Vivemos um tempo de mudança de época bastante agitado. De um lado se faz presente grandes avanços em vários setores, a exemplo do grande desenvolvimento tecnológico, o maior acesso das pessoas aos bens de subsistência, a ampliação dos meios de comunicação; mediações e estratégias de comunicação; a ciberteologia, o cristianismo em tempos de redes sociais. Por outro lado, percebe-se o crescimento do individualismo e as consequentes dificuldades nos relacionamentos. Em relação ao campo religioso, a situação não é menos confusa. Existe uma grande busca pelo sagrado, mas de forma desordenada e desorientada, o que não contribui para a formação de uma identidade religiosa, fundamentada em autêntica experiência de fé, e muito menos sobre a pertença a uma comunidade.

É nesse contexto atual que, enquanto cristãos, ou ainda em busca do sentido de ser cristão, somos todos convidados para experimentar a beleza e a grandeza de nos fazermos discípulas e discípulos missionários do Cristo a partir das orientações do Papa Francisco e das cinco urgências apresentadas nas Diretrizes Gerais da Ação Evangelizadora da Igreja no Brasil.

A Conferência Nacional dos Bispos do Brasil concebe a Igreja em estado permanente de missão. Atentos a esse “estado de missão” e às urgências apresentadas vamos assumindo a caminhada da Iniciação Cristã na tentativa de renovar a vida comunitária e nela despertar o caráter missionário. Esse trabalho implica a realização do anúncio e reanúncio de Jesus Cristo, possibilitando aos que não o conhecem ou que dele se afastaram ouvir o núcleo da Boa-Nova da Salvação.

Na busca de novos caminhos para a evangelização, a Igreja nos convida a retomarmos as experiências das comunidades no período pós-apostólico, quando, aos poucos, ela foi estruturando um processo de iniciação de novos membros a uma nova identidade, como cristãos inseridos na comunidade eclesial, prontos a celebrar a fé e a assumir a missão. Tal processo de iniciação, mais tarde, foi denominado Catecumenato. Sua finalidade era possibilitar, por meio de um itinerário específico de iniciação, a preparação, prioritariamente de pessoas adultas que tinham manifestado o desejo de assumir a fé da Igreja. Ao longo desse itinerário catecumenal, havia uma série de ensinamentos, um conjunto de práticas litúrgicas (imposição das mãos, orações sobre os catecúmenos, entregas simbólicas etc.).

O tempo do catecumenato e seus ritos, muitas vezes prolongados por vários anos, tinham como objetivo a conversão e o amadurecimento da fé. Mediante uma formação adequada para a vida cristã integral, os catecúmenos (os não batizados) são iniciados no mistério da salvação e na prática dos costumes evangélicos, a partir de ritos sagrados celebrados em épocas sucessivas e introduzidos na vida da fé, da liturgia e da caridade do povo de Deus. O conteúdo de fé oferecido instruía para esclarecer a fé, dirigir o coração para Deus, incentivar a participação nos mistérios litúrgicos, animar para o apostolado e orientar toda a vida segundo o Espírito de Cristo.

O Catecumenato hoje

Aqui no Brasil, atualmente, temos várias propostas de conteúdo doutrinal para o Tempo do Catecumenato e que conjugam temas catequéticos e tempos litúrgicos. Nas sucessivas apresentações de documentos que a Igreja apresenta sobre o assunto, a partir do Concílio Vaticano Segundo, encontramos apontamentos sobre a necessidade de uma revisão dos processos iniciáticos de crianças e adultos.

O decreto Ad Gentes (AG), sobre a Atividade Missionária da Igreja, pontua: “Aqueles que receberam de Deus por meio da Igreja a fé em Cristo, sejam admitidos ao catecumenato, mediante cerimônias litúrgicas. O catecumenato não é mera exposição de dogmas e preceitos, mas uma formação e uma aprendizagem de toda a vida cristã; prolongada de modo conveniente, por cujo meio os discípulos se unem com Cristo seu Mestre. Por conseguinte, sejam os catecúmenos convenientemente iniciados no mistério da salvação, na prática dos costumes evangélicos, e com ritos sagrados, a celebrar em tempos sucessivos, sejam introduzidos na vida da fé, da liturgia e da caridade do Povo de Deus. Em seguida, libertos do poder das trevas pelos sacramentos da Iniciação cristã, mortos com Cristo e com Ele sepultados e ressuscitados, recebem o Espírito de adoção de filhos e celebram, com todo o Povo de Deus, o memorial da morte e ressurreição do Senhor” (n. 14).

O documento 107 da CNBB, “Iniciação à Vida Cristã: itinerário para formar discípulos missionários”, foi publicado como resultado da 55ª Assembleia Geral dos nossos bispos, em maio de 2017. Sua justificativa foi muito clara: “Sabemos que o processo de Iniciação à Vida Cristã requer novas disposições pastorais”. São necessárias perseverança, docilidade à voz do Espírito, sensibilidade aos sinais dos tempos, escolhas corajosas e paciência, pois se trata de um novo paradigma. Foi este o caminho percorrido por evangelizadores como Paulo, os primeiros cristãos e muitos missionários (CNBB, doc. 107, n.9).

O processo de Iniciação à Vida Cristã

O processo de iniciação à vida cristã é muito mais exigente e comprometedor do que a tradicional “preparação para os sacramentos” que fazemos atualmente como catequese, pois estes são instrumentos-sinais que apontam para algo maior que eles. No caminho de preparação temos uma meta – o encontro com Deus, que não vai acontecer no fim, mas que vai acontecendo ao longo da caminhada. Vamos fazendo um caminho de pertencimento. Desde o princípio do caminho é Cristo que desperta e reveste o itinerante de vida nova constituindo-o para o seguimento numa vida em conformidade com a Dele. Assim, aquele com o qual nós vamos nos encontrar definitivamente, já está no meio de nós!

Ser iniciado na vida de Cristo, conformar-se a Ele, ser dele revestido, desperta a pessoa para a missionariedade. O anúncio da vida do Cristo, ou seja, o Querígma, nos forma para a vida cristã, diz o Papa Francisco, acrescentando: vai fazendo carne e permitindo-nos compreender o sentido dos vários temas que se desenvolve na catequese. É vivendo o anúncio de cada dia que encontramos resposta ao anseio de infinito que existe em todo coração humano.

A Iniciação à Vida Cristã, bem como a sua celebração eclesial nos sacramentos, não é apresentada como uma necessidade jurídica ou meramente intelectual, mas, antes de tudo, como uma experiência de fé humana, que busca em Deus a razão da própria caminhada: “É o encontro pessoal com Jesus Cristo, e não o simples conhecimento de doutrina, que vai sustentar e fazer crescer a fé que vai ser a grande fonte animadora de nossa vida” (n. 164).

Entendido o processo de Iniciação Cristã como catequese de inspiração catecumenal, as dioceses devem se colocar abertas a essa proposta de renovação, num trabalho catequético que nos leve a fazer uma caminhada que seja profundamente marcada e fecundada pela Inspiração catecumenal. Uma catequese que tenha por finalidade a maturidade da fé, para que como São Paulo possamos dizer “já não sou eu mais que vivo; é Cristo que vive em mim!” (Gl 2,19).

Neuza Silveira de Souza

Comissão Bíblico-Catequética do Leste 2