Papa proclama santa Madre Teresa de Calcutá e sublinha que Igreja deve estar onde há «uma mão estendida» 

Santa Madre Teresa de Calcutá: é assim que os católicos passam a partir de agora a chamar e a pedir a intercessão à fundadora das Missionárias da Caridade, figura cuja vida e ação se estenderam muito para além das fronteiras físicas e espirituais do catolicismo. 

Na missa em que canonizou a mais recente santa da Igreja, celebrada esta manhã na Praça de S. Pedro, no Vaticano, o papa frisou que para os cristãos «não existe alternativa à caridade»: «Estamos chamados a por em prática o que pedimos na oração e professamos na fé». 

«Como o Senhor veio até mim e se inclinou sobre mim na hora da necessidade, assim vou ao seu encontro e inclino-me sobre aqueles que perderam a fé ou vivem como se Deus não existisse, sobre os jovens sem valores e ideais, sobre as famílias em crise, sobre os doentes e os prisioneiros, sobre os refugiados e imigrantes, sobre os fracos e desamparados no corpo e no espírito, sobre os menores abandonados à própria sorte, bem como sobre os idosos deixados sozinhos. Onde quer que haja uma mão estendida pedindo ajuda para levantar-se, ali deve estar a nossa presença e a presença da Igreja, que apoia e dá esperança», vincou. 

Francisco sublinhou que «seguir Jesus é um compromisso sério e ao mesmo tempo alegre; exige radicalidade e coragem para reconhecer o divino Mestre no mais pobre e colocar-se ao seu serviço. Para isso, os voluntários que servem os últimos e necessitados por amor de Jesus não esperam nenhum agradecimento ou gratificação, mas renunciam tudo isso porque encontraram o amor verdadeiro»

«Para Deus são agradáveis todas as obras de misericórdia, porque no irmão que ajudamos, reconhecemos o rosto de Deus que ninguém pode ver. Todas as vezes em que nos inclinamos para as necessidades dos irmãos, damos de comer e beber a Jesus; vestimos, apoiamos e visitamos o Filho de Deus», declarou.

Na parte final da homilia, o papa centrou-se em Madre Teresa, que «ao longo de toda a sua existência, foi uma dispensadora generosa da misericórdia divina, fazendo-se disponível a todos, através do acolhimento e da defesa da vida humana, dos nascituros e daqueles abandonados e descartados. Comprometeu-se na defesa da vida, proclamando incessantemente que "quem ainda não nasceu é o mais fraco, o menor, o mais miserável". Inclinou-se sobre as pessoas indefesas, deixadas moribundas à beira da estrada, reconhecendo a dignidade que Deus lhes dera; fez ouvir a sua voz aos poderosos da Terra, para que reconhecessem a sua culpa diante dos crimes da pobreza criada por eles mesmos». 

«A misericórdia foi para ela o “sal”, que dava sabor a todas as suas obras, e a luz que iluminava a escuridão de todos aqueles que nem sequer tinham mais lágrimas para chorar pela sua pobreza e sofrimento», apontou, destacando que «a sua missão nas periferias das cidades e nas periferias existenciais» continua a ser hoje «um testemunho eloquente da proximidade de Deus junto dos mais pobres entre os pobres».

Ao mundo do voluntariado, o papa exortou a que a nova santa seja «o modelo de santidade»:  «Que esta incansável agente de misericórdia nos ajude a entender mais e mais que o nosso único critério de ação é o amor gratuito, livre de qualquer ideologia e de qualquer vínculo e que é derramado sobre todos sem distinção de língua, cultura, raça ou religião». 

«Madre Teresa gostava de dizer: "Talvez não fale a língua deles, mas posso sorrir". Levemos no coração o seu sorriso e o ofereçamos a quem encontremos no nosso caminho, especialmente àqueles que sofrem. Assim abriremos horizontes de alegria e de esperança numa humanidade tão desesperançada e necessitada de compreensão e ternura», concluiu Francisco. 

A memória litúrgica de Madre Teresa de Calcutá celebra-se anualmente a 5 de setembro, pelo que esta segunda-feira vai ser invocada como santa pela primeira vez. 

Após a Eucaristia com o rito da canonização, Francisco presidiu à oração do "Angelus", invocadora da Virgem Maria, tendo recordado palavras proferidas por Santa Madre Teresa de Calcutá: «Sou albanesa de sangue, indiana de cidadania. Para aqueles que se referem à minha fé, sou uma irmã católica. Segundo a minha vocação, pertenço ao mundo. Mas quanto ao que diz respeito ao meu coração, pertenço inteiramente ao Coração de Jesus». 

Na missa estiveram presentes os presidentes da Albânia, Antiga República Jugoslava da Macedónia e Kosovo, o ministro dos Negócios Estrangeiros da Índia, a rainha de Espanha, o presidente dos Bektashi, fraternidade muçulmana albanesa, e o bispo da Igreja protestante de Calcutá.

No "Angelus" Francisco recordou «quantos se gastam ao serviço dos irmãos em contextos difíceis e arriscados», «especialmente as muitas religiosas que dão a sua vida sem se pouparem».

«Rezemos em particular pela irmã missionária espanhola, irmã Isabel, que foi morta há dois dias na capital do Haiti, um país tão sofrido, para o qual faço votos de que cessem tais atos de violência e haja maior segurança para todos. Recordemos também outras irmãs que, recentemente, sofreram violência noutros países», assinalou o papa.

 

Rui Jorge Martins
Publicado em 04.09.2016 no SNPC

 imagem: site do Vaticano 2020