A primeira vitrine de Natal que vejo nas ruas me encontra cansado, surpreso, aflito por pressentir a passagem acelerada do tempo, levando-me junto, sem dar tempo de que me ocupe mais com pessoas e coisas que me façam realmente feliz.
Vem aí mais uma maratona de fim de ano, com sua previsível cota de filas no comércio, agônicos engarrafamentos no trânsito, e não me sinto, ainda, natalinamente preparado.
Hoje, o Natal que sobrevive em mim é suficiente apenas para elevar a esse Deus tão menino uma prece, pedindo, simplesmente, que eu não me canse...
Que eu não me canse, Senhor, dos pequenos gestos.
Que eu não desanime dos heroísmos anônimos, do tempo gasto ouvindo lamentos, da paciência exigida para suportar rancores, mágoas, da generosidade sem a qual seria impossível amar o irmão que espera de mim, mesmo contra toda esperança, gestos de acolhida, afeto, respeito, carinho e compreensão.
Num mundo que valoriza tanto a vitrine, que eu seja capaz de garantir que haja algo que valha realmente a pena, guardado no estoque das minhas poucas e preciosas certezas.
Que eu não me canse, nem desanime, Senhor, mesmo diante da aparente vitória dos que gestam e geram conflitos e guerras, sobre os muitos que anseiam e precisam de serenidade e paz!
Ensina-me a ser paciente, Senhor. A caminhar de volta sobre passos já dados, e retomar o caminho quantas vezes for preciso, sem perder de vista o rumo, o destino que busco: estar cada vez mais perto de Ti.
Que eu não me canse, Senhor, se o peso das dificuldades, se os acidentes no percurso, as grandes e pequenas perdas e tragédias do cotidiano, tornarem a caminhada quase insuportável. Que eu retome, todos os dias, a minha cruz, sem esquecer a minha alegria, a minha fé, a minha esperança, e com essa bagagem, que eu siga em frente, sabendo que estás ao meu lado, companheiro de caminhada, presente nos amigos, na família, nos tantos que caminham comigo, ainda que eu não saiba ou perceba, fazendo-nos assim, teu povo, tua Igreja.
Em meio a tanto barulho, que haja silêncio em meu coração para que eu possa ouvir tua voz que fala no silêncio, Senhor. Que, nesse tempo e espaço de serenidade, a sinfonia da tua beleza se manifeste em mim, criando e recriando harmonias.
Que eu não me canse, Senhor, nem me deixe enganar pelas promessas que garantem o paraíso em suaves prestações da minha consciência. Que eu não me aliene nem transfira para quem quer que seja a responsabilidade por meus atos e omissões, por minhas escolhas, pelo SIM e pelo NÃO que pronuncio a cada minuto da vida, frutos da minha sagrada liberdade.
O mundo em que vivo e que ajudo a construir, valoriza demais, espera demais pelos grandes momentos, pelo sucesso explosivo, a fama instantânea, a fortuna lotérica das mega-senas da virada, os segundos na passarela, na tela, na manchete, quase sempre seguidos por uma imensa e depressiva solidão.
Que eu aprenda, todos os dias, a viver a beleza sem maquiagem dos momentos simples. Que eu recupere a clareza dos sorrisos lavados, purificados, ternos e eternos que contemplo principalmente nas crianças e nos bem velhinhos. Que eu saboreie cada gota de eternidade que mina nos pequenos gestos de doação, em mim e à minha volta. E que eu canalize, junto com teu povo, essa energia toda, em cascata, para abastecer as fontes onde, um dia, os guerreiros do mundo virão, cansados e derrotados de si mesmos, matar a sede que, eles ainda não sabem, só Tu podes saciar.
É que, antes de inventarmos as guerras, as misérias, o cansaço, as vitrines, as luzes ofuscantes e artificiais, sob o brilho frágil de uma vela, alguém escreveu no livro da vida:
A minha alma tem sede do Senhor!
Amém, à espera do Aleluia de Natal!
Eduardo Machado
Educador e Escritor
01.12.2012