Nem tudo na pós-modernidade se traduz em triunfalismo ou decepção fragmentante. No meio ao marasmo do neoliberalismo materialista e consumista, despontam sonhos maiores. O ser humano não se prende totalmente ao presente. Habitam-lhe o coração desejos do infinito.

 

A modernidade depositara no interior das pessoas o sonho das conquistas. Nascemos como nação do espírito conquistador dos ibéricos. Façanhas semelhantes fizeram outros povos europeus. Aí se gestaram projetos científicos de grande alcance. As revoluções, as guerras enlouquecidas em busca de maiores riquezas alimentaram esse continente durante os últimos séculos.

 

Apesar da onda de tédio e cansaço pós-moderno, pipocam por toda parte novos movimentos utópicos e de esperança. As mulheres alimentam o movimento feminista a reivindicar igualdade nas condições de trabalho, salário e outros direitos, que a natureza lhes dá, mas que a sociedade e cultura lhes negavam.

 

As etnias postergadas se levantam e gritam por seus direitos. O movimento negro já nos marcou o calendário com o dia da Consciência Negra a 20 de novembro, fazendo-o coincidir com o dia da morte de Zumbi dos Palmares (1695). Figura mais que histórica da libertação dos escravos, a ocupar lugar na autêntica mitologia do povo negro brasileiro.

 

E ao lado desse movimento negro, embora menos visível, existe também a consciência da defesa dos povos indígenas e de suas reservas. Luta difícil contra poderosos inimigos: mineradoras, latifundiários, agrobusiness, poder judiciário corrupto, políticos peleguistas e outras mazelas da nossa política econômica e social.

 

Expressivo e crescente anima-nos o movimento pacifista ao opor-se a toda guerra e violência e ao tocar a raiz desse flagelo, combatendo a indústria bélica.

 

Coroando tanta beleza utópica numa pós-modernidade morna, estão os ecologistas. Gritam em alto e bom som por profunda transformação do modelo de crescimento e desenvolvimento. Até agora ele funciona à base do aumento na produção de bens e à custa do esgotamento dos recursos da natureza. Propõe-se novo modo de viver sóbrio, simples e humano em vez de afogado em mar de bens materiais.

 

E a fé? Ela apóia fundamentalmente todos esses movimentos. Encontra neles traços do Jesus histórico. Ele lutara para que todos tivessem vida e em abundância. Isso só se torna possível se as causas defendidas pelos movimentos sociais avançarem e se impuserem.

 

As mulheres, os negros, os índios, a paz, a vida na Terra estão a pedir nova lógica de vida. Em vez da competição, a cooperação; em vez da sofreguidão exploradora, a sobriedade; em vez de capitalismo neoliberal, novo sistema de cunho social; em vez de individualismo mórbido, a convivência.

 

A fé cristã, ao olhar para todos esses traços, reconhece neles os sonhos de Jesus que anima a muitos nessas causas. Embora seculares em sua organização, afirmando a autêntica autonomia das realidades terrestres no espírito da Gaudium et spes do Concílio Vaticano II, elas estão impregnadas do espírito cristão.

 

 

 Pe. João Batista Libânio sj

Doutor em Teologia e Professor da FAJE - Faculdade Jesuíta de Filosofia e Teologia em Belo Horizonte

15.05.2012