A necessidade de envolver a família inteira no processo catequético vem sendo sentida desde muito. A Igreja sempre afirmou que a família é o berço da fé, que os pais são os primeiros catequistas.
Com tantas mudanças, a família nem sempre acompanha a catequese assim tão de perto. Muitos catequistas se preocupam demais com isso. Daí surgiu a ideia da catequese familiar, tentando envolver a família na catequese. A ideia é muito boa. Mas as iniciativas que surgiram nem sempre conseguem obter êxito.
Em algumas paróquias, os pais foram convidados a dar catequese para os seus filhos. Acabou a catequese comunitária, na comunidade eclesial, e os encontros passaram a ser feitos nas casas, conduzidos pelos pais. Em alguns lugares, as crianças se reuniam cada semana na casa de uma família e a família acolhedora conduzia o encontro.
Concordamos plenamente que os pais são os primeiros catequistas dos filhos. Mas eles são “primeiros” em ordem cronológica e não em ordem de primazia. Ou seja, os pais com sua vida familiar, com seu amor, seu afeto, sua fé, transmitem à criança as primeiras noções importantes sobre o mistério da vida e o mistério de Deus. Mas a fé que eles transmitem não é uma fé particular, apesar de ela ser assumida pessoalmente, de forma livre e consciente. Eles transmitem a fé da Igreja. Então, em termos de primazia, a catequese dos filhos é primeiramente tarefa da Igreja e não dos pais. É tarefa dos pais também porque eles são Igreja. Mas ela é tarefa da paróquia. Os catequistas da comunidade são a Igreja evangelizando; eles cumprem sua missão em nome da paróquia; é a Igreja quem os envia. Por isso eles não dão catequese em seu nome, nem por iniciativa própria, nem de um jeito que eles inventaram, nem transmitem uma fé particular. Eles transmitem a fé da Igreja, como Igreja e na Igreja. A catequese é paroquial. Ela proporciona a experiência eclesial. Ela ajuda a fazer a experiência de Igreja, de pertença, de fé celebrada e vivida, e não só de fé professada no seio familiar. Os catequistas ajudam a criança a dar o passo em direção à vida da comunidade. A vivência familiar proporciona a primeira experiência de Deus. Mas é preciso não ficar só nisso e dar o segundo passo. Entendemos que qualquer experiência que envolva a família não deve suplantar a catequese na comunidade. O catequista, sem a pretensão de substituir os pais, age em nome da Igreja. Por meio dos catequistas, a Igreja exerce a sua missão de dar aos fiéis a formação na fé. A família é apenas o primeiro passo dessa formação. Não parece interessante que a Igreja devolva às famílias a tarefa de ajudar os catequizandos no desenvolvimento de sua fé comunitária. Famílias e catequistas devem atuar, cada qual fazendo a sua parte.
Por outro lado, a Igreja dá aos catequistas, ou deve dar, uma formação específica para esse ministério, formação que – apesar dos esforços – dificilmente poderia ser dada a todos os pais. Portanto, parece-nos temerário reduzir a catequese à experiência em família. Seria algo como privatizar a catequese. Já imaginou se passássemos a celebrar as missas também em todas as casas, por que a família é, como dizem alguns, uma “Igreja doméstica”? A liturgia passaria a ser também familiar, contida entre quatro paredes. O espírito eclesial não é este.
Na onda da catequese familiar, surgiram também subsídios para a catequese, compostos de livro para o catequista, livro para o catequizando e livro para os pais. Para vender livros, essa ideia é ótima. Mas quem garante que tanto livro vai realmente fazer que dentro de casa haja um ambiente de mais intensa presença de Deus? Pode funcionar ou não. Sem contar que isso causa constrangimento. Os filhos cujos pais são mais igrejeiros ficam privilegiados em detrimento daqueles cuja família não é tão religiosa! Isso pode ser excludente, o que não é próprio da fé católica – universal – aberta a todos.
Pensamos que o ministério dos pais, como educadores dos seus filhos, se difere do ministério dos catequistas, como mistagogos, ou seja, como quem ajuda os catequizandos a fazerem a experiência de Deus no ambiente eclesial. Ambos são importantes – pais e catequistas – e devem ser incentivados a atuar do melhor modo. A catequese na comunidade nos parece de fundamental importância. Até porque mostra que a Igreja é um espaço mais amplo que a própria família.
A participação dos pais pode ocorrer de outras formas, valendo sempre a criatividade. Algumas paróquias têm convidado os pais para participar de celebrações juntamente com os catequizandos. Tem dado certo. Ou fazem eventos especiais evolvendo a família. Pode ser uma saída. Mas lembramos que os pais costumam andar cansados de reunião. A gente se reúne para tanta coisa. Por isso, convidar os pais para reunião, só se houver a máxima urgência, se houver algo a ser decidido que precise da participação deles. Na maioria dos casos, marcamos reuniões com os pais sem saber direito do que se vai tratar, só com o pretexto de envolvê-los na catequese. E a reunião fica muito cansativa. Com a vida corrida que levamos, ninguém tem mais paciência para participar de reuniões enfadonhas e sem objetivos claros.
Uma ideia que damos é realizar festas e convidar os pais. Então, se os filhos forem apresentar um teatro ou algum número artístico ligado às reflexões e experiências catequéticas, os pais irão com boa vontade. Principalmente se os filhos forem crianças. Em celebrações animadas, os pais também costumam acompanhar os filhos. Há experiências boas, nesse sentido.
Incentivamos também os catequistas a visitar as famílias dos catequizandos, seja para convidar as pessoas para a catequese, seja para comemorar o aniversário dos catequizandos, seja para confortar em momentos difíceis, como a morte de alguém da família, ou em caso de alguma enfermidade. Podem visitar sozinhos ou com a turma inteira. Isso estreita os laços de fraternidade.
Queríamos dizer, além disso, que o fato de os pais estarem distantes da catequese não significa o fracasso do processo catequético. A família vem se transformando também no modo de viver a fé. Já vimos casos em que os pais dos catequizandos frequentavam outra Igreja. E mesmo assim a criança ou adolescente foi parar na catequese católica a convite de algum colega. Os pais não iam às reuniões, mas respeitavam a liberdade do filho de frequentar a catequese católica. Vejam que sinal de abertura e de respeito à liberdade religiosa por parte dos pais não-católicos! Vamos aprender a lidar com o pluralismo religioso. Vamos manter coração e mente abertos para lidar com as diversas situações familiares, vendo sempre o lado positivo. Já vimos até casos de jovens frequentando a catequese mesmo contra a vontade dos pais. Estavam lidando, a seu modo, contra a atitude dos pais que proibiam a vivência da fé católica dentro de casa. Seria justo rejeitar um jovem nessa situação, por causa de sua família? Ao contrário, pensamos que é preciso usar o bom senso para defender a liberdade religiosa sem criar conflitos em casa. A Igreja se preza tanto em defender a liberdade religiosa!
Então, mesmo valorizando a família, vamos acolher as situações diversas que vão aparecendo. Muitas crianças podem chegar à catequese sem terem sido batizadas. Algumas paróquias poderão ter a tentação de rejeitar essas crianças, dizendo que para participar da catequese precisa antes ser batizado. Ora, vamos acolher, acompanhar, valorizar, ajudar a fazer a experiência de fé. Depois, batizamos. Quem disse que o batismo tem que vir primeiro? Esse é apenas mais um costume que se oficializou. Mas o Evangelho é mais importante que os próprios costumes. E nos desafia a rever certas práticas.
Quanto ao acompanhamento das famílias, lembramos ainda a importância da pastoral familiar. Numa paróquia bem organizada, haverá algum tipo de pastoral ou de movimento – não importa tanto o nome – que cuide da evangelização dos casais. Além da formação permanente que a paróquia oferece para todos, é claro! É papel da pastoral familiar – e não tanto da catequese – oferecer aos casais um incentivo específico para a vida familiar. A gente às vezes vê catequistas se preocupando tanto com os pais, por falta de uma pastoral familiar que ajude nessa questão.
A nossa catequese será familiar se valorizar a família, atuando em conjunto com a pastoral familiar, mas não abrindo mão de sua missão e devolvendo sua tarefa para os pais. E será familiar compreendendo as mudanças ocorridas na família e respeitando a história familiar de cada catequizando, sem ficar exigindo uma padronização que não existe mais.
Solange Maria do Carmo
Biblista e doutoranda em Catequese pela FAJE – Faculdade Jesuíta de Filosofia e Teologia de BH.
01.09.2012