Dá-nos, Senhor, depois de todos os nossos cansaços, um verdadeiro tempo de paz.
Dá-nos, depois de tantas palavras, o dom do silêncio que purifica e recria.
Dá-nos, depois de tantos caminhos apressadamente eliminados pela cortina de nevoeiro da distração, a possibilidade de contemplar com disponibilidade e plenitude cada porção de realidade, inclusive as realidades que nos custam.
Dá-nos a alegria, depois das insatisfações que nos travam, como uma barca que se recorta na água.
Dá-nos, Senhor, a possibilidade de viver sem presa, extasiados pela surpresa que os dias trazem consigo pela mão.
Dá-nos a capacidade de viver de olhos abertos, de viver intensamente.
Dá-nos a humilde simplicidade dos artesãos que, preferindo a sabedoria da experiência ao aparato das teorias, reconhecem que estão sempre a recomeçar.
Permite-nos escutar a lição do cântaro na roda do oleiro; do cepo aplanado pelas mãos do carpinteiro; da massa que o padeiro pacientemente transforma em pão.
Dá-nos de novo, Senhor, a graça do canto, do assobio que imita a aérea felicidade dos pássaros, das imagens reencontradas, do riso partilhado.
Dá-nos a força de impedir que as duas necessidades do viver esmaguem o desejo dentro de nós e que se dissipe a transparência dos nossos sonhos.
Faz de nós peregrinos, que no visível vislumbram a discreta insinuação do invisível.
In Avvenire
Trad.: Rui Jorge Martins
Imagem: pexels.com
Publicado em 16.11.2020 no SNPC