As narrativas bíblicas estão intimamente ligadas à experiência da busca do sentido. Nossas vidas se compõem de narrativas que vamos tecendo ao longo de nossa existência. Na diversidade de nossas experiências também ouvimos as histórias de outras pessoas, e constatamos que um dos aspectos que a pós-modernidade nos trouxe foi a desvalorização das grandes narrativas, em detrimento aos pequenos relatos que inventamos individualmente. Cada um com sua pequena narrativa procura viver de acordo com o sentido pessoal.

 

Quando contamos um fato utilizando o gênero narrativo, tocamos integralmente o ouvinte ou o leitor. O nosso talento em contar uma história vai prender ou não a atenção da pessoa. A narrativa se encaixa no processo da trama das relações e do emaranhado de episódios, onde ouvintes e leitores colhem ensinamentos para toda vida.

 

O convite diante da importância das histórias contadas é buscar as narrativas fundantes do ser humano. A Bíblia nos apresenta, desde Gênesis a Apocalipse, narrativas que desconstroem valores comodistas e constroem novos olhares e sentidos sobre o mundo e Deus. A Bíblia fala em narrativas porque as vidas se compõem de histórias e fatos que podem ser narrados.  É por esse motivo que a Palavra de Deus, com toda a sua expressividade, encontra profunda ressonância na vida e na catequese.

 

Os autores bíblicos foram fascinantes narradores. Inspirados por Deus, contaram a história do povo de Israel evidenciando sempre o Amor de Deus, capaz até de descer e libertar seu povo da opressão egípcia. Com grande aptidão, em todo Antigo Testamento esses autores narraram não só a história da escravidão do Egito, transcenderam esse fato para outros contextos. A libertação, sempre celebrada como evento fundante na Aliança, foi o fato histórico mais importante para o povo, de modo que, em qualquer lugar e sob as mais duras condições de opressão, o povo se lembrava dele e reacendia sua confiança em Iahweh.

 

Mais tarde, os autores bíblicos do Novo Testamento. Vão reler o Antigo Testamento à luz da pessoa de Jesus Cristo. Os Evangelhos são narrativas catequéticas que brotaram do seio das comunidades ao compreenderem que em Jesus, Deus se revela plenamente. E mais: Jesus Cristo não só revela quem é Deus, mas revela que o ser humano é capaz de Deus. Ao ler estas narrativas percebemos que nenhum autor diz de imediato quem é Deus e quem é Jesus. As narrativas cuidam para apresentar uma vida de doação, de acolhida e de obediência filial.

 

É por esse motivo que narrar o texto bíblico é o ponto central dos encontros de catequese. Porém, a catequese envolverá os catequizandos de fato, se for profundamente cristológica, como nos lembra a “Catechese Tradendae” (CT. 6).  É em Jesus Cristo que veremos o rosto de Deus como Pai que ama e, ao mesmo tempo, descobrir a face do ser humano que insistentemente busca sentido e valores para sua existência. Mais que um ser de busca, Jesus mostra o ser humano aberto a Deus e ao seu projeto a partir de fatos concretos da vida, do contexto onde os pés se firmam.

 

É na narratividade que a Bíblia encontra sua maior importância. A narrativa cerca, envolve, penetra nas dobras mais escondidas de nosso ser. A Bíblia se torna viva na forma em que se expressa, com diversas situações que manifestam a indispensável interação entre fé e vida.

 

 

Helia Carla de Paula Santos

Equipe do Instituto Regional de Pastoral Catequética -IRPAC

15.06.2012