Um dos pontos de estrangulamento de nossa catequese – lamentavelmente não é o único – tem sido a dificuldade de traduzir a reflexão teológica, tão ampla e generosa, numa linguagem catequética que fale, de fato, ao coração dos catequizandos. Entendemos aqui por linguagem catequética a comunicação entre catequistas e catequizandos e o modo como se dá essa comunicação, ou seja, a pedagogia que norteia os encontros. Essa comunicação tem sido bastante confusa porque tem se baseado em categorias que já deviam ter sido superadas, em razão de todo o avanço da reflexão teológico-catequética. Diante disso, precisamos buscar o modo adequado de compreender certas tendências da catequese hoje.

 

As perguntas que todo catequista se faz são mais ou menos as seguintes: Como vou traduzir a teologia catequética – presente em tantos documentos bonitos da Igreja – em linguagem que se preste à comunicação com os catequizandos? Como vou fazer uma catequese com tais características? Como deve ser a pedagogia do encontro, para que a catequese realmente fale ao coração das pessoas?

 

O catequista, cheio de boa vontade, vai a um encontro e lá aprende que a catequese precisa assumir as angústias do homem moderno. Mas quando o catequista volta à paróquia e se vê diante de sua turma, ele se sente perdido e interroga a si mesmo: “Como é que se assume a angústia desses catequizandos?”. Ou ainda: “A catequese precisa valorizar profundamente a dimensão afetiva da pessoa, mas, na prática, o que preciso fazer, na hora do encontro, para valorizar essa tal dimensão afetiva?”.

 

A questão que parece precisar de esclarecimento é a seguinte: A quem compete fazer essa tradução da reflexão teológica em linguagem catequética, construindo uma pedagogia adequada? Em nossa opinião, isso é função dos roteiros catequéticos. Esses roteiros têm o objetivo de organizar pedagogicamente a fé que a catequese deseja transmitir, pois a catequese lida em primeiro lugar com a transmissão da fé. Se o roteiro favorece uma boa comunicação da fé, teremos a porta aberta para que o catequizando faça sua experiência cristã de Deus.

 

Com relação aos roteiros, há pelo menos dois problemas:

Primeiro: a fobia de roteiros. Em muitos lugares, há um preconceito contra roteiros. Uma verdadeira roteirofobia. Dizem que não se pode dar tudo pronto para o catequista, que o catequista não pode se contentar com uma catequese livresca, que nenhum roteiro é completo, e por aí vai. Esse modo de pensar pode até ter certa razão. Mas parece que os roteiros acabam sendo importante auxílio pedagógico para a prática da catequese. Se cada catequista tiver que pesquisar e preparar encontros, partindo somente de suas teorias e sua prática eclesial, sem um instrumento didático, então a catequese jamais será coerente e orgânica, além de correr o risco de não transmitir a genuína fé, professada, celebrada e vivida pela comunidade-Igreja. Não é que não valorizemos o catequista. É até o contrário. Por valorizar o trabalho dos catequistas, julgamos de fundamental importância fornecer a eles material pedagógico adequado ao seu trabalho. Esse material, além de ajudar na unidade de todo o processo catequético, também será um auxílio para a formação do próprio catequista. A função do roteiro não é tirar a criatividade do catequista, dando tudo pronto, mas organizar metodologicamente a fé que a Igreja professa, celebra e vive; tudo isso dentro das categorias que as reflexões catequéticas vão pontuando nos documentos.

 

Segundo: a linguagem dos roteiros. Outro problema que surge com os roteiros existentes, pelo menos com grande número deles, é que utilizam ainda categorias antigas para falar de coisas novas. Há uma distância enorme entre as reflexões teológicas e o conteúdo de certos roteiros oferecidos aos catequistas. A maior parte dos roteiros ainda centraliza a catequese nos sacramentos, não indo muito além do esquema Dogma-Bíblia-Igreja. Então, o catequista encontra nos documentos reflexões interessantes, mas ao dar seus encontros vai partir do roteiro e não das teorias. Esse descompasso entre reflexão teológica e roteiro didático é outro ponto por onde nossa catequese se derrama.

 

Julgamos importante elaborar roteiros pedagógicos que assumam novas categorias para trabalhar a transmissão e o amadurecimento da fé. Isso não é fácil nem tranquilo, porque os pastores da Igreja se assustam quando pegam determinados subsídios catequéticos e não enxergam de imediato os sete sacramentos, os dez mandamentos, os sete pecados capitais, as orações dos cristãos e coisas assim.

 

Do ponto de vista pedagógico, sabemos que uma linguagem codificada em categorias antigas terá dificuldade de penetrar no coração dos catequizandos. Mas tudo é questão de código. Isso é admitido com tranquilidade pelos documentos da Igreja. O Estudo da CNBB 53 – Textos e Manuais de Catequese – afirma no n. 108: “As formulações da fé têm seus condicionamentos históricos: a mesma fé pode, em situações diferentes, receber formulação diferente. O significado é que deve permanecer”. O mais interessante é que, ao dizer isso, os bispos estão praticamente citando o Concílio Vaticano I, de 1870! Então, é preocupante imaginar que há ainda resistências contra as reformulações da fé. Se não codificarmos nossa doutrina – tão rica! – em linguagem nova, ela será ininteligível.

 

Trata-se de transmitir o mesmo conteúdo da fé, a boa-nova de Cristo, mas de um modo tal que ela seja acolhida como algo realmente novo e importante para as pessoas do nosso tempo. Para compreendermos melhor essa mudança de categorias, essa recodificação, e para entendermos as tendências catequéticas presentes hoje no cenário eclesial católico, vamos tentar responder às perguntas seguintes, que julgamos de grande importância.

                                               (continua na próxima edição)

 

Solange Maria do Carmo

Mestre em Sagrada Escritura e professora da PUC-Minas e Centro Loyola de BH.

01.07.2012