O papa vincou hoje (18/05/2016), no Vaticano, que «ignorar o pobre é desprezar Deus», tendo também recordado parte do “Magnificat”, expressão de louvor proferida por Maria, quando louva Deus porque «derrubou os poderosos de seus tronos e exaltou os humildes», «aos famintos encheu de bens e aos ricos despediu de mãos vazias».
As palavras de Francisco, pronunciadas na audiência semanal que decorreu na Praça de S. Pedro, foram inspiradas na parábola do Evangelho em que «um homem rico que se vestia de púrpura e linho fino e fazia todos os dias esplêndidos banquetes» despreza um pedinte, de nome Lázaro, que, «coberto de chagas», desejava «saciar-se com o que caía da mesa» do proprietário abastado (Lucas 16, 19-27).
«Nenhum mensageiro e nenhuma mensagem poderão substituir os pobres que encontramos no caminho, porque neles se encontra o próprio Jesus: “Tudo aquilo que fizestes a um só destes meus irmãos mais pequeninos, a mim o fizestes"», sublinhou o papa, citando outro passo do Novo Testamento.
Excertos da catequese:
«A vida destas duas pessoas parece decorrer em pistas paralelas: as suas condições de vida são opostas e, de todo, não comunicantes. O portão da casa do rico está sempre fechado ao pobre, que jaz do lado de fora, procurando comer alguma sobra da mesa do rico. Este veste roupas de luxo, enquanto Lázaro está coberto de chagas; o rico faz diariamente lautos banquetes, enquanto Lázaro morre de fome. Só os cães tomam conta dele e vão lamber as suas feridas. Esta cena recorda a dura admoestação do Filho do homem no juízo final: “Tive fome e não me destes de comer, tive sede e não me destes de beber, estava […] nu e não me vestistes». Lázaro representa o grito silencioso dos pobres de todos os tempos e a contradição de um mundo cujas riquezas e recursos estão nas mãos de poucos.»
Jesus diz que um dia aquele homem rico morre, os pobres e ricos morrem, têm o mesmo destino, todos nós sem exceção, e então dirige-se a Abraão, suplicando-lhe, com o apelativo de “pai”. Reivindica por isso ser seu filho, pertencente ao povo de Deus. Todavia, enquanto viveu, não mostrou qualquer consideração por Deus, pelo contrário, fez de si próprio o centro de tudo, fechado no seu mundo de luxo e de desperdício. Ao excluir Lázaro, não teve em qualquer conta nem o Senhor nem a sua lei. Ignorar o pobre é desprezar Deus. E isto devemos aprendê-lo bem, ignorar o pobre é desprezar Deus.
Há um motivo particular na parábola que deve ser notado: o rico não tem um nome, enquanto que o do pobre é repetido cinco vezes, e “Lázaro” significa “Deus ajuda”. Lázaro, que jaz diante da porta, é um chamamento vivo para se recordar de Deus, mas o rico não acolhe tal chamamento. Será condenado, portanto, não pelas suas riquezas, mas porque foi incapaz de sentir compaixão por Lázaro e de o socorrer.»
«Na segunda parte da parábola reencontramos Lázaro e o rico depois da sua morte. No além, a situação inverteu-se: o pobre Lázaro foi levado pelos anjos ao céu, junto de Abraão, enquanto que o rico, ao contrário, é precipitado entre os tormentos. Então o rico, “ergueu os olhos e viu, ao longe, Abraão, e Lázaro junto dele”. Ele parece ver Lázaro pela primeira vez, mas as suas palavras traem-no: “Pai Abraão – diz -, tem piedade de mim e manda Lázaro – já o conhecia – molhar em água a ponta do dedo e refrescar-me a língua, porque sofro terrivelmente nestas chamas”. Agora o rico reconhece Lázaro e pede-lhe ajuda, enquanto que em vida fingia que não o via. Quantas vezes tanta gente finge não ver o pobre, para eles os pobres não existem».
«Primeiro, negava-lhe as sobras da sua mesa, e agora queria que ele lhe levasse de beber. Ainda acredita poder dispor de direitos pela sua precedente condição social. Declarando impossível satisfazer o seu pedido, Abraão em pessoa oferece a chave de toda a narrativa: ele explica que bens e males foram distribuídos de modo a compensar a injustiça terrena, e a porta que separava, em vida, o rico do pobre, transformou-se num “grande abismo”. Quando Lázaro estava sob a sua casa, para o rico havia a possibilidade de salvação, escancarar a porta e ajudar Lázaro, mas agora, quando ambos morreram, a situação tornou-se irreparável. Deus nunca é chamado diretamente, mas a parábola coloca claramente em guarda: a misericórdia de Deus para connosco está ligada à nossa misericórdia para com o próximo; quando esta falta, também aquela não encontra espaço no nosso coração fechado, não pode entrar. Se eu não abro a porta do meu coração ao pobre, aquela porta permanece fechada, mesmo para Deus, e isto é terrível.»
«Neste ponto, o rico pensa nos sues irmãos, que se arriscam a ter o mesmo fim, e pede a Lázaro que regresse ao mundo para os avisar. Mas Abraão replica: “Têm Moisés e os profetas, que os escutem”. Para nos convertermos não devemos esperar acontecimentos prodigiosos, mas abrir o coração à Palavra de Deus, que nos chama a amar a Deus e o próximo. A Palavra de Deus pode fazer reviver um coração ressequido e curá-lo da sua cegueira. O rico conhecia a Palavra de Deus, mas não a escutou, não a acolheu no coração, porque foi incapaz de abrir os olhos e de ter compaixão do pobre. Nenhum mensageiro e nenhuma mensagem podem substituir os pobres que encontramos no caminho, porque neles se encontra o próprio Jesus: “Tudo aquilo que fizestes a um só destes meus irmãos mais pequeninos, a mim o fizestes”. Também na inversão das sortes que a parábola descreve está oculto o mistério da nossa salvação, em que Cristo une a pobreza à misericórdia.»
«Queridos irmãos e irmãs, escutando este Evangelho, todos nós, juntamente com os pobres da Terra, possamos cantar com Maria: «Derrubou os poderosos de seus tronos, exaltou os humildes; aos famintos encheu de bens, aos ricos despediu de mãos vazias”.»
Após a catequese, Francisco dirigiu uma saudação «com especial afeto» às «crianças ucranianas, órfãs e refugiadas por causa do conflito» que continua a ocorrer no país, tendo renovado a sua oração «para que se chegue a uma paz duradoura, que possa aliviar a população tão sofrida e ofereça um futuro sereno às novas gerações»
No dia em que se assinala o aniversário de nascimento do papa S. João Paulo II, Francisco rezou pela Polônia e paro povo polaco.
Papa Francisco 18.05.2016
Imagem: site do vaticano 21.10.2021