De acordo com vários teólogos que estudam e interpretam as atividades práticas sobre o batismo, tendo como base as experiências das primeiras comunidades e o contexto histórico do tempo de Jesus, pode-se dizer que bem antes do tempo de Jesus já havia um batismo que caracterizava a iniciação de uma pessoa ao judaísmo. Os pagãos convertidos ao judaísmo eram introduzidos na sinagoga mediante um rito. Havia os chamados ‘temente a Deus’ (aqueles que renunciavam ao politeísmo e desejavam fazer parte do judaísmo com todos os direitos e deveres), bem como os prosélitos (aqueles que aceitavam a circuncisão e podiam comer a páscoa). Os ‘tementes a Deus não eram circuncidados, mas participavam do rito de iniciação. 

Havia purificações rituais previstas pela lei judaica que explicava o banho dos prosélitos. (prosélitos eram aqueles que aceitavam a circuncisão e podiam comer a páscoa). O batismo deles, como imersão total, ocorria oito dias da circuncisão como incorporação à comunidade israelita e como perdão dos pecados ou libertação de toda impureza pagã. Nesse rito do batismo estava implícita a aceitação da fé e da lei judaica. Para as mulheres convertidas ao judaísmo havia o banho como rito, mas não havia circuncisão. 

A maneira pela qual se confirmava a verdadeira conversão dos prosélitos na fé e no amor verdadeiro a Deus, como verdadeira adesão pessoal ao judaísmo, era através das condições impostas para sua admissão. 

  1. Havia um exame ou julgamento para a admissão: diante de três pessoas ou testemunhas que, dialogando com eles, indagavam sobre os motivos da conversão. E, ao mesmo tempo, eles eram advertidos sobre as perseguições que aconteciam aos judeus.
  2. Após essa aceitação dos mesmos como membros da fé judaica, iniciava-se um período de instrução catequética, por um tempo determinado, para conhecer os mandamentos, a caridade, os castigos e o mundo futuro.
  3. Após a catequese acontecia os ritos: circuncisão, banho e oferecimento de um sacrifício. Essa oferta do sacrifício permaneceu até o tempo da destruição do Templo de Jerusalém, por volta dos anos 70 d.C. Dentre esses ritos, o banho era essencial. 

Esse banho dos prosélitos que teve início um pouco antes do tempo de Jesus permaneceu em uso no início da era cristã quando os primeiros discípulos começaram a estruturar a Igreja e os discípulos cristãos das primeiras comunidades viveu essa experiência, principalmente quando todos se encontravam na Diáspora, submetidos às leis restritivas imperiais e da dispersão dos crentes entre os pagãos. (Diáspora são as cidades que se encontravam fora de Israel).

No início do cristianismo primitivo, as primeiras comunidades cristãs também sofreram influência das comunidades de Qumrãn, com a grande conversão dos povos essênios ao cristianismo. Depois da destruição do Templo. Os essênios convertidos levaram suas experiências de práticas batismais paras as comunidades cristãs. Era um conjunto de práticas correspondentes a cada etapa da iniciação das pessoas nas regras da comunidade.

1ª etapa – um trabalho para a conversão, uma mudança de vida que implicava, de um lado, numa tomada de consciência do mal cometido e, de outro lado, supunha uma iluminação divina. 

2ª etapa – Para o ingresso na comunidade necessitava de uma caminhada junto com a mesma, e só depois de um ano da admissão, se aprovada, seria incluída como membro de pertença à comunidade. Nesse período de um ano acontecia uma série de etapas: um responsável examinava minuciosamente as aptidões dos candidatos e sua capacidade de viver as regras da comunidade. A decisão para a pertença, no final do tempo era dada pela comunidade que poderia aceitar ou recusar o candidato. 

3ª etapa – Se o candidato fosse admitido ele então entraria para uma nova etapa de dois anos de durabilidade, durante os quais participava nos banhos, mas não na refeição comunitária do meio dia. No final desse tempo eles tinham a admissão plena.

Esse tipo de catecumenato oferecia um tempo de aprendizagem prática da fé e de conhecimento das normas de vida na comunidade.
Podemos observar através dessa prática de fé cristã exercida pelos discípulos de Jesus, que o cristianismo caminhou por muito tempo sobre a influência do judaísmo nas comunidades cristãs, pois estas nasceram num contexto religioso que praticava banhos rituais. É só observar as experiências de vida da comunidade cristã primitiva narrada nos Atos dos Apóstolos, em seus capítulos de 3 a 15. Com todo esse desenvolvimento das catequeses iniciais que eram oferecidas para se ingressar nas comunidades cristãs, pode-se dizer que o batismo, porta de entrada para a vida cristã, não é um rito novo, mas um banho recebido da prática judaica, porém reformado e atualizado pela pessoa de Jesus Cristo e sua promessa. 

As práticas batismais dos primeiros cristãos estão bem próximas do batismo de João Batista. Ele proclamou e praticou um batismo em sinal de conversão, para o perdão dos pecados (Mt 1,4; Lc 3,3). Batizar para João Batista equivale a ‘ser submerso’ ou morrer, ou seja, um batismo que levava a um arrependimento e conversão, uma saída de um mundo de injustiça para um mundo de justiça e compromisso com a vida. Nesse sentido o batismo de João Batista é original. É uma imersão única e irrepetivel. É gesto profético de conversão e perdão, cujo valor se tem à fé do batizado na palavra recebida de Deus através de seu servo. É um gesto escatológico na espera de um juízo de Deus. 

A conversão e o perdão proclamados por João Batista são dons escatológicos de Deus e ao mesmo tempo, são exigências para o homem. Sabemos que Jesus foi batizado por João (Mc 1,9), mas com uma diferença porque não confessou seus pecados nem teve que converter-se (Jo 1,5), mas tomou consciência de sua missão na sociedade injusta de seu tempo. Era necessário transformá-la para tornar visível o reinado de Deus. 

O Batismo Cristão

O batismo cristão supera o banho judaico. Vai além do batismo de João Batista. Com o batismo cristão se entra no âmbito escatológico do reino que vem. Nos ensinamentos de Jesus, ou seja, em sua mensagem proclamada está a proximidade do reino de Deus e na exigência da conversão Jesus está a afirmação da sua própria obra soberana. Com Palavras e gestos Jesus perdoa os pecados, um perdão que se funda na misericórdia de Deus e sua conversão proclamada se refere ao reino de Deus e ao Deus do reino. Jesus é o próprio sacramento fontal. Com sua morte Deus nos concede seu Espírito para que nós continuemos a Obra de Jesus: Batizados, somos chamados ao compromisso de acabar com as injustiças e construir uma sociedade justa. Nesse sentido, o batismo cristão não aparece como um rito de iniciação orientado para a salvação, mas representa um selo sacramental perante o juízo vindouro, pois ele é obra do Espírito de Cristo, em cujo nome é celebrado, ao mesmo tempo em que entra na comunidade dos que creem no ressuscitado. Pode-se dizer que batizar significa identificar-se com a causa de Jesus, implica numa conversão aos valores do reino de Deus e num compromisso de vida.

Neuza Silveira de Souza
Comissão Bíblico catequética do Regional Leste 2