O filme “Homens e Deuses” (Xavier Beauvois, 2010) conta os últimos dias de sete monges trapistas, assassinados em Tibhirine (Argélia). Na última cena, os mártires, custodiados por seus algozes, caminham para a morte, até perder-se de vista na escuridão da noite. O filme ganhou a palma d’ouro no festival de Cannes do ano 2010.

 

A morte dos mártires é sempre uma reedição da morte de Jesus. Sua glorificação, na terra, é um testemunho da nossa fé na ressurreição do Senhor. Como Jesus passou do horror da Cruz à luz da Ressurreição, assim também os mártires passam da escuridão da noite para a glória do martírio.

A história de Jesus poderia terminar com o relato de sua morte e ressurreição. Mas São Lucas, autor do livro dos Atos dos Apóstolos, previu que as crianças, na catequese, perguntariam: “Que aconteceu depois? Para onde foi Jesus? E onde está agora?” Então, Lucas acrescentou uma bela página à história de Jesus, contando o mistério da Ascensão do Senhor.

 

O símbolo apostólico diz que Jesus subiu aos céus e está sentado à direita de Deus Pai todo-poderoso. “Quarenta dias” após a Ressurreição, Jesus reuniu os discípulos no monte das Oliveiras e “elevou-se à vista deles”, até que uma nuvem o ocultou (At 1,9). Lucas já tinha contado a Ascensão de Jesus no seu evangelho (Lc 24,51), e até Marcos, no final do seu, tinha dito que o Senhor Jesus, depois de falar com os discípulos, “foi levado ao céu” (Mc 16,19).

 

O mistério da Ascensão não deve ser entendido como um “acontecimento geográfico”. Os textos bíblicos e a tradição da Igreja expressam o mistério com linguagem simbólica: “Subir ao céu”, “elevar-se” e ser ocultado pela “nuvem” são belas imagens. Mas nós poderíamos expressar o mesmo mistério com outras imagens: Jesus mergulhou na eternidade, entrou na vida que não terá fim, desceu até o abismo inefável do amor de Deus.

 

Quanto à frase “está sentado à direita de Deus Pai todo-poderoso”, muitos padres e até alguns folhetos litúrgicos evitam chamar a Deus de “eterno” e “todo-poderoso”. Preferem dizer “Deus de bondade”, “Pai misericordioso”, etc. Na verdade, a “onipotência divina” consiste na força infinita do seu amor, capaz de atrair nosso coração, mas respeitando sempre a nossa liberdade. Deus é todo-poderoso, sim, mas com a suavidade infinita do seu amor. Pela sua Ascensão, Jesus mergulhou neste mistério de amor eterno e todo-poderoso.

 

 

Padre Luis González-Quevedo, sj

Teólogo, pregador de retiros inacianos, diretor do Centro Loyola de Goiânia-GO

01.03.2013