As diversas configurações da Bíblia
Todos nós, povo de Deus, não temos muito conhecimento sobre a Palavra de Deus. Uma Palavra muito antiga que faz parte do nosso cotidiano, mas ao mesmo tempo, muito nova, pelo tempo que ela foi colocada nas mãos do povo, pela Igreja.
Sabemos que antes, e por muitos e muitos anos, somente a conhecíamos por meio da oralidade, das leituras nas Celebrações Eucarísticas e sermões dos padres. Foi a partir da década de 1980 que a Palavra escrita, a Bíblia, começa mesmo a se espalhar nas mãos do povo e ser estudada.
É nesse sentido que podemos dizer que nosso povo tem muitos problemas com as diferentes formas da Bíblia: a católica, a protestante, etc. Essas diferenças compreendem-se a partir da história. Vamos conversar um pouco sobre isso.
Primeiro ou Antigo Testamento
As diferenças entre as Bíblias se restringem ao chamado Antigo Testamento. As Escrituras aceitas pelo judaísmo hoje (a Bíblia hebraica) não são totalmente idênticas ao que nós chamamos o Antigo Testamento. No tempo de Jesus, o judaísmo transmitia suas Escrituras, quer na língua original, o hebraico, quer em tradução grega, porque o grego era a língua internacional e muitos judeus viviam fora de Jerusalém (nas cidades chamadas de “diáspora”). A tradução grega foi iniciada pelos anos 250 aC (Antes de Cristo), em Alexandria do Egito, grande centro de cultura helenista (= grega), onde viviam muitos judeus. É chamada Septuaginta (ou Bíblia dos Setenta, sigla: LXX), por ter sido atribuída a setenta escribas (número simbólico).
Ora, a tradução grega incluía alguns livros a mais que a Bíblia hebraica. Os primeiros cristãos – muitos deles judeus de língua grega – liam o Antigo Testamento na forma grega, mas os judeus não-cristãos, talvez por reação, valorizaram a forma hebraica, com o cânon mais restrito. Os cristãos adotaram a lista maior, da Bíblia grega (mesmo quando São Jerônimo traduziu diretamente do hebraico os livros escritos nessa língua). Por isso, o cânon cristão contém, para o Antigo Testamento, sete livros a mais que a Bíblia hebraica (1-2Mc, Jt, Tb, Eclo, Sb, Br), chamados “deuterocanônicos” (= incluídos no “cânon” num segundo momento; os protestantes os chamam de “apócrifos”).
Mais tarde, por volta de 1500-1600 dC (depois de Cristo), os reformadores protestantes (Lutero, Calvino, os anglicanos etc.) criaram traduções em língua moderna. Para esse fim, voltaram ao original hebraico e adotaram, quanto aos livros do Antigo Testamento, a lista restrita (a hebraica), enquanto os católicos continuaram com a lista maior (a grega). Seja lembrado, contudo, que Lutero guardou os livros excedentes da lista maior, como anexo na sua edição da Bíblia.
Por essas razões existem diversas configurações da Bíblia do Antigo Testamento:
- a Bíblia hebraica: cânon restrito do AT;
- a Septuaginta: cânon amplo do AT;
- a Bíblia cristã na forma adotada pela Igreja Católica e pelas Igrejas Orientais (Igreja Ortodoxa etc.): cânon amplo do AT (incluindo os deuterocanônicos) mais o NT;
- a Bíblia cristã na forma das Igrejas protestantes: cânon restrito do AT, mais o NT.
O Antigo Testamento usado pelos judeus e protestantes é diferente do nosso não somente pelo número de livros. Na Bíblia Hebraica há também diferenças na maneira de dividir os livros em grupos. Podemos falar, portanto, de uma divisão hebraica (Cf. Prólogo ao Eclo 1,1.8s.24; Lc 24,27.44) e uma divisão cristã da Bíblia.
Divisão Hebraica- Divisão Cristã
Torah = Lei (5): corresponde ao nosso
Pentateuco (Gn, Ex, Lv, Nm e Dt)
Pentateuco = (5): Gn, Ex, Lv, Nm, Dt
Livros Históricos (16): Js, Jz, Rt, 1-2Sm, 1-2Rs, 1-2Cr, Esd, Ne,
Tb, Jt, Est, 1-2Mc
Nebi’im = Profetas (21)
- Profetas anteriores: Js, Jz, 1-2Sm, 1-2Rs
- Profetas posteriores: Is, Jr, Ez e os 12
Profetas Menores
Livros Sapienciais ou Didáticos (7):
Jó, Sl, Pr, Ecl, Ct, Sb, Eclo
Ketubim = Escritos (13): Sl, Pr, Jó, Ct, Rt,
Lm, Ecl, Est, Dn, Esd, Ne, 1-2Cr
Livros Proféticos (18):
- Profetas maiores: Is, Jr, Lm, Br, Ez., Dn.
- Profetas menores: Os, Jl, Am, Ab, Jn,
Mq, Na, Hab, Sf, Ag, Zc, Ml
Por hoje vamos ficando por aqui. Pegue a sua Bíblia e vai dando uma olhada nas apresentações desses livros da Bíblia Cristã católica. Veja os livros que não constam nas bíblias protestantes. Sobre o que esses livros dizem? Quais novidades eles trazem?
Neuza Silveira de Souza.
Coordenadora do Secretariado Arquidiocesano Bíblico Catequético de Belo Horizonte.