Catequeses. Os vícios e as virtudes. 4. A luxúria
Hoje ouçamos bem a catequese, porque depois teremos o circo que fará algo para nos divertir.
Continuemos o nosso itinerário sobre os vícios e as virtudes; e os antigos Padres ensinam-nos que, após a gula, o segundo “demónio”, ou seja, vício, que está sempre agachado à porta do coração é a luxúria. Enquanto a gula é a voracidade em relação à comida, este segundo vício é uma espécie de “voracidade” para com outra pessoa, isto é, a ligação envenenada que os seres humanos têm uns com os outros, especialmente na esfera da sexualidade.
Prestemos atenção: no cristianismo não há condenação do instinto sexual. Um livro da Bíblia, o Cântico dos Cânticos, é um maravilhoso poema de amor entre dois noivos. No entanto, esta dimensão tão bonita da nossa humanidade, a dimensão sexual, a dimensão do amor, não está isenta de perigos, de tal modo que já São Paulo deve abordar esta questão na primeira Carta aos Coríntios. Assim escreve: «De todas as partes ouvimos falar de imoralidade entre vós, de uma imoralidade que não se encontra nem sequer entre os gentios» (5, 1). A repreensão do Apóstolo diz respeito precisamente a uma gestão malsã da sexualidade por parte de certos cristãos.
Mas olhemos para a experiência humana, a experiência do enamoramento. Aqui há tantos recém-casados, vós podeis falar disto! Porque este mistério acontece, e porque é uma experiência tão devastadora na vida das pessoas, nenhum de nós sabe. Uma pessoa apaixona-se por outra, o enamoramento ocorre. É uma das realidades mais surpreendentes da existência. Boa parte das canções que ouvimos na rádio referem-se a isto: amores que se iluminam, amores sempre procurados e nunca alcançados, amores cheios de alegria ou que atormentam até às lágrimas.
Quando não é poluído pelo vício, o enamoramento é um dos sentimentos mais puros. Uma pessoa apaixonada torna-se generosa, gosta de dar presentes, escreve cartas e poesias. Deixa de pensar em si própria, projetando-se completamente para o outro, e isto é bonito! E se perguntarmos a uma pessoa apaixonada “por que motivo amas?”, ela não terá uma resposta: sob muitos aspetos, o seu amor é incondicional, sem qualquer razão. Paciência se aquele amor, tão poderoso, é também um pouco ingénuo: o apaixonado não conhece verdadeiramente o rosto do outro, tende a idealizá-lo, está pronto a fazer promessas cuja relevância não compreende imediatamente. No entanto, este “jardim” onde se multiplicam maravilhas não está ao abrigo do mal. Ele é deturpado pelo demónio da luxúria e este vício é particularmente odioso, pelo menos por dois motivos.
Em primeiro lugar, porque devasta as relações entre as pessoas. Para documentar uma realidade como esta, infelizmente bastam as notícias de todos os dias. Quantas relações iniciadas da melhor maneira se transformaram depois em relações tóxicas, de posse do outro, desprovidas de respeito e de sentido do limite? São amores em que faltou a castidade: virtude que não se pode confundir com a abstinência sexual - a castidade é mais do que a abstinência sexual - mas que está ligada à vontade de nunca possuir o outro. Amar é respeitar o outro, procurar a sua felicidade, cultivar a empatia pelos seus sentimentos, dispor-se ao conhecimento de um corpo, de uma psicologia e de uma alma que não são nossos e que devem ser contemplados pela beleza de que são portadores. Amar é isso, e o amor é belo! A luxúria, pelo contrário, ridiculariza tudo isto: a luxúria saqueia, rouba, consome tudo apressadamente, não quer ouvir o outro, mas somente a própria necessidade e prazer; a luxúria considera tedioso qualquer namoro, não procura a síntese entre razão, impulso e sentimento, que nos ajudaria a conduzir a existência com sabedoria. O luxurioso só procura atalhos: não compreende que o caminho para o amor deve ser percorrido com lentidão, e esta paciência, longe de ser sinónimo de aborrecimento, permite tornar felizes as nossas relações amorosas.
Mas há uma segunda razão pela qual a luxúria é um vício perigoso. Entre todos os prazeres do homem, a sexualidade tem uma voz poderosa. Envolve todos os sentidos, habita tanto no corpo como na psique, e isso é muito bom, mas se não for disciplinada com paciência, se não estiver inscrita numa relação e numa história em que dois indivíduos a transformam em dança amorosa, torna-se uma cadeia que priva o homem da liberdade. O prazer sexual, um dom de Deus, é minado pela pornografia: satisfação sem relação, que pode gerar formas de dependência. Devemos defender o amor, o amor do coração, da mente, do corpo, o amor puro na entrega de si mesmo ao outro. E esta é a beleza da relação sexual.
Vencer a batalha contra a luxúria, contra a “coisificação” do outro, pode ser um empreendimento para toda a vida. Mas a recompensa desta batalha é a mais importante de todas, pois se trata de preservar aquela beleza que Deus inscreveu na sua criação quando imaginou o amor entre o homem e a mulher, que não consiste em servir-se um do outro, mas em amar-se. Esta beleza, que nos faz acreditar que construir uma história juntos é melhor do que partir em busca de aventuras - há tantos casanovas! - cultivar a ternura é melhor do que curvar-se ao demónio da posse - o verdadeiro amor não possui, entrega-se - servir é melhor do que conquistar. Pois quando não há amor, a vida é triste, é triste solidão. Obrigado!
Papa Francisco
audiência geral 17.01.24