O simbólico no nosso dia a dia

Um simples cafezinho, oferecido com espírito de acolhida e generosidade, pode dizer infinitamente mais do que muitos discursos sobre a amizade. O bilhetinho do primeiro amor, guardado a sete chaves; a toalha bordada à mão pela avó; e aquela caneca de metal esmaltado, a preferida do papai, são exemplos de que as coisas falam à nossa mente e, principalmente, ao nosso coração. Elas tornam as pessoas e acontecimentos eternos para nós... 

Assim, o simbólico está presente em toda a nossa vida e nos dá condições de nos relacionarmos com o mundo e, especialmente, com as outras pessoas. Os símbolos são atalhos que facilitam a expressão de nossas idéias e sentimentos. Um símbolo tem o poder de transpor barreiras e evidenciar o que está escondido dentro de nós. O gesto de dar uma flor, por exemplo, pode ter sentidos múltiplos. Só quem oferece ou quem recebe a flor pode captar todo o significado desse gesto tão comum e, ao mesmo tempo, tão especial. 

O simbólico na vida religiosa

 

Na experiência religiosa e mística, os símbolos ocupam lugar especial. Para nós, cristãos, a cruz condensa em si a grandeza do amor de Cristo, que fez dela instrumento de nossa salvação. É muito fácil entender que a luz de uma vela nos comunica a certeza da presença de Deus, experimentada pela fé, ou a mensagem de que a vida sempre triunfa. A água evoca a bênção poderosa de Deus, que dá a vida, nos sacia de graças e renova a nossa existência com seu amor, e assim por diante. 

Os sinais sagrados permeiam nossa vida de fé e nos ajudam a expressá-la e aprofundá-la. A Catequese e a Liturgia, ao nos possibilitarem a experiência do sentido dos símbolos, vinculando-os ao Mistério Pascal de Cristo e do cristão, criam os ritos, organizam as celebrações e nos fazem perceber os constantes apelos de Deus em nosso cotidiano. 

O poder do símbolo

O poder do símbolo vai muito além da dimensão racional da pessoa. Ele a envolve por inteira: corpo, mente, espírito, afetos, emoções... Sentimentos e pensamentos que nem sempre são expressos convenientemente por palavras ou definições, o são rapidamente pela mediação simbólica. Muitas vezes se diz mais do que se queria dizer, ou o que nem se queria dizer, através de um símbolo ou de um gesto. O símbolo dispensa muitas interpretações impostas por conveniências. Fala por si mesmo e nisso reside toda a sua riqueza. Não é fechado no seu sentido, ainda que, numa determinada cultura ou grupo, seu significado possa ser partilhado e tornado comum. Querer explicar um símbolo é, de alguma maneira, empobrecê-lo. É bom deixar que ele fale por si mesmo. 

Um objeto, sinal ou gesto, é simbólico quando congrega as pessoas, faz com que comunguem idéias e sentimentos semelhantes e partilhem um chão comum de valores. Não nivela, mas aproxima e cria unidade. Não dispersa e nem confunde. Isso seria diabólico, e não simbólico. Diabólico, no sentido exato do termo, é tudo aquilo que dispersa, dificulta a unidade, afasta as pessoas. Como diz São João, o diabo é o pai da mentira( cf. Jo 8,44). 

Pe. Vanildo de Paiva

Filósofo e teólogo, autor do livro “Catequese e Liturgia: duas faces do mesmo mistério”