Depois de mergulhar com Jesus nas águas do Jordão (domingo passado), acolhemos a Boa Notícia testemunhada pela comunidade do Discípulo Amado, capítulo primeiro, versículos de 35 a 42, apresentando-nos as sementes da caminhada cristã. Somos colocados diante de cinco figuras: dois mestres e três discípulos! João (de olhos penetrantes) que ensina com gestos e humildade; Jesus (andarilho e acolhedor) que ensina perguntando, dois discípulos que não se acomodam nem incomodam, e um terceiro, que aceita o testemunho do irmão e no encontro com o Mestre, troca de nome (de rumo e vida)!


Um relato temperado de liberdade e coragem, espelhando movimento e fraternidade! Desapegado, o mestre aponta outro Mestre, aquele que serve ao divino desejo de ao mundo libertar (o Cordeiro de Deus)! Tirar o pecado do mundo não significa o sacrifício de carregá-lo nas costas! É antes o trabalho (sacro-ofício) de libertar da opressão os oprimidos! Verdadeiro sentido do cordeiro imolado na Páscoa: memória atualizada da libertação do Egito. Arrastados por esta fulgurante imagem, os primeiros seguidores, são desafiados pelas primeiras palavras de Jesus neste Evangelho: o que estais procurando?


Assim, o Mestre começa pondo-se à escuta. Ele que estava à frente, volta-se para encontrar e perguntar; não quer nem impor nem doutrinar, desafia os que o seguem a ditar a agenda. A pergunta funciona como um anzol lançado para o interior deles... Jesus, com maestria, toca o tecido profundo e vivo de cada pessoa: o que desejas verdadeiramente? Qual é o vosso desejo mais forte? Palavras que se repetirão no final do relato evangélico, num jardim depois de seu sepultamento: mulher, quem procuras? Sempre o mesmo verbo, aquele que define nossa humanidade: somos buscadores e buscadoras, movidos pelo sopro do Espírito...


A resposta (agenda) dos discípulos é outra pergunta: Rabi, onde moras? O que se transforma num divino convite: Vinde e vede! Jesus revela-nos que o anúncio cristão, antes das palavras, é feito de olhares, testemunhos, experiências, encontros, proximidade. Numa palavra, Vida. E é isso que Jesus veio trazer, não teorias, mas vida em plenitude (cf. João 10,10). E os dois vão com Ele: a conversão é deixar a segurança de hoje para o futuro aberto de Jesus; passar de Deus como dever a Deus como desejo e espanto!
Muitas pessoas desejam/sonham poder passar o resto de suas vidas de pijama, no sofá de casa. Isto talvez seja o pior que nos possa acontecer: sentirmo-nos acabados, permanecer imóveis, acomodados. Ao contrário, os discípulos, os primeiros cristãos, foram formados, treinados, ensinados a não parar, a andar e a andar, em busca de Deus. Por isso, o relato nos apresenta André que vai ao encontro do irmão e o conduz a Jesus, pois Simão compartilhava de sua expectativa, também ele estava em busca daquele cuja vinda o Batista anunciava. A espera acabara, a busca teve êxito. A expressão “encontramos”, no plural, já indica o “nós” da comunidade de Jesus, que, a partir deste momento, ressoará em todo o Evangelho para confessar a fé e dar testemunho.


Jesus, mestre do desejo, hospedeiro e intérprete do coração humano, pergunta a cada um e cada uma de nós: que fome torna viva a tua vida? De que sonhos caminhas atrás? E não pede renúncias ou sacrifícios, nem imolações sobre o altar do dever, mas reentrar em si, regressar ao coração, olhar para o que acontece no espaço vital, acolher as dores do mundo e dos irmãos e irmãs, guardar aquilo que se move e germina no íntimo de si e do mundo. Perceber tudo como bênção, pois feliz o homem, feliz a mulher que tem caminhos no coração (cf. Salmo 83,6).


Um passo decisivo, ao ler este evangelho, é procurar pessoalmente a verdade de Jesus. Não faz falta saber muito para entender sua mensagem. Não é necessário dominar as técnicas mais modernas de interpretação. O decisivo é ir ao fundo dessa vida a partir de minha própria experiência. Guardar suas palavras dentro do coração. Alimentar o gosto da vida com seu fogo. Ler o evangelho não é exatamente encontrar «receitas» para viver. É outra coisa: é experimentar que, vivendo como Jesus, se pode viver de forma diferente, com liberdade e alegria interiores.


Este é o convite de Jesus para todos nós: trilhar os seus caminhos, reconhecer sua palavra, acolher a sua vida. Mesmo que isto se dê no final da tarde... Quando acaba um dia e começará outro... Na hora em que se imolava o cordeiro, sinal da vida oferecida para a libertação de todos. Que não nos privemos de seguir Jesus e habitar em sua morada, isto é, permanecer em Deus! Amém!

Pe. Paulo Roberto Rodrigues

Campinas, 17 de janeiro de 2021

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