Catequeses sobre as Bem-aventuranças - 4
Amados irmãos e irmãs, bom dia!
Na catequese de hoje, analisamos a terceira das oito bem-aventuranças do Evangelho de Mateus: «Bem-aventurados os mansos, porque possuirão a terra» (Mt 5, 5).
O termo “mansos” usado aqui significa literalmente meigo, dócil, gentil, sem violência. A mansidão manifesta-se em momentos de conflito, vê-se pela forma como se reage a uma situação hostil. Qualquer um pode parecer manso quando tudo está calmo, mas como reage “sob pressão” se for atacado, ofendido, agredido?
Numa passagem, São Paulo recorda a «mansidão e bondade de Cristo» (2 Cor 10, 1). E São Pedro, por sua vez, recorda a atitude de Jesus na Paixão: ele não respondia nem ameaçava, «mas entregava-se àquele que julga com justiça» (1 Pd 2, 23). E a mansidão de Jesus é vista fortemente na sua Paixão.
Na Escritura a palavra “manso” também indica aquele que não possui terras; e por isso nos impressiona que a terceira bem-aventurança diga precisamente que os mansos «possuirão a terra».
Na verdade, esta bem-aventurança menciona o Salmo 37, que ouvimos no início da catequese. Também nele, é estabelecida uma relação entre a mansidão e a posse da terra. Estas duas coisas, pensando bem, parecem incompatíveis. Na verdade, a posse da terra é a área típica de conflito: luta-se muitas vezes por um território, para se obter hegemonia sobre uma determinada área. Nas guerras prevalece o mais forte e conquista outras terras.
Mas vejamos bem o verbo usado para indicar a posse dos mansos: eles não conquistam a terra; não se diz «bem-aventurados os mansos porque eles conquistarão a terra». Eles “possuem-na”. Bem-aventurados os mansos porque “possuirão” a terra. Nas Escrituras, o verbo “possuir” tem um significado maior. O Povo de Deus chama “posse” precisamente à terra de Israel que é a Terra Prometida.
Esta terra é uma promessa e uma oferenda para o povo de Deus, e torna-se sinal de algo muito maior do que apenas território. Há uma “terra” — permiti o trocadilho — que é o Céu, isto é, a terra para onde caminhamos: os novos céus e a nova terra rumo à qual caminhamos (cf. Is 65, 17; 66, 22; 2 Pd 3, 13; Ap 21, 1).
Então o manso é aquele que “possui” o mais sublime dos territórios. Ele não é um cobarde, um “débil” que encontra uma moralidade alternativa para se manter fora dos problemas. De modo algum! Trata-se de uma pessoa que recebeu uma herança e não a quer perder. O manso não é um indulgente, mas o discípulo de Cristo que aprendeu a defender uma terra diferente. Ele defende a sua paz, defende a sua relação com Deus, defende os seus dons, os dons de Deus, preservando a misericórdia, a fraternidade, a confiança, a esperança. Porque as pessoas mansas são pessoas misericordiosas, fraternas, confiantes e esperançosas.
Aqui devemos mencionar o pecado da ira, um movimento violento cujo impulso todos nós conhecemos. Quem nunca se zangou? Todos. Devemos inverter a bem-aventurança e questionar-nos: quantas coisas destruímos com a ira? O que perdemos? Um momento de cólera pode destruir muitas coisas; perde-se o controlo e não se avalia o que é realmente importante, e pode-se arruinar o relacionamento com um irmão, às vezes sem remédio. Devido à ira, tantos irmãos já não se falam, afastam-se uns dos outros. É o oposto de mansidão. A mansidão reúne, a ira separa.
A mansidão significa conquistar muitas coisas. A mansidão é capaz de conquistar o coração, salvar amizades e muitas outras coisas, porque as pessoas ficam zangadas mas depois acalmam-se, refletem e corrigem os seus passos, e assim pode-se reconstruir com a mansidão.
A “terra” a ser conquistada com mansidão é a salvação daquele irmão do qual fala o próprio Evangelho de Mateus: «Se te der ouvidos, terás ganho o teu irmão» (Mt 18, 15). Não há terra mais bela do que o coração do próximo, não há território mais belo para ganhar do que a paz reencontrada com um irmão. E esta é a terra que se deve possuir com mansidão!
Papa Francisco
Catequese nas quartas-feiras - 19.02.2020