Neste terceiro domingo da Quaresma, seguimos com Jesus até Jerusalém, para preparar e celebrar a Páscoa. Caminhamos em busca do espaço e do tempo para encontrar irmãos e irmãs, experimentando a alegria de sermos filhos e filhas, a festejar a gratuidade do divino amor. (Em tempos remotos, este era o momento do “escrutínio” dos catecúmenos, do primeiro chamado à liberdade, à intensa experiência de fraternidade com o Cristo!) Nossas mãos e nossos corações são mobilizados para cuidar da Casa do Pai, dialogando com amor, para superar muros e manipulações!
Nestes dias, sentimo-nos desamparados e perdidos, invadidos por falsas notícias ou assombrosas estatísticas, túmulos contabilizados e transações imobiliárias reveladas; descaso com os cenários e prognósticos, escárnio e negociatas nos bastidores da vida pública e privada... Famintos e sedentos, somos alimentados pela Palavra de Deus (Êxodo 20,1-17) que nos chama à vida nova e à liberdade: verdadeira boa nova que haveremos de guardar sábia e amorosamente, como canta o salmista (Salmo 19[18]).
E São Paulo, Apóstolo das nações, aprofunda e provoca nossa compreensão (1 Coríntios 1,22-25); pois enquanto os judeus pedem sinais (João 2,18;1 Coríntios 1,22) e os gregos procuram a sabedoria deste mundo (1 Coríntios 1,22); nós, os batizados, confirmados, chamados, devemos continuar de olhos postos no único sinal - a cruz e o Crucificado, sem dúvida a mais bela página que Deus escreveu na história da humanidade, embora esta sabedoria continue incompreensível para tanta gente!
O que motiva-nos a participar do mutirão das Igrejas Cristãs, para fomentar a fraternidade e o diálogo, a solidariedade e a paz, fazendo de nossas comunidades, verdadeiros espaços abertos para a acolhida, a escuta, o cuidado, o zelo, sobretudo, daquelas pessoas que se encontram necessitadas, abandonadas, privadas de vida e esperança. Testemunhando verdadeiramente que Cristo é nossa Paz, construtor da unidade onde antes prevalecia a divisão.
É o que nos revela o evangelho (João 2,13-25) quando relata a reação de Jesus ao chegar no Templo de Jerusalém para participar das Festividades da Páscoa. Ele não encontra irmãos e filhos, reunidos com alegria para celebrar a graça da liberdade. Ele esbarra com vendedores, banqueiros e comerciantes; que transformaram a Casa (lugar de intimidade e comunhão) em mercado (ocasião de exploração, manipulação e lucro)! Cheio de paixão pelo verdadeiro Deus e pleno de compaixão pelos irmãos e irmãs, Jesus faz um chicote e expulsa a tudo aquilo daquele espaço, lançando por terra o dinheiro, suposta divindade, ídolo erguido acima de tudo, introduzido no templo como um rei no trono, o tão desejado bezerro de ouro.
“Não façais da casa do meu Pai um empório”… Qual é a verdadeira casa do Pai? Uma casa de pedras? Nunca! A comunidade onde experimentamos a fraternidade, a sororidade e a divina filiação? Sim, mas também a vida de cada pessoa, conservada na liberdade e esperança, que jamais pode ser tratada como mercadoria, desprezada como objeto, descartada como lixo! Se privamos da liberdade, se deixamos fenecer a esperança, estaremos dessacralizando e profanando o tabernáculo de Deus. Pois, em cada pessoa Deus faz sua morada, é o que nos revela Jesus: “destruí este santuário, e em três dias o levantarei”!
Se somos todos, na liberdade e esperança, santuários/presença de Deus, precisamos cuidar para que nossa alma não se transforme em uma mesa de câmbios, mesmo que seja com a divindade! Eis uma sutil tentação, viver nossa religiosidade como lugar de troca com Deus: “eu dou-Te orações, sacrifícios e ofertas, Tu, em troca, asseguras-me saúde e bem-estar, para mim e para os meus.” Grave é esquecer que Deus é amor, e o amor não se compra. Ou como insiste Jesus, a partir da palavra do profeta Oséias: Deus «quer amor e não sacrifícios».
Urge acolher e viver com alegria o anúncio da gratuidade de Deus. Num mundo convertido em mercado, onde tudo é exigido, comprado ou ganho, só o gratuito pode continuar a fascinar e surpreender, porque é o sinal mais autêntico do amor. Nós, crentes, devemos estar mais atentos em não desfigurar um Deus que é amor gratuito, fazendo-O à nossa medida: tão triste, egoísta e pequeno como as nossas vidas mercantilizadas.
Que este tempo quaresmal nos ajude a conhecer «a sensação da graça» e experimentar o surpreendente amor de Deus, fazendo-nos irradiar atitudes e ações que resultem em algo bom e novo nesta sociedade onde tantas pessoas morrem de desprezo, solidão, tédio e desamor. Assim seja. Amém.
Pe. Paulo Roberto Rodrigues, terceiro domingo da quaresma, 07 de março de 2021
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