Que culpa tinham os 18 mortos debaixo dos escombros da torre de Siloé? (cf. Lucas 13,1-9). E os atingidos por um terramoto, por um ato de terrorismo, por uma doença, serão porventura castigados por Deus? A resposta de Jesus é clara: não é Deus que faz cair torres ou aviões, não é a mão de Deus que arquiteta calamidades.

Recordemos o episódio do cego de nascença: quem pecou, ele ou os seus pais, para que nascesse assim? Jesus afasta imediatamente essa visão: nem ele nem os seus pais. Não é o pecado a alavanca da história, o eixo em torno do qual gira o mundo.

Deus não desperdiça a sua eternidade e poder em castigos, luta conosco contra todo o mal, Ele é a mão viva que faz a vida partir de novo. Com efeito, acrescenta: se não vos converterdes, perecereis todos.

A conversão é a inversão da rota do barco que, se continua assim, vai direita às rochas. Não serve fazer a conta dos bons e dos maus, é preciso reconhecer que é todo um mundo que tem de mudar de direção: nas relações, na política, na economia, na ecologia.

Nunca como hoje sentimos como é atual este apelo do coração de Jesus. Nunca como hoje compreendemos que tudo na criação está em estreita conexão: se há milhões de pobres sem dignidade nem instrução, será todo o mundo a ser desprovido do seu contributo; se a natureza é envenenada, morre também a humanidade; a extinção de uma espécie equivale a uma mutilação de todos.

Convertei-vos à palavra que é cumprimento da lei: «Amarás». Amai-vos, em vez de vos destruirdes. O Evangelho esta todo aqui. À gravidade destas palavras faz de contraponto a confiança da pequena parábola da figueira estéril: o dono está cansado, quer frutos, fará cortar a árvore. Mas o agricultor sábio, com o coração no futuro, diz: «Mais um ano de cuidado e saborearemos o fruto».

Mais um ano, mais sol, chuva e cuidado para que esta árvore, que sou eu, esteja boa e dê fruto. Deus agricultor, dobra-se sobre mim, hortelão confiante deste pequeno horto no qual semeou tanto para tirar tão pouco.

Todavia, continua a enviar germes vitais, sol, chuva, confiança. Ele acredita em mim antes mesmo que eu diga sim. O seu propósito é trabalhar para fazer florescer a vida: o fruto do próximo verão vale mais do que três anos de esterilidade. E por isso desencadeia processos, inicia percursos, entrega-nos uma antecipação de confiança.

Não se sabe quanta exposição ao sol de Deus precisará uma criatura para chegar à harmonia e ao florir da sua vida. Por isso, tem confiança, sê indulgente com todos, e também contigo próprio. A primavera não se deixa perturbar, nem a Páscoa se rende. A confiança é uma vela que impele a história. E, verás, aquilo que tarda, virá.

Ermes Ronchi 
In Avvenire 
Trad.: Rui Jorge Martins 
Publicado em 21.03.2019 no SNPC