Introdução aos Sacramentos da iniciação do cristão – Batismo-Crisma

 

Todo sacramento parte da fé, supõe a fé, para a vivência da fé. Os primeiros passos do cristão são lugares simbólico-rituais do encontro com o autor da fé. Contraponto do Deus que faz (atua) de graça e em graça. O que Ele dá não é uma coisa, mas Ele mesmo. Criados-salvos – porque o ato criador é ao mesmo tempo salvador e vice-versa – por Ele (origem), Nele (mediação) e para Ele (finalidade). Eis o sentido daquilo que se realiza nos sacramentos. Essa experiência de criação-salvação, que é sempre dialógica, relacional, se curva à dinâmica da vida, apropriando-se, sobretudo, da nossa linguagem.

 


Os sacramentos da iniciação do cristão são exemplos programáticos do jeito que Deus tem de se autocomunicar a partir da humanidade (ver Fil 2,6-11). O Batismo-Crisma (é preciso conjugar Batismo-Crisma em sua unidade de sentido) é o primeiro degrau da nossa subida até Ele. Ao ouvir a Palavra de amor, que é Ele mesmo (Jo 1,1), nos sentimos impulsionados a entrar no amor, somos atraídos pela força fascinante de Jesus (cf. Jr 20,7), aquele que passa e diz, VEM! (cf. Mt 9,9). Escutar “desde dentro” ( 1Sam 10), é a missão primordial da Igreja, que somos nós, Corpo de Cristo. “Embora sejamos muitos, formamos um só corpo em Cristo, e cada um de nós é membro um do outro” (Rom 12). Somos (Igreja) chamados a despertar os corações mortos (cf. Is 26,19; Ef 5,14), lavar a “culpa-inculpável” da não-fé, da não-relação (pecado original). Revelar a luz ao mundo com a Palavra de Salvação, com a Profissão da fé que acompanha o gesto da lavação ritual em nome da Trindade. Criaturas novas, recriadas no banho de amor de um Deus apaixonado, em Jesus, por meio do Espírito. Tudo o que foge disso é “pataquada”. É a primeira etapa da longa aventura de configuração ao Corpo de Cristo, ao Filho (cf. 1Jo 3,1s.), único caminho (cf. Jo 14,6) possível para a salvação entrar em nossa casa (cf. Lc 19,9-10).

 

Nesse esquema, a salvação não é algo exterior, caída do céu. Ela é dom, graça, e só é operada na medida em que somos “sugados”, seduzidos para dentro do amor, nos tornando capazes de responder (isso é a fé) também como dom. É também tarefa, entrega-de-si, porque convite para sair da não-relação e ingressar na casa da Palavra da Salvação, construída sob o alicerce do diálogo (dia, “através” + legein, “falar”). O que fazemos no rito do Batismo-Crisma é celebrar o passo radical da fé, que é, em suma, ENCONTRO. Saída do “em si” (o mesmo), que é fechamento radical ao diálogo (egocentrismo), para a “estima-de-si” (eu mesmo), lugar de liberdade do ser, daquele que, tendo-se, pode “se dar”. A acolhida-de-si, decisiva para qualquer encontro genuíno, é quem guiará o novo cristão a se deixar transformar (na eucaristia falaremos em transubstanciação) NELE.

 

No Batismo-Crisma esse encontro ganha formalidade, ritual, simplesmente porque precisamos de balizas, marcas, lugares para fazer memória e celebrar a fé. Mas isso não quer dizer que vivemos de formalismos. A vida é mais que o sacramento, mais que o rito e sua celebração. É o sacramento quem aponta para a vida. Antes do cerimonial é preciso que já tenha acontecido aquele encontro com Ele, mesmo porque só celebramos o que já tem significado expresso. A celebração engendra um futuro, nos faz entrar na rota da construção de uma narrativa, agora plenamente assumida pelos parceiros do encontro. Depois da festa devo continuar a encontrar com aquele que me assumiu, dando-me o nome de cristão. É de Exupéry, em o Pequeno Príncipe, uma das narrativas mais bonitas que conheço de um encontro gerador, porque genuíno.

 

“Se tu queres um amigo, cativa-me!

– Mas o que é preciso fazer? – perguntou o pequeno príncipe.

– É preciso ser paciente – respondeu a raposa. Tu te sentarás primeiro um pouco longe de mim, assim, na relva. Eu te olharei com o canto do olho e tu não dirás nada. A linguagem é uma fonte de mal-entendidos. Mas cada dia te sentarás um pouco mais perto... No dia seguinte o principezinho voltou.

Teria sido melhor voltares à mesma hora, disse a raposa. Se tu vens, por exemplo, às quatro da tarde, desde as três eu começarei a ser feliz. Quanto mais a hora for chegando, mais eu me sentirei feliz. Às quatro horas, então, estarei inquieta e agitada: descobrirei o preço da felicidade! Mas se tu vens a qualquer momento, nunca saberei a hora de preparar o coração… É preciso ritos.(www.cirac.org/VMF-principe-pt.htm)

 

Isso não tem “cheiro” de Batismo-Crisma? Se você ainda não está convencido, leia Mc 1,11. Ele nos busca até encontrar (cf. Lc. 15,4).

 

Rodrigo Ladeira Carvalho 

Mestrando em Teologia e professor do curso de Especialização em Teologia - Centro Loyola-BH

15.09.2012