ORAÇÃO A SANTA TERESINHA DO MENINO JESUS
Perdi o jeito de sofrer.
Ora essa.
Não sinto mais aquele gosto cabotino da tristeza.
Quero alegria!
Me dá alegria,Santa Teresa!
Santa Teresa não, Teresinha...Teresinha... Teresinha...
Teresinha do Menino Jesus.
Me dá alegria!
Me dá a força de acreditar de novo
No Pelo Sinal
Da Santa Cruz!
Me dá alegria!
Me dá alegria,Santa Teresa!...Santa Teresa não, Teresinha...
Teresinha do Menino Jesus.
Manoel Bandeira
Renuncio às palavras
e às explicações.
Ando pelos contornos,
onde todos os significados
são sutis, são mortais.
Não quero perder o momento
belo. Quero vivê-lo mais,
com a intensidade que exige a vida:
desgarramento e fulguração.
Então me corto ao meio e me solto
de mim:
a que se prende e a que voa,
a que vive e a que se inventa.
Duplo coração:
a que se contempla e a que nunca
se entende,
a que viaja sem saber se chega
- mas não desiste jamais.
["Rosto com dois perfis", Lya Luft]
"O certo é que um menino nasceu e partiu.
Deixou um recado para ser lido no cosmo infinito, no espelho da água, no silêncio da pedra, no percurso do vôo, no silencio das dúvidas.
Mas só quem olha com dois olhos pode decifrar.
A sua presença ficou no sopro do vento, no ruído do inseto, no canto da cigarra, na queda da chuva, na maré do mar, no rumor da cachoeira.
Mas só quem escuta com os dois ouvidos pode entender.
Nas palavras que trocam a guerra pela paz, o amargo pelo doce, o nunca pelo sempre, sua visita breve fica mais confirmada.
Mas ninguém contesta que há um “antes” e um “depois”, e que houve uma noite feliz".
Bartolomeu Campos Queirós
Todos os dias abrimos os olhos, mas não o suficiente
Vemos descontentes a imperfeição e a pedra
Olhamos com desgosto – em nós e nos outros –
o avesso e a costura
e não nos damos conta
que poder observar com amor o avesso
se torna preciosa aprendizagem de caminho
(e que esse caminho nos leva até ao presépio)
Pois aquilo, precisamente aquilo
que hoje identificares como pedra
Deus vem ensinar-te
a transformar em estrela
Pe. José Tolentino Mendonça
Tudo o que por Ti vi florescer de mim
Senhor da Vida
Toda essa alegria que espalhei e que senti
Trago hoje aqui
Todos estes frutos que aqui juntos vês
Senhor da Vida
Eu em cada um deles e em mim todos os Teus fiéis
Ponho a Teus pés
Consentiste que minha pessoa
Fosse da Esperança um Teu sinal
Uma prova de que a vida é boa
E de que a beleza vence o mal
Tudo o que se foi de mim mas não perdi
Senhor da Vida
Os que já chorei e os que ainda estão por vir
Oferto a Ti
Caetano Veloso
Ouça a canção Ofertório, na interpretação Caetano Veloso:
Preciso sonhar um sonho novo,
Preciso saber perder um velho sonho,
Preciso gerar um novo sonho
E crer nas sempre novas possibilidades
Que o que há de vir me oferece.
Preciso encontrar o que mereço em outro endereço,
E que seja logo, que seja breve.
Preciso daquela esperança de um dia após o outro
Que a travessia do tempo me concede.
Ó futuro, não me deserde!
Elisa Lucinda
Um dia apanhando goiabas com a menina,
ela baixou o galho e disse pro ar
- inconsciente de que me ensinava -
"goiaba é uma fruta abençoada".
Seu movimento e rosto iluminados
agitaram no ar poeira e Espírito:
O Reino é dentro de nós,
Deus nos habita.
Não há como escapar à fome da alegria!
Adélia Prado
Carrego seu coração comigo
Eu o carrego no meu coração
Nunca estou sem ele
Onde eu for, você vai, minha querida
Não temo o destino
Você é meu destino, meu doce
Não quero o mundo pois, beleza
Você é meu mundo, minha verdade
Eis o segredo que ninguem sabe
Aqui está a raiz da raiz
O broto do broto
E o céu do céu
De uma arvore chamada vida
Que cresce mais do que a alma pode esperar
Ou a mente pode esconder
E esse é o prodigio
Que mantem as estrelas a distancia
Carrego seu coração comigo
Eu o carrego no meu coração.
E. E. Cummings
Que teus olhos, Menino, ensinem largueza
e altura aos meus olhos
Que teus olhos curem os meus
da fadiga e dos seus filtros
Que teus olhos desimpeçam a visão
fragmentária, parcial e indecisa
Que teus olhos devolvam aos meus olhos
o vento azul da viagem e a sua alegria
Devolvam o real como anel aberto
em vez dos círculos obsidiantes e fechados
Devolvam o aberto como imagem
e programa
Que teus olhos, Menino, ensinem aos meus
o seu natal
José Tolentino Mendonça
Deus que vens de Deus,
horizonte da nossa linguagem e nosso desejo
Deus que anunciamos
na espessura do que em nós é riso
e choro, ao mesmo tempo infiguráveis
que descubramos no corpo dos outros
os traços do bem que procuramos e perdemos
que a nossa vida te reconheça
pela maneira como por ti se vê reconhecida
na teia do que passa e permanece,
tu que és aquele que há-de-vir;
e Deus conosco.
José Augusto Mourão
In: O nome e a forma. Poesia reunida. Ed. Pedra Angular
UM POEMA DE ADVENTO
O advento chega com o cair da folha
e clama:
levantai a cabeça, vigiai!
O advento chega com o abatimento,
a decepção
a desistência
e reclama:
erguei-vos do chão, a alegria é o bordão
que reverdece o vosso andar
O advento chega como o sono
que reclama
a vitória sobre o medo da noite
a entreaberta janela
por que surge o dia
O advento chega pela noite dentro
a erguer do chão
os dias obscuros que até
os ulmeiros escurecem
O advento chega
para reacender a fogueira morta
dos nossos desejos
Com o Messias chega
para a terraplanagem chama
e os recomeços
(José Augusto Mourão OP)
"[...] a morte só pode ter um sentido e significado se a vida também os tiver; quando alguém sabe “para quê e para quem vive”, realizando sua original missão, pode morrer em paz. Aqueles que vivem intensamente enfrentam com grande serenidade seu envelhecimento e a proximidade da morte, vendo nela mais uma etapa no processo normal de seu amadurecimento e de sua realização. Aquele(a) que é conscientes de ter vivido por alguma causa, de ter levado uma vida plena, pode dar sentido e significado espontâneos ao último ato de sua existência, a morte. É o modo como alguém vive que qualifica a morte. Há mortes que, para além da inevitável dor que causam aos familiares e amigos, provocam paz, agradecimento, vontade de viver seriamente, de se levantar da superficialidade e da mediocridade".
(Adroaldo Palaoro, sj)
(…)
Escrevo para celebrar o Teu Nome, ao desabrigo dos nomes. (…) Creio, sim, que o nome que melhor Te convém continua a ser este: Amor. Ou este outro: Misericórdia. Nunca Te vi, Deus abscondítus, apenas Te pressinto no olhar aflito ou alegre dos passantes. Apenas Te pressinto na palavra, que é um vivo. Ou na pujança que move o mundo. Sim, o olhar transporta. O sentido é transpositivo. A palavra é legião: sei que não falo no deserto, alucinado e estéril. O magnificat é a forma mais jubilosa de ver o mundo como um milagre, de assistir à primavera, aos nascimentos e até às despedidas. Creio que Tu és o Verbo que se fez carne em Jesus e que habitou entre nós (Jo 1, 14). Porque não sei falar (escrever-Te) só queria mostrar as feridas das palavras varridas pela areia dos dias com que Te escrevo. Espero que, chegando à Páscoa, chegarei à palavra plena. Vou deixar de querer ver-Te: o Teu olhar me basta. Para os amantes, escrever foi sempre dizer: "Vem"! Que outra coisa poderia eu querer, escrevendo-Te?
[Fragmento do último escrito de Frei José Augusto Mourão, OP, o poeta litúrgico da “alegria triste”]
Ilustração: Sebastião Salgado
Viver é
Oferecer-se
Viver é ter aberto o coração
dia e noite e oferecê-lo
aos mendigos do amor,
da beleza e da esperança,
sem esperar nada em troca.
Como se oferece o vento
às folhas que se desprendem
das árvores,
balançando-as
até deitá-las no chão.
Como se oferece a árvore
ao pouso brando das garças
e ao espelho azul do lago.
Como se oferece o lago
aos olhos enternecidos
do casal de namorados.
Como se oferece o néctar
das flores ao beija-flor.
Como se oferece a flor
do campo aos olhos pasmados,
ao sorriso, às mãos minúsculas
e trêmulas dos in-fantes.
Como se oferece a terra
ao abraço silencioso
e fecundante da noite.
Basta abrir o coração
para exorcizar a morte.
Pe. Álvaro Barreiro sj
In: Vislumbres
Adélia Prado
Não sei quantas vezes chorei
a boneca de papelão
que se desfez na água
quando lhe dei um banho.
Eu não sabia que podem ser tão breves
as coisas que abrigamos no próprio coração.
Graça Pires
Meu Deus, não sou muito forte,
não tenho muito além de uma certa fé.
Preciso agora da tua mão sobre a minha cabeça.
Que eu não perca a capacidade de amar, de ver, de sentir.
Que eu continue alerta.
Que, se necessário,
eu possa ter novamente o impulso do voo no momento exato.
Que eu não me perca,
que eu não me fira,
que não me firam,
que eu não fira ninguém.
Livra-me dos poços e dos becos de mim, Senhor.
Que meus olhos saibam continuar se alargando sempre.
Caio Fernando Abreu
Venha comigo
Para o campo de girassóis.
Suas faces são discos brunidos,
suas colunas secas
rangem como mastros de navio,
suas folhas verdes,
tão pesadas e tantas,
preenchem o dia com
os açúcares pegajosos do sol.
Venha comigo
visitar os girassóis,
eles são tímidos
mas querem ser amigos;
eles têm histórias maravilhosas
de quando eles eram jovens –
o tempo importante
os corvos perambulantes.
Não tenha medo
de fazer perguntas a eles!
Suas faces luminosas,
que seguem o sol,
ouvirão, e todas
aquelas fileiras de sementes -
cada uma uma nova vida!
esperança de uma amizade mais íntima;
cada um deles, embora em
uma multidão de muitos,
como um universo separado,
é solitário, o trabalho longo
de transformar suas vidas
em uma celebração
não é fácil. Venha
e vamos falar com aqueles rostos modestos,
as roupas simples de suas folhas,
as raízes ásperas na terra
queimando tão eretamente.
Mary Oliver
"Benditos os que conseguem se deixar em paz.
Os que não se cobram por não terem cumprido
suas resoluções, que não se culpam por terem
falhado, não se torturam por terem sido
contraditórios, não se punem por não terem
sido perfeitos.
Apenas fazem o melhor que podem.
Se é para ser mestre em alguma coisa, então
que sejamos mestres em nos libertar da
patrulha do pensamento.
De querer se adequar à sociedade e ao
mesmo tempo ser livre.''
Martha Medeiros
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