Sacramento da Unção dos Enfermos: solidariedade da comunidade
A vida não é apenas uma sucessão monótona do tempo. Está cheia de momentos fortes e decisivos para toda a existência humana. Dentro desses momentos fortes, vamos destacar os limites vividos pelo ser humano: na dor, na doença e na velhice. Todos nós passamos pela prova de nossos limites e dores. Tudo, mesmo o sofrimento, pode transformar-se em momentos preciosos para o nosso crescimento e para nosso aperfeiçoamento humano.
O sacramento da unção dos Enfermos é sinal de presença de Deus, como conforto e esperança, nos momentos de dor no tempo da velhice e na hora da morte.
A ação salvadora de Cristo nos acompanha em todos os momentos da nossa vida, também na doença.
Desde o início, a Igreja continua os gestos de Jesus. Quantas vezes lemos no Evangelho que Jesus curava doentes (Cf. Mt 11,2-6; 14,34-36; 15,29-31). Jesus lutava contra a força do mal. Chama a atenção quantas vezes Jesus está cercado de doentes. Quando sabem que ele chegou a uma cidade ou aldeia, logo levam até ele os doentes. E Jesus cura a todos. É a vitória da vida sobre a morte e a doença. É um sinal do Reino de Deus.
O Reino de Deus está presente quando os homens vivem como irmãos, do jeito que Deus Pai manda. O doente muitas vezes é posto de lado, porque cansa cuidar dele. Ele precisa de tudo e não produz nada. Não trabalha, nem traz alegria para a gente. Então a tentação é deixá-lo de lado, ou considerá-lo um peso.
Mas só faz assim quem não se importa com o Reino de Deus. Pois para construir o Reino os mais importantes são os últimos, os insignificantes, os menores. Onde há desigualdade, não se vive como irmão. Para fazer aí uma vida de irmão, é preciso começar dando importância aos que são desprezados. Por isso cuidar do doente é um sinal da presença do Reino. E, se a gente mostra carinho e amor por ele, isso o reanima, mesmo que não o cure. Ajuda a que ele vença o desânimo que a doença traz.
Hoje em dia é ainda mais importante que a gente esteja do lado dos doentes, porque a sociedade não está do lado deles. Filas escandalosas, esperas pecaminosas nos hospitais e postos de saúde. Quando se faz alguma coisa para mudar a sociedade é preciso ficar de olho na situação dos doentes. Vencer a doença é um passo importante nos planos de uma sociedade justa.
Os cristãos sempre souberam olhar o exemplo de Jesus e recordaram que visitar e cuidar dos doentes é acolher o próprio Jesus (Cf. Mt 25,36-40). Na comunidade cristã verdadeira e unida, o doente sempre encontra um lugar de acolhida. Quando os doentes não podem ir ou ser levados à comunidade, a própria comunidade, com os seus líderes, é chamada para visitar o doente.
Era assim desde os tempos mais antigos: “Alguém dentre vocês está doente? Mande chamar os presbíteros da Igreja, para que orem sobre ele, ungindo-o com óleo em nome do Senhor. A oração da fé salvará o doente e o Senhor o reerguerá. E se tiver cometido pecados, estes lhe serão perdoados” (Tg 5,14-15). É o Sacramento da unção dos Enfermos que continua a ação salvadora de Jesus.
Todo sacramento festeja alguma coisa importante na vida do cristão. A unção dos enfermos parece que não pode ser uma festa muito alegre. Antigamente até se chamava “extrema unção” e, quando o padre chegava, era aquela choradeira, porque era certo que o doente ia morrer logo, logo. Mas é errado pensar assim.
Como todo sacramento a unção dos enfermos é festa da comunidade. Ela celebra não a doença (que não é coisa boa), e sim a vitória do cristão sobre a doença. É também esperança de que um dia se há de vencer todas as dificuldades humanas.
Será que a gente vence a doença, mesmo quando não cura? Vence, sim, pela força de Deus. Vence a doença, quando a aceita. Vence, quando não se deixa abater por ela. Quando oferece o sofrimento para a salvação do mundo e a construção do Reino. Quando briga por melhorar o tratamento do hospital e o respeito pelas pessoas. O doente é alguém importante na comunidade cristã, porque, vencendo a doença, colabora para que a comunidade cresça e seja melhor.
Tudo isso o padre diz na oração que faz enquanto aplica o óleo bento na testa e nas mãos do doente: “Por esta santa Unção e pela sua grande misericórdia, o Senhor venha em teu auxílio com a graça do Espírito Santo, para que liberto dos teus pecados, Ele te salve e, na sua bondade, te reanime”.
A comunidade reunida em torno do doente reza também por ele. É a oração da fé, diz São Tiago. A oração se expressa no símbolo da unção. Ela faz entender melhor a oração que se faz pelo doente.
E a oração da fé remove montanhas, até aquela do desânimo diante da doença. Pela força de Deus, com a graça do Espírito Santo, a unção dos enfermos faz o cristão vencer com Cristo, mesmo no momento difícil da enfermidade e da velhice.
Não devemos entender este sacramento como uma certa força mágica: falando determinadas fórmulas, dá-se a cura. É uma oração, cheia de fé e confiança, pedindo que o Senhor esteja presente na hora difícil da doença. É uma súplica da Igreja, para restituir ao doente a saúde, se for conforme o plano de Deus. E se não for, para que o doente encontre a força e a coragem de aceitar a doença ou a morte.
O sacramento da Unção dos Enfermos também perdoa os pecados, se houver arrependimento.
Também os idosos, que se encontram em estado delicado de saúde, podem ser ungidos.
Tem muito sentido receber o sacramento durante a celebração da Eucaristia. Pessoas idosas e doentes, que podem deslocar-se, podem ser ungidos durante a Missa. Já vimos que todos os sacramentos estão orientados para a Eucaristia. Os membros da comunidade, reunidos para a Eucaristia, rezam para seus irmãos doentes e se lembram de que toda ação salvadora emana do sacrifício da cruz.
Além disso, a comunhão, que é levada para os doentes – o Viático – prolonga a celebração da Eucaristia. O doente que não pode estar presente na igreja, recebe a comunhão em casa e, assim, está unido à celebração da Eucaristia.
O sacramento da Unção dos Enfermos pode ser dado várias vezes ao doente, contanto que, dada a Unção, ele se recupere e recaia novamente. Pode ser dado em conjunto: aos anciãos ou a quem tenha doença.
Unção dos Enfermos: o sacramento da confiança
A Unção dos Enfermos liga-se retrospectivamente à unção do Batismo e da Confirmação. Ela é o sacramento da dignidade das pessoas idosas e doentes. Por isso, só pode ser dispensada, com sentido, dentro de uma comunidade, se a comunidade se esforça para criar um espaço vital para essas pessoas. Visitas, nas casas ou nos hospitais, ajuda nas provisões diárias, clubes dos idosos, acessos adequados para deficientes e idosos possam se achegar à igreja, à casa paroquial, aos serviços de assistência, às celebrações – tudo isso faz parte do meio ambiente da unção dos enfermos.
A unção dos enfermos é a memória da paixão e morte de Jesus. O morrer com Jesus já começou no batismo (cf. Rm 6). Completa-se na morte e consuma-se na ressurreição junto com ele. A remissão pela cruz não é a expiação exigida por um Deus cruel, mas sua solidariedade mais extremada para com os sofredores e moribundos. A pergunta pelo o porquê do sofrimento e da morte não encontra nenhuma resposta humana, por mais que ela seja colocada.
O próprio Deus também sofre os sofrimentos de sua criação, o sofrimento das pessoas humanas. Na unção dos enfermos recorda-se também disso. Com o sofrimento de Jesus, atualiza-se todo o sofrimento dos seres humanos, sobretudo o sofrimento dos inocentes, das crianças, das vítimas da tortura e da violência, da fome e das doenças que poderiam ser evitadas. Uma Igreja, uma comunidade, que ministra a unção dos enfermos, coloca-se em solidariedade com todos os que sofrem, e não somente com os fiéis, não somente com aqueles que recebem o sacramento.
A unção dos enfermos é um sinal de fé e de confiança. Transforma-se num encorajamento para se levar a vida de olhos abertos e cabeça erguida. Ela permite conceber e apropriar-se da fase, onde as possibilidades vão se tornando menores e onde as forças caminham para o seu fim, como uma fase importante da vida.
A morte não é simples sofrer a morte, mas entrega da vida recolhida ao Deus grandioso, não é o último fracasso do agir humano, mas o ato consumador da vida e da fé.
Assim, a unção dos enfermos torna-se um sinal da confiança em um fim bom, ultrapassando a morte, um sinal de esperança contra toda esperança, de que nem tudo foi em vão naquilo que se amou e sofreu. A unção dos enfermos é um sacramento pascal, sinal da plenitude.
Este encorajamento para a última fase da vida deve propiciar um engajamento da Igreja e da comunidade para que a unção dos enfermos não se torne apenas consolação piedosa. Trata-se de criar uma comunidade que favoreça os idosos e doentes, mas também que se preocupe de muitos modos com eles. A isso pertence incondicionalmente o engajamento social. Somente assim é que a unção dos enfermos conquista um ambiente de credibilidade e uma força de ajuda. Com isso, não se quer colocar em questão a intervenção divina, mas a percepção de que Deus não quer fazer tudo sozinho.
Lucimara Trevizan
Equipe do site