A imagem de Jesus reprimindo o desejo de Pedro de que não aconteça nada de mal ao Mestre ao anunciar a ida para a entrega em Jerusalém é muito forte. Jesus diz: “Afasta-te Satanás”. O relacionamento com o outro, segundo o filósofo Emanuel Levinas (1906), é fundamental para deflagrar nossa identidade. O conceito de alteridade garante a possibilidade do “EU” e constitui uma fonte originária de todos os motivos morais. O “Eu Sou”, revelado em Jesus é conhecido em cada movimento da história da salvação, e nossa questão é: quem é o discípulo que deseja apenas o bem para seu Mestre?
Jesus havia levado os discípulos a Cesárea de Filipe, região pagã e contraditória. Lá perguntou: “Quem Eu Sou?” Expressão do Nome de Deus no Primeiro Testamento. Pedro acerta na resposta e recebe as chaves do compromisso do primado. Então, Jesus começa a anunciar os próximos passos. Era necessário cumprir o trajeto da entrega pela causa que viera realizar. É nessa hora que Pedro desvia o olhar para a defesa contra os enfrentamentos anunciados e comete o humano ato de fuga, jogando para Deus a responsabilidade que é nossa: “Deus não permita”.
Encontro muita gente que prefere terceirizar as responsabilidades dizendo que isso é coisa do diabo, ou Deus quis assim! O que é responsabilidade nossa, está nas nossas mãos, precisa ser compromisso nosso, não pode ser terceirizado. Mesmo quando o outro nos interpela e funda em nós sua experiência vital, o princípio da alteridade não é sinônimo de imposição para abrirmos mão daquilo que defendemos, abraçamos e acreditamos.
É isso que Jesus faz! Ele está em profunda comunhão e sintonia com o outro, esse frágil humano que revela a oportunidade de reafirmar sua essência divina e quando a causa é apresentada, a atenção precisa ser priorizada para não se perder. O “afasta-te Satanás” é para refutar a armadinha da divisão, procurando garantir a integridade do ser.
Entendo que aquele discípulo, somos nós! E precisamos nos manter firmes naquilo que acreditamos e buscamos realizar, para salvar vidas, para concretizar esperanças, para mantermos nossa integridade e não nos corrompermos por nenhum tipo de privilégio ou terceirização da nossa responsabilidade.
Pe. Evandro Alves Bastos
29.08.2020