalidade brasileira entre os anos 1941 e 1960, por isso, essa geração ficou conhecida como Baby Boomers. Os valores que a família e sociedade exigiam dessa geração eram disciplina, ordem e obediência. Toda essa rigidez teve por consequência um comportamento rebelde e contestador, rompendo padrões e fazendo surgir a cultura jovem e o rock and roll. Neste período chegou a televisão no Brasil. Os Baby Boomers são ainda otimistas e possuem valores pessoais.
Já a Geração X, gerada entre 1961 a 1980, pensa em qualidade de vida, pois possuem maior longevidade. Nesta época ocorreu a popularização das mídias de massa, especialmente a televisão modificou a rotina das famílias e assumiu um papel importante na educação dos filhos. Os pais dessa geração são mais abertos e superprotetores, deram mais liberdade aos filhos.
A Geração Y, jovens nascidos de 1980 a 1999, é marcada pela criação da internet e da cultura digital que causou uma verdadeira revolução na comunicação e nas relações no mundo todo. A geração net cresceu em uma economia relativamente estável. Sua vida é caracterizada pela multimídia, multitarefas, dinamismo, urgência, ansiedade, imediatismo e tempo real. Seus pais são extremamente dedicados à carreira. Dessa forma, criaram um mecanismo de compensação e uma relação menos hierárquica, enchendo a agenda dos filhos de atividades e satisfazendo os desejos deles.
Para a juventude atual, Geração Z, nascidos de 2000 até 2010, a tecnologia é algo tão natural para eles que virou uma palavra inexistente no seu vocabulário. Na geração Z se acentuam as características da Y como o dinamismo, acrescentando mais maturidade e menos ansiedade. Ainda existe a Geração Alfa, que são as crianças nascidas a partir de 2010. Não se sabe muito ainda sobre elas, até porque não chegaram à juventude. O que será delas? Serão eternamente conectadas?
E você catequista, conseguiu se identificar com alguma geração? Percebeu os desafios e possibilidades que se tem para criar uma boa relação entre as gerações? Tem coisas que mudam e tem coisas que permanecem. Nos tempos digitais, é preciso buscar a conexão entre as pessoas de diferentes fases da vida, criar novos e autênticos laços, valorizando o que cada um tem para oferecer. Olhar o outro como mistério e presente de Deus.
Nota: Aproveito para enviar um abraço aos catequistas que participaram do Curso de Pedagogia Catequética do Regional Norte 2 da CNBB, ocorrido entre os dias 09 a 24 de julho de 2016 em Castanhal, Pará. Que essa troca de experiência on-line e off-line possa enriquecer a catequese de todo o Brasil.
Aline Amaro da Silva
Jornalista, pesquisa o tema ciberteologia, cibergraça. Assessora catequistas com o tema da catequese na era digital
Desde que o mundo é mundo, pessoas de idades e culturas diferentes têm dificuldade para se entenderem e dialogarem. Só que agora, na era digital, o choque cultural é tamanho que se fala até em uma nova humanidade. No texto anterior se introduziu a reflexão sobre a Geração Net. Mas o que significa gerações?
As ciências sociais denominaram geração o estudo que traça o perfil da juventude de uma época, pois é nesse período que ocorrem as grandes decisões de impacto pessoal e social. Inseridas no mesmo contexto, as gerações são formadas por pessoas que sofrem a influência dos mesmos fatores sócio-políticos, econômicos e culturais. Portanto, uma nova geração surge no momento em que algo marcante acontece, produzindo o antes e o depois deste evento.
Não existe um padrão de tempo entre uma geração e outra, podem levar séculos ou uma única década. Embora, nos últimos anos, esse espaço de tempo esteja se tornando cada vez menor. Mesmo entre nações as datas de início de uma geração podem variar, pois as novidades costumam surgir antes em países mais desenvolvidos.
Para entender isso, vamos analisar as nossas famílias. Antes, bisavôs e bisnetos compartilhavam gostos, hábitos, ofícios, ideias, assuntos em comum, ou seja, tinham um modo de ser, de viver e de ver o mundo semelhantes. Hoje, pais e filhos não sabem mais como começar um diálogo, não acham mais seus pontos em comum, pois suas experiências e perspectivas são completamente diferentes.
O desafio que enfrentamos não é apenas entre pais e filhos. Observando a realidade brasileira, existem cinco gerações com representatividade na sociedade convivendo, se influenciando e, em muitos casos, se desentendendo. Isso ocorre, de acordo com o Sidney Oliveira (OLIVEIRA, Sidney. Geração Y: O Nascimento de uma nova geração de líderes. São Paulo: Ed. Integrare. 2010), porque existem diferenças fundamentais entre elas que afetam os seus relacionamentos causando omissão e apatia nas gerações mais experientes e profunda lacuna na formação das novas.
Então, como superar esses conflitos e abismos entre as gerações? Tem coisas que passam e tem coisas que não passam. O amor é uma dessas coisas que “jamais passará” (I Cor 13,8). Copio uma citação que está na obra do Oliveira que expressa com perfeição atitudes que não podemos esquecer:
“Frequentemente subestimamos o poder de um toque, um sorriso, uma palavra gentil, um ouvido à disposição, um elogio sincero, ou o menor ato de atenção, tudo aquilo que tem o potencial para mudar a vida ao nosso redor” (Leo Buscaglia).
Veja a importância dessa reflexão não só para você catequista, mas para as famílias e todos os núcleos da sociedade. Esse livro do Sidney Oliveira, por exemplo, é direcionado ao setor empresarial, pois a forma como a juventude digital trabalha e produz é muito diferente das anteriores. Aí você imagina o choque cultural. Fica mais uma dica de livro para aprofundar o tema.
Palavras do Papa Francisco como “não basta o diálogo, é necessário a empatia” e também “não deixem que nos roubem a ternura”, nos dão pistas para encontrar o caminho. Veja este trecho da mensagem papal para o Dia Mundial das Comunicações 2016:
“O encontro entre a comunicação e a misericórdia é fecundo na medida em que gerar uma proximidade que cuida, conforta, cura, acompanha e faz festa. Num mundo dividido, fragmentado, polarizado, comunicar com misericórdia significa contribuir para a boa, livre e solidária proximidade entre os filhos de Deus e irmãos em humanidade”.
Não podemos nos afastar porque somos diferentes. É preciso se colocar no lugar do outro e deixar-se tocar por outras realidades, buscando essa empatia que Francisco recorda e dá exemplo. É na proximidade e na construção de um relacionamento fecundo entre as gerações que está a chave para o equilíbrio nesta mudança de época e época de mudanças.
Aline Amaro da Silva
Jornalista, pesquisa o tema ciberteologia, cibergraça. Assessora catequistas com o tema da catequese na era digital
Geração Net, nativos digitais, nativos virtuais, Gerações Y, Z, Alfa, tantas designações para tratar daqueles que nasceram no meio ambiente digital. Os cidadãos desta nova ambiência que chamamos de ciberespaço são as crianças, os jovens e já os adultos de hoje. Os nativos digitais são os catequizandos de primeira eucaristia, crisma, bem como seus pais e padrinhos, portanto, o público-alvo de toda e qualquer catequese.
E você catequista, faz parte ou sabe alguma coisa sobre essa nova geração? Para poder educar na fé, ter um diálogo e relacionamento fecundo, é preciso conhecer a pessoa com quem desejamos partilhar a mensagem cristã. Por isso, vamos tratar aqui de algumas características básicas da geração net que podem ajudar você catequista a se aproximar dessa nova realidade.
Quem vai nos apresenta-los é o sociólogo francês Michel Serres que é apaixonado por essa galerinha. Em seu livro intitulado Polegarzinha ele traça o contexto do jovem global. Ele colocou este nome no feminino para salientar a capacidade dessa geração de comandar o smartphone com seus polegares e demonstrar o destaque das garotas dessa geração em todos os campos da sociedade. Eis algumas características da Polegarzinha:
- mora predominantemente no espaço urbano;
- polui menos, tem maior respeito ao meio ambiente;
- habita num mundo muito mais povoado;
- expectativa de vida: 80 anos;
- não passou por guerra ou fome, sofreu menos que seus antepassados.
- possuem uma vida mais sedentária e confortável, o que tornou seus corpos mais frágeis.
- permanecem mais tempo solteiros e sem filhos, por isso, pais e filhos não fazem mais parte da mesma geração.
- vive e estuda num ambiente multicultural.
Como foram educados pela TV ou computador, perderam a capacidade de espera. Este imediatismo os tonou ansiosos. Seja on-line ou off-line, não vivem mais o mesmo mundo, o mesmo tempo e a mesma história. Além disso, pesquisas mostram que a internet ativa áreas cerebrais diferentes das acionadas pelo livro e caderno. A linguagem mudou e com ela a maneira de pensar, se comunicar e se relacionar. Portanto, não tem mais a mesma cabeça e a mesma inteligência. Entretanto, para Serres as cabeças de hoje são mais bem constituídas do que cheias e este “vazio” deu espaço a um grau de inteligência mais elevado: a inteligência inventiva, a criatividade e originalidade.
Então, não só de defeitos e problemas vive essa geração. Na verdade, temos muito que aprender com essa galerinha digital. Isso foi apenas um início de conversa para percebermos a importância deste estudo. Não estamos apenas lidando com tecnologias e realidades novas, mas com pessoas novas cheias de riquezas e potencialidades, nossos catequizandos. Conhecê-los para poder orientá-los, ensiná-los e amá-los é um desafio para todas as áreas, em todos os lugares na era da cultura digital.
Aline Amaro da Silva
(Jornalista e especialista no tema Ciberteologia e Cibergraça)
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